“Corte”, dos irmãos Rapazote, em competição no programa Cinéfondation do Festival de Cannes
“Corte”, curta metragem realizada pelos jovens cineastas Afonso e Bernardo Rapazote e produzida pela Escola Superior de Teatro e Cinema, foi seleccionada pela Cinéfondation, a secção competitiva do Festival de Cannes dedicada a filmes de escola do mundo inteiro e novas vozes do cinema independente.
É a primeira vez em duas décadas que Portugal é representado na Cinéfondation e a primeira vez na história da competição que uma produção inteiramente portuguesa é seleccionada, depois das selecções de António Ferreira com a curta luso-alemã “Respirar (Debaixo d’Água)” e de Simão Cayatte com o filme “A Viagem” realizado no âmbito dos seus estudos nos EUA.
O filme propõe um olhar diferente sobre a ordem e a liberdade, bem como sobre a sua impossível conciliação. Para os gémeos Afonso e Bernardo Rapazote “a história é sempre um guia para o futuro, mais do que uma celebração do passado, o filme não é sobre o século XVIII, mas antes sobre a nossa percepção desse tempo com consciência do presente. Partindo dessa noção, pode dizer-se que aquilo que o filme mostra é o fim de uma família: um corte nos resíduos da família nuclear, neste caso a família real, que representa esse núcleo por excelência”.
O que permanece, da imagética criada em “Corte”, são os resíduos de “um mundo em que o pai está ausente e a figura da mãe está morta à partida – o que permanece é o laço de dois irmãos gémeos orientados por um aio que tenta cumprir os dois papéis, e a ideia de um príncipe herdeiro que usa o pretexto da liberdade para agir por si próprio”.
Em “Corte”, assiste-se a uma distorção das regras e dos códigos estabelecidos pelo género whodunnit. “A ironia fatal da progressão do enredo é que uma personagem comete um crime para preservar um ideal de ordem familiar e, ao fazê-lo, destrói o último laço familiar daquele espaço. Por outro lado, aquele que promove ideais de liberdade acaba acorrentado, como se aquele mundo o culpasse pela sua transgressão moral. Por isso mesmo, talvez seja um filme que se coloca no lado errado da história”, explicam os realizadores.
Criada em 1998, a Cinéfondation faz parte da Seleção Oficial do Festival e conta com uma programação de cerca de 15 a 20 filmes, que espelham o dinamismo e a diversidade da jovem criação cinematográfica internacional, de onde emergiram nomes como Corneliu Porumboiu, Jessica Hausner, Antonio Campos, Emmanuelle Bercot, Asif Kadafia, Simão Cayatte entre outros.