Bem-estar animal: irá a Comissão Europeia cumprir a vontade dos seus cidadãos?
Foi em 2021 que a Comissão Europeia se comprometeu a melhorar e a actualizar a legislação que afecta a vida de milhares de milhões de animais até ao terceiro semestre de 2023.
No âmbito deste compromisso, alinhada aos resultados do anterior Eurobarómetro de 2016, havia muita expectativa no progresso que seria alcançado em representação da generalidade das convicções da população europeia no que toca à protecção animal.
Legislar pelo bem-estar ou, no mínimo, por uma grande minimização do mal-estar inerente às múltiplas formas de exploração animal é urgente e essencial pela maioria dos envolvidos no processo — das vítimas mais directas — os animais —, às menos directas, como os trabalhadores que os manipulam e que convivem diariamente com eles, bem como todos os que sofrem as consequências ambientais do impacto da indústria. Em última análise, de forma mais ou menos subtil, é definitivamente algo que afecta todos e cada um de nós.
A confirmação de que esta é a vontade da cidadania europeia já foi dada em diversos momentos, por exemplo, quando cerca de um milhão e quatrocentas mil pessoas subscreveram a iniciativa de cidadania europeia “End The Cage Age” (Fim da Era da Gaiola). Mais recentemente, houve nova confirmação este mês com a publicação dos resultados nesta temática do mais recente Eurobarómetro, já aqui partilhado e no qual é manifesta a vontade de uma grande maioria de que haja uma melhoria das condições de vida dos animais, nomeadamente que tenham um manuseamento adequado, que tenham espaço para se mover, deitar e levantar, que haja respeito por requisitos éticos básicos, havendo ainda grande preocupação com os momentos vividos já no matadouro. Também uma grande maioria indicou querer mais informação sobre as condições em que os animais são criados.
Não é segredo o grande poder da indústria e, infelizmente, foi confirmado nos últimos dias precisamente que o poder político permanece refém dos interesses das grandes indústrias em vez de cumprir o seu dever de representação da vontade dos seus constituintes.
Apesar de toda a mobilização e trabalho em diversas áreas da protecção animal que tem sido sucessivamente trazido a público acompanhado de grande expressão e necessidade de mais e melhor legislação, tudo indica que não será nesta legislatura que veremos a sua concretização. O compromisso não foi cumprido e sabemos hoje que as propostas — que são o mínimo do que podemos fazer à luz do que hoje sabemos no que toca aos animais — estão na prateleira, implicando o continuo sofrimento de milhares de milhões de animais por mais anos.
A coragem e vontade política fraquejam sempre quando se avizinham eleições, é aí que tantos de nós temos as maiores desilusões no final de uns mandatos e as maiores ilusões quando se aproxima o início de outros. Até quando deixaremos que a nossa expressa vontade seja desrespeitada e que os vários compromissos que nos são feitos sejam sucessivamente adiados? Ainda há tempo e ainda esperamos que até ao final deste ano possamos vislumbrar prateleiras e gaiolas vazias. Não desistiremos e pedimos a quem faz parte desta grande maioria que se junte a nós.
Crónica de Ana Bordalo, gestora de Ação Politica da Abrir de Asas.