A falta de árbitros no futebol de formação
No meio dos acasos da vida, quis o destino que, nas últimas semanas, tivesse acompanhado jogos de vários escalões de formação no que ao futebol diz respeito. Pelo meio, vou assistindo a comentários apreciativos e depreciativos, havendo pais que dão indicações contrárias àquilo que o treinador pede aos jogadores, espetadores que trocam galhardetes entre si, e aqueles que simplesmente assistem serenamente a um jogo de futebol entre crianças que apenas se querem divertir. Há formas de estar para todos os gostos, umas mais erradas do que outras, tanto no futebol de formação como na vida.
Contudo, há algo que tenho notado e que venho aqui expor. Na passada semana, assisti a uma partida onde apenas o árbitro principal estava, de facto, capacitado para desempenhar as funções. Não havia assistentes de linha com o curso. Eram, sim, dois miúdos, a rondar os 15 ou 16 anos, um deles com umas calças de fato treino do Benfica e o casaco de um dos clubes que disputava o desafio. Tive, igualmente, conhecimento de outro desafio, onde a entidade responsável pela organização do jogo enviou um email aos clubes alertando que não conseguia destacar nenhuma equipa de arbitragem para a partida. Para terminar os exemplos, fui assistir a dois jogos distintos, cuja distância entre os diferentes campos rondava os 20 minutos. Para conseguir assistir ao início do segundo jogo, saí mais cedo do primeiro. Chegado ao estádio onde se ia desenrolar a partida, reparo que, à hora de início, os árbitros ainda não tinham chegado. Qual não é o meu espanto quando, passado cerca de 20 minutos, a equipa de arbitragem que sobe ao relvado era a mesma que tinha apitado o jogo anterior a que tinha assistido.
Isto tudo para dizer que há falta de árbitros e que, talvez, todos nós, adeptos, sejamos culpados disso. É uma classe que, para exercer o seu trabalho, muitas vezes compromete os fins de semana em que pode estar com a família para apitar jogos ao sol e à chuva. Contudo, desde sempre houve um ódio de estimação para com os “senhores árbitros”. Mesmo quando sabemos que a falta que assinalam é correta, há sempre algum caloroso adepto que se excede nos comentários e dirige um variado número de insultos para o juiz da partida. No futebol de formação é um exagero. Quando o objetivo principal deve ser que as crianças se divirtam e façam exercício, os pais lançam comentários, na maioria das vezes descabidos, que envergonham os próprios filhos que estão no campo.
O cerne da questão é o seguinte: sem árbitros, não há jogo. Tem de haver uma preocupação em formar o melhor possível as novas gerações que ajuizarão as partidas, e dar-lhes todas as condições para terem sucesso, de forma a serem o melhor possível. Contudo, os pais e adeptos também têm de criar um clima saudável no futebol, de forma a que haja vontade, por parte da juventude, de querer ingressar pela via da arbitragem. O ambiente que se vive no futebol é muitas vezes tóxico, e até há pessoas que se admiram de como é que é possível haver ainda quem queira ser árbitro. Se o paradigma não mudar, corre-se o risco de, dentro de poucos anos, haver ainda mais partidas do género daquelas que tenho assistido ao longo destas semanas. E isso não é, de todo o desejável. Cabe a cada um de nós mudar o estado das coisas.