O punk rock dos novos anos 20 chega com “Father of All…” dos Green Day
Foi no passado dia 7 de Fevereiro que os Green Day lançaram o seu décimo terceiro álbum de originais, inaugurando assim a nova era do punk dos novos anos 20. Com uma capa que remete para o célebre álbum American Idiot, letras grafitadas e uma espécie de unicórnio psicadélico, Father of All… (o título do álbum encontra-se censurado, pois é Father of All Motherfuckers) trata-se de uma nova injecção do punk rock a abrir a nova década. Depois de Revolution Radio lançado em 2016, um novo trabalho musical dos Green Day era algo cada vez mais aguardado, ainda para mais vindo de uma banda que fora responsável pela explosão do punk na década de 90 do século passado, explosão essa conhecida como punk revival. O trio californiano composto pelo carismático guitarrista e vocalista Billie Joe Armstrong, o baixista Mike Dirnt e o baterista Tré Cool apresenta-se enérgico e sempre com novas ideias, de forma a manter o punk sempre vivo e bem vivo, algo bem assente neste novo álbum.
Com dez faixas e uma duração total de 26 minutos, Father of All… é o álbum mais curto da carreira dos Green Day, sendo que as primeiras três canções foram conhecidas antes do seu lançamento. Novamente gravada pela Reprise Records, o álbum foi produzido sob alçada do músico e produtor Butch Walker e também com a colaboração de Chris Dugan. Numa entrevista feita na altura do lançamento do primeiro single, Billie Joe Armstrong proferiu que o álbum abordaria um estilo mais festivo, longe das letras de cariz político comum em parte das suas canções e mais próximo de um álbum que pudesse ser dançado e celebrado. Ainda assim, a banda admitiu que o actual presidente dos Estados Unidos teve uma pequena influência na inspiração deste trabalho, tal como tivera George W. Bush em 2004, para American Idiot. Pelo título, dá para perceber que de facto essa influência até foi bastante notória. Não é por acaso que, nos mais recentes concertos, os Green Day façam questão de deixar uma mensagem bastante clara ao actual presidente no final da canção “American Idiot”.
Deste modo, a abrir o álbum, nada melhor do que a canção que lhe dá nome. É ao som da explosão dos instrumentos e da voz de Billie Joe Armstrong que surge “Father of All…”, single que havia gerado um enorme entusiasmo naqueles que aguardavam pelo novo álbum do trio. Com um ritmo acelerado, os Green Day exibem assim uma canção onde o punk se mistura com elementos próximos do garage rock, mostrando que é possível adicionar novidades ao seu estilo próprio, que continua a apaixonar apreciadores pelo mundo fora. Segue-se “Fire, Ready, Aim”, que, tal como o nome indica, relata a preparação de um disparo, apresenta um estilo mais comercial, mas ao mesmo tempo enérgico, tal como a faixa anterior, apesar de ter uma duração inferior a dois minutos. “Oh Yeah!”, canção dos Green Day que abriu o ano de 2020, inicia-se com a percussão marcante de Tré Cool. É uma das canções mais mediáticas do álbum, onde a melodia e os coros que cantam “oh yeah” são inspirados na canção “Do You Wanna Touch Me”, de Gary Glitter, gravada nos anos 70.
Um encontro à noite no telhado surge na quarta faixa, “Meet me on the Roof”, uma melodia mais calma do que as anteriores, onde o som inicial das teclas lhe confere um estilo próximo de uma balada, numa espécie de canção romântica à moda dos Beatles e com o verso “Go meet me on the roof tonight, girl” a marcar compasso. O baixo de Mike Dirnt e a voz de Billie Joe dão início à canção mais longa do álbum, “I Was a Teenager Teenager”. A letra relata as memórias de uma adolescência onde a descoberta das drogas, a má relação com colegas e a revolta contra a escola foram elementos eventualmente marcantes nos membros da banda. Apesar da letra e do título violento, “Stab You In The Heart” trata-se de uma canção que apresenta um ligeiro travo a rock ‘n’ roll, pelo modo como é tocada e interpretada, mostrando que os Green Day conseguem adaptar-se a outras vertentes, promovendo o estilo soldável e cativante que há no punk rock.
Já em “Sugar Youth”, regressa o compasso acelerado característico das canções dos Green Day e uma letra própria do repertório punk da banda, com o verso “I don’t want to be a Romeo” a dar marcha à canção e aludindo aos bons tempos de juventude. Segue-se “Junkies on a High”, canção com um compasso mais lento e com nuances mais alternativas, nomeadamente nos ecos e nos efeitos que surgem ao longo da melodia e que fazem desta uma faixa bastante distinguível. “Take The Money and Crawl” começa com acordes em modo suave, dignos de um episódio no faroeste e que se elevam rapidamente para a energia do punk rock característica do trio californiano. Na sua letra, os termos obscenos típicos das canções dos Green Day imperam. Por fim, o álbum encerra-se com “Graffittia”, fazendo uma alusão à capa do álbum. Com uma letra bastante crítica em relação ao crime e à violência numa América em constante transformação, os versos “Are we the last forgotten? / Are we the long lost love?” mostram questões pertinentes sem qualquer resposta aparente.
Apesar do conteúdo interessante e das novidades que o álbum apresenta – nomeadamente a aproximação a um rock mais alternativo, mas com uma matriz punk bastante firme – Father of All… peca por escassez no que toca à sua duração. Esperava-se algo mais duradouro numa altura em que a banda esteve quatro anos sem lançar nenhum álbum. Contudo, há que reconhecer que este é um trabalho que continua a mostrar a vivacidade dos Green Day, mantendo vivo o espírito do punk revival que começou no início da década de 90, se intensificou nos anos 2000 e pretende continuar vivo nos anos 20 deste século. Não deixa de ser uma obra musical que irá servir de inspiração a outras tantas bandas punk que continuam a ser inspiradas pelo repertório dos Green Day, assim como outros intérpretes que venham a surgir nos anos seguintes. Passados praticamente 30 anos desde o primeiro álbum, 39/Smooth, Father of all Motherfuckers – dito assim sem censura, porque o punk rock é feito com energia e um toque de loucura, sem censura nem tabus – mostra aquela que poderá ser uma nova era musical, com a sorte e a primazia de ter os Green Day sempre por perto.