Hey, hey Zippy! Hey, Zippy hey!
Rui Cruz é humorista, stand up comedian e um génio (palavras dele). Escreve coisas que vê e sente e tenta com isso cultivar o pedantismo intelectual que é tão bem visto na comunidade artística.
Pronto, mais uma semana, mais uma polémica com cenas modernas. Desta vez foi com a Zippy e a sua colecção de roupa “ungendered” que chateou o pessoal da direita conservadora, pessoal esse que eu não consigo entender. São pouco coerentes. Por exemplo, se acham que estar em contacto com gays ou com roupa “gender neutral” faz com que as crianças fiquem homossexuais, porque é que fazem tanta questão que os filhos frequentem a catequese? E porque raio é que só agora é que se chatearam? Afinal, desde os meus tempos de miúdo que existe roupa que tanto dá para rapaz como para rapariga, não é uma coisa propriamente nova. Se bem que na altura se chamava unissexo, agora é que é “ungendered”. Ainda não percebi bem a diferença, mas tenho quase a certeza que está no preço. Quem é que ainda se chateia com estas coisas? E porquê? “Ai aquela t-shirt é de menina, se o meu filho vestir aquilo vai ser vítima de bullying e eu tenho de o proteger!”. Giro. Mas quando o mandas de fato de treino e botas para a escola já não te importas tanto com o gozo que o puto vai levar. Não é, mãe? Ainda por cima aquelas botas castanhas ortopédicas… Os meus bullies ainda me bateram foi pouco!
Confesso que não conhecia a marca, o que só prova que a polémica é uma óptima maneira de chamar a atenção e custa menos do que pagar anúncios, o que, tenho para mim, o pessoal da Zippy já sabia. E digo isto porque bastou abrir a página da colecção para ver que, apesar da mesma ser apelidada de “ungendered”, continua a existir o marcador para “menina” e para “menino”. Eu sei, eu sei, pode ser só por uma questão de logística e isso eu até percebia, mas a verdade é que a secção de “menina” da colecção “ungendered” tem mais 3 peças do que a a secção “ungendered” de menino. Ora, no que toca a “ungenderness”, parece que afinal a Zippy ainda não é totalmente “woke” (só escrevi esta frase porque tem bué palavras em inglês e a malta jovem gosta. O meu agente diz-me que tenho de estar mais em contacto com a sua realidade e dizer dizer cenas jovens, tipo, baril! Acho que vai ficar contente).
E isto irrita-me um bocado. Porque, na realidade, o que a marca fez foi tentar surfar uma onda para vender mais, só isso. Tanto que a escolha do nome, o símbolo da colecção e o o copy inicial da mesma não são inocentes. E não há nada de mal nisso, hoje toda a gente/marca o faz! O que já me parece um bocado vergonhoso é a maneira como depois a Zippy se tentou desmarcar de qualquer movimento social quando começou a ser criticada pelos idiotas do “ isto é a tirania do marxismo cultural”. Porque se antes tens uma descrição da colecção que diz coisas como “Cada cor procura representar uma personalidade e cada peça a capacidade de celebrar e agregar cada uma delas, reforçando o conceito de togetherness. HAPPY é a materialização da felicidade, que acreditamos que se consegue quando rompemos com ideias pré-concebidas e com o tradicional, explorando novos caminhos e tendo coragem de vestir o nosso próprio “eu” todos os dias.”, tentando com isto parecer muito moderno e activista, depois não podes meter o rabo entre as pernas quando te criticam e dizeres isto “A coleção Happy não tem qualquer associação a ideologias ou movimentos, sejam eles quais forem (…) Com esta linha, queremos ajudar os pais na hora de vestir as suas crianças, dando-lhes opções versáteis e que podem ser passadas de irmãos para irmãs, de primas para primos, e vice-versa”. E é por isto que é sempre divertido quando as marcas tentam camuflar a sua real e única intenção (vender, vender muito e a toda a gente) com boas acções ou campanhas, porque é sempre uma questão de tempo até a coisa acabar como um bom porno: com gente aos berros numa sala depois de lhes explodir tudo na cara.
Enfim… no fundo, é uma polémica ridícula e continuo sem a perceber bem. A marca fez apenas o que muitas marcas têm feito nos últimos tempos, tentou aproveitar um movimento social para vender, como fizeram a Pepsi ou a Gillette; os gebos fizeram aquilo que os gebos fazem, que é insultar pessoas na internet quando se sentem assustados com alguma coisa que lhe ponha os dogmas em causa; e os “wokes” fizeram aquilo que os “wokes” fazem, que é intelectualizar ou atribuir uma intenção altruísta a algo que não o é, mas que lhes dá jeito que seja. Só isso. Já eu… Nem sei. Por mim, vistam o que quiserem e quando quiserem, roupa de menino, de menina ou “ungendered”, desde que percebam finalmente que óculos de sol na cabeça só se justifica em pessoal de cabelo comprido ou consumidores de MDMA.