Lamento pela Síria

por Frederico Lourenço,    14 Abril, 2018
Lamento pela Síria

Ficcionista, ensaísta, poeta, tradutor, Frederico Lourenço nasceu em Lisboa, em 1963, e é actualmente professor na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Traduziu a Ilíada e a Odisseia de Homero.

No século VIII antes de Cristo, a Síria tentou coligar-se com Israel para conseguir assim resistir ao poderio imperialista da Assíria. No entanto, no ano de 732 a.C. a cidade de Damasco foi conquistada e destruída pelo rei assírio. A população civil sofreu as piores crueldades e indignidades. Crianças foram mortas à frente das mães, que por sua vez foram violadas e levadas para a escravatura. A população masculina foi morta ou acorrentada e deportada.

Sobre isto que aconteceu em 732 a.C., o autor da primeira parte do livro de Isaías escreveu esta «profecia», já depois dos factos ocorridos:

«Eis que Damasco será removida dentre as cidades
E se tornará uma ruína» (Isaías 17:1 LXX; cito o Volume III da minha tradução da Bíblia).

Embora estas palavras do profeta não tenham rigorosamente nada a ver com o que se passa hoje na Síria – ao contrário do que alegam alguns evangélicos fundamentalistas que as têm citado para demonstrar que a Bíblia prevê o que está a acontecer hoje – a verdade é que se está novamente a passar na Síria um horror que não é só secular: é milenar.

O horror da guerra é milenar; as crueldades impostas a inocentes, vítimas dos imperialismos de machos drogados com a sua masculinidade tóxica: tudo isto é uma tragédia humana que se repete hoje. No século VIII a.C. o nome tóxico era o do rei assírio Tiglath-Pileser; hoje os nomes tóxicos são Assad, Trump, Putin, etc. Os sírios de hoje, como os de há 2800 anos, sofrem na pele o horror da «vã cobiça», da «glória de mandar».

A Síria já foi sucessivamente conquistada pelos impérios dos assírios, persas, gregos, romanos, novamente persas, árabes… hoje sofre nas mãos de um criminoso chamado Assad e como foco de embate entre os impérios russo e americano. Pobre, pobre Síria.

«Ao cair da noite haverá lamentação» (Isaías 17:14).

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