Livre de fazer escolhas e preso às consequências
Ao longo da nossa vida fazemos escolhas mais ou menos relevantes. A grande parte das escolhas que fazemos são tão inócuas como decidir o que vamos comer ou se preferimos passar férias na praia ou na montanha. E depois existem as outras escolhas, que tomamos em menor quantidade, mas que são estruturantes e que assumem uma maior relevância. E é sobre uma dessas escolhas que vos venho falar.
Uma dessas escolhas fi-la, como tantos outros jovens interessados em política, quando decidi tornar-me militante de um partido. Não sendo de direita, escolhi o PSD para dar o meu contributo cívico e político — um partido com um espectro político alargado, onde sempre conviveram várias correntes ideológicas. Não obstante o meu pensamento político ser minoritário dentro do partido, acreditava que era possível lutar para que o PSD não abandonasse a sua matriz progressista, que fizesse das políticas redistributivas uma das suas bandeiras. No que às questões sociais diz respeito, sempre me senti à esquerda do PSD, mas com a percepção de que existia espaço para esse pensamento dentro partido.
O partido atravessou, ao longo dos anos, diversas fases e estive várias vezes perto de o abandonar. Os anos foram-se sucedendo e a chegada de Rui Rio ao PSD era uma luz ao fundo do túnel, considerando que prometia colocar o partido ao centro e romper com o período de direita liberal do PSD. Num partido em que as disputas pela liderança há muito não eram ideológicas, mas apenas focadas nos candidatos a líderes, Rui Rio apresentava uma proposta ideológica e prometia colocar o partido ao centro.
A verdade é que nada disto se verificou e o meu descontentamento foi crescendo. O processo de intenções de colocar ao partido ao centro não foi verdadeiramente cumprido e ficou a ideia de que, na senda de Groucho Marx, “estes são os meus princípios, se não gostarem destes, tenho outros”. E neste campo, abandonar os princípios basilares que sustentam o partido não é a forma correcta de se estar na política. Privilegiar eventuais vitórias eleitorais em detrimento de ser fiel à matriz ideológica humanista, não é certamente o caminho a percorrer. Assim, com o acordo estabelecido nas Eleições Regionais dos Açores e com a escolha de uma candidata de extrema-direita à Câmara Municipal da Amadora, o PSD ultrapassou linhas que não podem ser ultrapassadas e com as quais não posso compactuar. Nesse sentido, tornou-se para mim claro que era necessário fazer uma dessas escolhas de que vos falava no início deste texto. Percebi que abandonar o PSD era um imperativo categórico e escolhi sair, tendo tratado a semana passada do processo de desfiliação.
Conheci muitas pessoas no PSD e fiz vários amigos e agradeço a uns e a outros o que com eles partilhei e o que com eles aprendi, mas escolho partir. As escolhas que cada um faz devem continuar a ser livres e as associações a que nos dispomos devem valorizar essa mesma liberdade. As escolhas que um partido faz também devem reflectir isso mesmo.
Lutarei sempre pela democracia e por um futuro melhor e continuarei, sempre que puder, a exercer a minha participação cívica. No entanto, não será enquanto detentor de um cartão de um partido que se esqueceu do significado das suas próprias siglas.