O vintage veio mesmo para ficar
É já praticamente inevitável, não nos depararmos com uma emancipação daquilo que actualmente denominamos por vintage – seja nas ruas, seja nas montras das superfícies comerciais, seja nos restaurantes ou noutros espaços de lazer que habitualmente frequentamos. Tudo o que sejam artigos de moda, decoração, ou até mesmo conteúdos artísticos, musicais e cinematográficos referentes às décadas mais remotas do século XX, captam a nossa atenção de um modo bastante particular. Uma mini saia ou um vestido dos anos 60, uma hamburgueria cujo interior seja composto por mesas e cartazes alusivos aos anos 50, ou um ambiente onde se ouça canções da Edith Piáf, do Chuck Berry, ou do Johnny Cash, conseguem facilmente fluir diante de um cenário repleto de fotografias com efeito sépia e seduzem-nos logo de imediato. Difícil é explicar de onde surgiu esta onda que nos faz estar constantemente, e de um modo quase fatal, presos ao estilo vintage. A moda, a música, o cinema e os objectos considerados como antigos (alguns deles que até trazem aquele tenro aroma a mofo consigo), ganharam um carinho especial da nossa parte, e até mesmo uma igual ou maior valorização que outras gerações lhes souberam dar. O vintage veio para ficar e, ao que parece, não nos estamos a importar nada. E ainda bem.
É sempre agradável ver algo que nos remeta para um estilo mais rústico, que consiga conferir sensações que nos façam sentir mais soltos e confortáveis, e não tanto para o estilo mais comercial, completamente mergulhado pela epidemia tecnológica com que convivemos actualmente. A procura pelos discos vinyl, pelos cartazes publicitários decorativos, pelos acessórios de moda e pela roupa, é de tal ordem, que algumas destas peças acabam por ser quase consideradas como iguarias. De facto, há preços e preços, desde as feiras low cost até aos mercados de nicho. Isto porque os produtos vintage de maior requinte podem atingir valores que não são para a carteira de qualquer um. Porém, a sua condição quer do ponto de vista da sua estética, quer do ponto de vista da sua manufactura, tornam-nos em materiais mais desejáveis e apetecíveis. Dão-nos conforto porque sabemos desfrutá-los a partir da sua utilidade exclusiva, sem qualquer tipo de factor adjacente. Um objecto vintage, dada a sua simplicidade e utilidade, oferece-nos uma pureza que outros objectos não nos oferecem, sem tirarmos partidos das funcionalidades excessivas que estão inseridas nos utensílios comuns do nosso quotidiano. O facto de querermos também testar um pouco daquilo que foi uma época que nunca vivermos, com outros recursos, mas com um modo apaixonante de apreciar o que de melhor a vida nos pode oferecer, também dá alguma alavancagem para esta tendência. No fundo é difícil definir o que é o vintage, quando o vintage é uma definição que acaba por ser algo vaga: não se resume a uma época específica, mas a toda uma era. Uma era onde os recursos e os métodos de comunicação eram outros, mas que não impedia as pessoas de desfrutarem ao máximo da música, da literatura, do espectáculo, e de todas as vertentes mais belas que a arte nos pode oferecer, longe do imperialismo dos ecrãs e da electrónica, e dos materiais feitos à base de plástico e de ligas metálicas facilmente comercializáveis.
Apesar da existência produtos sofisticados no mercado vintage, estes tendem a ser mais ecológicos dada à restauração ou aproveitamento que os consegue tornar em artigos de uma beleza única. Transformar algo que vulgarmente designamos por “velharia” em algo equiparável a um objecto de luxo é uma mais-valia. Além do mais, o mercado e as lojas de produtos vintage têm um aspecto muito mais apelativo do que as convencionais. O turismo abre também portas a que estes espaços comerciais e de lazer ganhem vida, tornando-se numa preferência por parte dos consumidores. O retalho vintage consegue ser muito mais sedutor do que a azáfama e o movimento enfadonho existente nas grandes superfícies comerciais. O próprio artesanato tem ganho muito também com esta tendência. Há agora uma maior procura por texturas e padrões alusivos, que possam combinar entre si, dando vida a novos acessórios que tenham um pouco de predominância nas nossas vidas. Ter um pouco de vintage no nosso quotidiano abre-nos portas para certos aspectos que hoje são mais desvalorizados. O saber saborear as coisas de um modo mais sublime, é uma vertente que conseguimos conceber do vintage de um modo mais natural do que aquela que nos é impingida constantemente. Estar aberto a novas tendências que o futuro nos oferecerá faz parte da mudança que nos é inerente. Contudo há mudanças que necessitam de se inspirar em vertentes do passado que consigam trazer uma nova vertente poética ao presente, gerando ondas de inspiração que nos façam ter novas ideias.
O vintage dá-nos uma outra visão do mundo, confere-nos um prazer único que não é nem forçosamente impingido nem projectado de modo exuberante. Alimenta a veia sentimental com que conseguimos saborear e interpretar a arte e a cultura. O vintage veio para ficar e que fique por muitos e bons anos. Vem de um passado remoto, mas consegue tornar-nos mais jovens através das variadíssimas sensações que nos traduz. Contribui para a criatividade de uns e é fonte de inspiração para outros. Faz-nos bem à alma e sobretudo à nossa vida que, perante um mundo caótico e bizarro, necessita cada vez mais de refúgios que só o vintage nos consegue oferecer.