Hoje, sentimos muito mais em menos tempo
O amor é, arrisco dizer, o sentimento mais ambíguo que o ser humano tem de experienciar ao longo da sua vida: são as pessoas que mais amamos que, ao mesmo tempo, decidem a nossa felicidade ou tristeza; quanto mais as amamos, mais as tememos, daí o enorme risco que enfrentamos. É talvez por isso que o amor seja só para os carajosos ou para os afortunados.
Por mais fortes que sejam as nossas emoções, só podemos dizer que amamos outras pessoas (ou outra pessoa, aquela pessoa), quando tivermos conhecido o lado com o qual nos orgulhamos menos, em oposição com aquele que nos fez aproximar mais. Só a partir desse momento é que se calhar temos de questionar visceralmente o nosso futuro. É também por esta altura que podemos concluir que a imperfeição pode tornar-se numa qualidade individualidade. Aquela velha máxima: nada é perfeito, muito menos o ser humano. E saber compreender a imperfeição é, acima de tudo, adaptarmos-nos a nós mesmos, até nos sentirmos bem com a realidade e com quem nos rodeia. Cada ruga, mancha, cicatriz, borbulha, assimetria, falha de cabelo ou de melanina; cada deformidade deve ser abraçada. Tudo isto vai exactamente em sentido oposto à ideia de mito: venerar ou amar algo que não está lá ou que gostávamos que estivesse.
Talvez tudo se resuma à seguinte ideia: só nos descobrimos realmente aos olhos dos outros. Desta forma, quanto mais amamos alguém, mais descobrimos as nossas fraquezas, os nossos limites morais, os nossos preconceitos e convicções. No fundo, o quão estamos dispostos a amar, tendo em conta a imperfeição do outro. Será que a moralidade mais libertina do outro, no que toca ao amor, faz com que praguejemos nomes poucos complexos mas cheios de veneno? Ou vamos adaptar-nos e, quiçá, abrir novos horizontes?
Segundo o cineasta chinês Wong Kar-wai, e através de uma personagem de um dos seus filmes: “o amor é uma questão de tempo; não vale a pena conhecer a pessoa certa demasiado cedo ou demasiado tarde”. Porém, para além de termos de nos subjugar ao deus Kronos, temos de enfrentar a velocidade própria das sociedades modernas. Hoje em dia, tudo se move a uma velocidade maior. Sentimos muito mais em menos tempo; estamos em constante mudança emocional e a pressão de partilharmos mais eficazmente as nossas emoções com o outro é cada vez maior. Talvez as próprias relações humanas sejam menos românticas: ou entras neste comboio de alta velocidade ou vais a pé e quando chegares ao destino, provavelmente, não encontrarás quem andavas à procura durante todo este tempo.
A forma como comunicamos mudou. E, por consequência, a forma de sentirmos alterou-se. Hoje, as ligações são diferentes. Em 1959, Simone de Beauvoir dizia que “todos se ligam e ninguém se realiza senão através e pelos outros”. Hoje, esta frase pode ser lida doutra forma, uma vez que as ligações também se estabelecem doutra maneira. No entanto, continuamos a realizar-nos com os outros.