A Divina Dramédia
E eu digo:
— “London Bridge is Down”(1). Foi esta a expressão de código com que o secretário privado da Rainha de Inglaterra anunciou a morte da monarca à primeira-ministra. Já foi escolhida a frase que será utilizada quando o seu sucessor, Carlos III, der o derradeiro real suspiro: o código é “Uh eeh uh ah ah ting tang walla walla bing bang”(2).
Silêncio.
Uma pessoa manifesta-se. De um universo de 30 e tal. A audiência não é grande, bem sei, mas 1 em 30 é uma péssima concretização.
Continuo.
Tento imitar aqueles tipos cheios de certezas que nos incomodam com Dez tipos de coisas que tens que absolutamente saber/ver/ler/aprender, etc. Vai daí:
— Cinco vogais imprescindíveis para qualquer aspirante a escritor: “A, E, I, O, U”.
Na última letra, duas ou três pessoas acenam como quem percebe a piada.
Já um pouco em pânico, procuro no telemóvel notícias curiosas ou algo do género. Encontrei a história de uma mulher que fez uma operação estética de “estreitamento vaginal”. Mostro a reportagem com a citação: “A minha vagina ficou tão apertada que chia quando ando”. A sorrir, avanço sem medos:
— Ó Joca, que barulho é este, há ratos no sótão?
— Não. É a mamã que acabou de chegar.
Digamos que não foi desta que a barreira foi quebrada.
Regresso aos cabeçalhos insólitos: “Corpo de Homem desaparecido há 10 anos encontrado em frigorífico de bar”.
— A esposa já reagiu: “Não estou surpreendida”.
Quatro pessoas reagem. OK, está a melhorar. Aos poucos isto vai lá.
— Notícia CMTV: “Na Póvoa do Varzim, trabalhador morre sodomizado pelo patrão com um ferro”. É por estas e por outras que eu defendo o teletrabalho!
Afinal não. Mas desistir não está nos meus planos.
— No passado dia 7 de Outubro, o líder russo Vladimir Putin fez 70 anos — inicio a leitura de um horóscopo no ecrã do telemóvel — Os nativos de Balança são pessoas sensíveis, comunicativas e muito ligadas às relações pessoais. De uma maneira geral são pessoas simpáticas, elegantes, que gostam de viver com conforto. São bons amigos, gostam de receber em casa e fazem de cada evento uma ocasião especial…
Cinco pessoas acharam piada. Prossigo.
— Na Grécia antiga, pénis pequenos eram celebrados e vistos como sinais de inteligência. Homens com pénis grandes eram vistos como grotescos, risíveis e bárbaros — paro de olhar o ecrã e enfrento o público — Já virem esta merda desta crenssa dos grêgos, caralho, lol?
Duas pessoas.
Desisto, já chega. Não vale a pena insistir. Vou mas é comer qualquer coisinha.
— Um restaurante em Ovar serve caldo verde com tripas à moda do Porto, fino e café por oito euros e meio. Oito euros e meio!
Dez pessoas aplaudem. A minha maior aprovação. Mas agora? Nem sequer era uma tentativa de humor…
No telemóvel surge uma fotografia do busto de Jorge Jesus desenhado numa melancia. Recordo aquela vez em que o treinador amadorense “cantou”, numa entrevista, uma música de Mariza. Hesito em arriscar outra graçola, já estava mesmo de saída. Mas não resisto: faço uma última piada com aquela imagem projetada para todos:
— Sei que o melão de mim está para chigar.
Reflito se há nesta frase algo de presságio. E não vacilo: mais vale sair mesmo.
De uma vez por todas, está na hora de abandonar o Twitter.
— Boa noite a todos!
1) A Ponte de Londres Caiu;
2) Uh eeh uh ah ah ting tang walla walla bing bang