Jerry Seinfeld: “Toda a fragilidade humana fica exposta na comédia”
Jerry Seinfeld é um dos grandes nomes do stand-up nos Estados Unidos e é mais conhecido um pouco por todo o mundo pela série homónima que fez ao lado de Larry David entre 1989 e 1998. Recentemente o artista, que é um dos mais bem sucedidos na área, deu uma entrevista ao The New York Times e reflectiu sobre vários temas que actualmente envolvem a comédia.
A Internet
“Se tu dizes algo de errado, ou fazes algo de errado – é incrível como a internet se tornou esse portal para a expressão de tanta dor”, disse o comediante. “O que eu acho é que, em perspectiva, isso é tudo positivo. Penso bastante sobre as vítimas desse tipo de coisas [abusos sexuais, assédio], como elas conseguem muito mais dessa plataforma do que há cinco anos atrás, por exemplo. Isso é óptimo”, disse Jerry Seinfeld ao The New York Times.
Hannah Gadsby
Na mesma entrevista Seinfeld elogiou o trabalho da australiana Hannah Gadsby, que graças ao seu espectáculo “Hannah Gadsby: Nanette”, que se encontra disponível na Netflix, virou um fenómeno no stand-up um pouco por todo o mundo. Nele, Gadsby conta as suas experiências pessoais relativamente ao abuso sexual e homofobia. “Sim, vi e amei. Ela fez um trabalho lindo, a forma como ela juntou esse relato com a história da arte, que foi o que ela estudou, é fascinante e fantástica”, comentou o comediante norte-americano. E acrescentou ainda: “Isso não é óptimo, a forma como ela pegou num formato convencional e o ‘esticou’ para incluir a sua experiência?”, “É por isso que hoje em dia as pessoas vêem especiais de stand-up. Quão valioso é aquilo que ela disse para pessoas que passaram pela mesma coisa? Quantas pessoas vão pensar: ‘Ela prosperou apesar de tudo isso’. Que contribuição incrível”, “O que é mais poderoso sobre o momento que estamos a passar é que não há mais regras. Estamos a descobrir tudo enquanto acontece. É algo muito estimulante e poderoso”, completou.
Bill Cosby e os Ídolos
Seinfeld também reflectiu sobre colegas de profissão que foram condenados por seus actos fora dos palcos. O comediante citou, por exemplo, Bill Cosby, que recentemente foi condenado por assédio sexual: “Eu via Cosby como um ídolo. Foi uma queda grande demais para ignorar”, comentou. “O que eu acho que é novo para as pessoas é que a queda desses ícones é muito rápida quando algo desse género acontece. E desaparece imenso trabalho. Ficamos irritados com essa rapidez, porque ela é nova. É daí que vem o desconforto”. “Não acho que precise de repensar a minha lógica de ter ídolos por causa do Cosby. Não vou desistir de ter heróis na minha profissão”, continuou. “Eu sou uma pessoa esperançosa. É o que eu disse para Ellen [DeGeneres] uma vez: Como humanos temos relações abusivas uns com outros. Odiamos certas pessoas, desprezamos outras. E então alguém toca um concerto no piano e pensamos: ‘Uau, as pessoas são boas'”.
O comediante e o valor da profissão
“Não concordo com a noção que o comediante pode falar o que quiser. O público vai filtrar o que estás a falar” e disse ainda. “Sabes quantas pessoas começaram nisto comigo, homens e mulheres? 99% deles não estão mais na comédia. Alguns deles eram óptimos. Eles não vingaram por todo o tipo de razões que podes pensar. Toda a fragilidade humana fica exposta [na comédia]” e foi ainda mais longe: “Não podes fazer o que queres. Só podes fazer o que funciona, se quiseres ter uma carreira. O que eu faço no palco é o que 300 plateias decidiram que funciona. Tens de as fazer rir se quiseres que elas voltem. É por isso que eu me apresento de fato, é um sinal: Não estou a brincar. Entendo o que estou a fazer”, completou ao The New York Times.
“Recentemente questionei uma plateia: “Por que estão aqui para ver isto? Acho que vocês só gostam de ver alguém a suar”. Chris Rock disse-me uma teoria de que antigamente quando ias ver Neil Young ou Jimi Hendrix, vias o artista todo. Agora, a maioria dos artistas de música, o talento dessa pessoa, é apenas uma componente do que eles estão a fazer. Mas com um comediante ainda estás a receber todo o artista: o escritor, o director, o apresentador. Todo o seu talento está em exibição num pacote e é intenso. É por isso que o stand-up ainda é tão popular.”, disse Seinfeld ao jornal norte-americano.