Dario Argento regressa às origens com “Óculos Escuros”
Este artigo pode conter spoilers.
De repente, o octogenário Dario Argento passou de figura reclusa para protagonista de um filme. Precisamente Vortex, ao amigo Garpad Noé, que lhe chegou até a render louvores num festival de cinema, onde a sua personagem assume a decadência junto da mulher interpretada por Françoise Lebrun (a mesma de A Mãe e a Puta). Quase ao mesmo tempo — o tempo de confinamento e de reflexão — deixa-se convencer pela filha Asia e recupera um guião antigo que lhe deu a oportunidade de mostrar daquilo que é feito. Ou seja, um homem do fantástico, do sonho, do horror. É um pouco isso que nos fala Óculos Escuros, que agora estreia nas nossas salas de cinema, um filme que descobrimos no inverno passado, na Berlinale.
É também uma luz que se apaga no início do seu regresso à cadeira de realizador, dando luz a um guião antigo. No caso, de um eclipse lunar total. E será durante esses instantes que a curiosidade de alguns acaba por motivar a perda da visão. Será a partir dessa premissa das trevas que emerge o intento de um assassino para cometer os seus crimes no mais tradicional e gratuito slasher e gore. Por aqui se irá cumprir o desígnio feminino da vítima feminina (Ilenia Pastorelli) como objecto do desejo em fuga.
No entanto, mesmo dentro da assunção ou proximidade dos clichés do género, pode dizer-se que Óculos Escuros é um filme com o selo Argento (Dario na realização e argumento, Asia na produção e co-interpretação, tomando o partido das mulheres indefesas). E com direito à melhor banda sonora com música eletrónica desde os tempos áureos (com os Goblin). Um conjunto assaz potente que nos acelera de uma forma bem mais verdadeira do que muitos thrillers do pipeline industrial.