AgitÁgueda: o caminho para o futuro
Chegou Setembro, o mês que ainda sabe a mar, mas o Verão caminha a passos muito apressados para o pôr do sol e, aqui por Águeda, o seu emblemático festival já lá vai, restando, ainda, os vibrantes guarda-chuvas coloridos que enfeitam as ruas da cidade, que continuam a atrair, até final deste mês, mais visitantes de outros pontos da região e do país.
Como qualquer evento que ambiciona manter-se relevante e inovador, o AgitÁgueda pode beneficiar de algumas modificações e inclusões que o tornem num verdadeiro farol de Arte e Cultura da região centro de Portugal. E é particularmente por essa razão que aqui escrevo.
Como é sabido (e os aguedenses sabem-o), a iniciativa destaca-se primordialmente pela sua oferta musical e pelo tal impacto visual que os guarda-chuvas oferecem, mas para se consolidar como um festival de Arte e Cultura de referência, seria importante, no meu entendimento, que se trilhasse outro caminho, mais audaz, que não implicasse maior investimento, obrigando a uma reformulação de toda a programação, optando-se pela qualidade em detrimento da quantidade.
Poderiam, pois, ser incluídas exposições de artes visuais, instalações interativas, performances de teatro e de dança contemporânea, e, até uma Feira do Livro, integrando artistas locais (a aposta nos talentos concelhios tem sido envergonhada), nacionais e internacionais.
A arte pública e o design urbano, já presentes através dos guarda-chuvas, poderiam ser explorados de forma mais abrangente, com a instalação temporária de obras de arte (atente-se na conhecida Bienal Internacional de Cerveira) em vários pontos da cidade e do concelho.
Por outro lado, um festival que se afirma cultural deve, também, ser um espaço de reflexão. A inclusão de ciclos de palestras, debates e conferências sobre temas como arte urbana, sustentabilidade e a relação entre Arte e Tecnologia, pode elevar o evento a um novo patamar de relevância cultural, promovendo também Águeda como um centro de pensamento e inovação cultural.
Embora a iniciativa, de três semanas, atraia, todos os anos, visitantes de várias partes do Mundo, há um enorme potencial para expandir a tal dimensão internacional. Parcerias com outros festivais internacionais de renome (olhe-se como actua a d’Orfeu), intercâmbios de artistas e a promoção do festival em mercados estrangeiros, podem aumentar o seu alcance global. Criar residências artísticas (não só a fixa, no Parque Municipal de Alta Vila), que acolham criadores internacionais durante o festival, permitindo-lhes interagir com a comunidade local, poderia enriquecer ainda mais a programação.
Num mundo cada vez mais digital, o AgitÁgueda poderia beneficiar da inclusão de novas tecnologias nas suas atividades e a Inteligência Artificial é uma evidência. Instalações de arte digital, realidade aumentada e experiências imersivas poderiam ser integradas, oferecendo aos visitantes formas inovadoras de interagir com a Arte. A criação de uma aplicação móvel do festival, que ofereça informações em tempo real sobre eventos, mapas interativos e conteúdos exclusivos, também seria uma mais-valia.
Apesar de todo o seu apelo visual e musical, o AgitÁgueda poderia aprofundar o seu enfoque na riquíssima Cultura local. Oficinas de artesanato, exposições de produtos regionais e eventos que celebrem as tradições e a história de Águeda, dariam ao festival uma identidade ainda mais enraizada na comunidade.
Diz-se que o festival é inclusivo e acessível a todas as pessoas, independentemente da idade, capacidade física ou condição social, mas não vislumbro, por exemplo, a ferramenta da audiodescrição e materiais em braille que auxiliem os invisuais. Diz-se que o AgitÁgueda se preocupa com as questões ambientais, mas não se descortina uma corajosa sensibilidade em pôr fim à evidente aposta no plástico na decoração de artérias centrais da cidade, ao invés de se apostar com mais realce nas Crocheteiras de Águeda.
Por outro lado, parece-me de crucial importância investir-se numa estratégia de marketing que inclua mais spots promocionais na rádio nacional e na televisão pública (preferencialmente), ao invés de se apostar sistematicamente em meios de comunicação direccionados para um público que já é conhecedor, por natureza, da realização do evento nas primeiras três semanas de cada Julho.
Um reparo que tem sido frequentemente apontado, e com o qual concordo, tem a ver com a defesa da expansão do festival para além dos seus locais tradicionais, abrangendo todo o concelho, com a criação de rotas culturais que guiem os visitantes por diferentes pontos do município, com actividades e exposições distribuídas por todo o território, de modo a tornar a experiência mais rica e diversificada, valorizando-se o património local e descongestionando as áreas mais visitadas do festival.
Porque não alargar o festival aos Abadinhos (e até ao Estádio Municipal!), e levar iniciativas às margens da Pateira, ao alto da Urgueira, ao Parque Municipal do Souto do Rio, às imediações da represa de Macieira de Alcôba, ao Parque do Sabugueiro (Aguada de Cima), ao Parque de Campismo de Aguada de Baixo, à pitoresca aldeia de Lourizela, ao Parque da Boiça (Valongo do Vouga), ao auditório do Museu da Região do Vouga…?
Antes de terminar, deixo mais uma dica: Após o término de cada edição, seria fundamental recolher o feedback dos participantes e dos artistas participantes no festival, identificando-se pontos fortes e áreas a melhorar no ano seguinte, compilando-se, assim, um documento informativo valioso para a organização.
Ninguém tem dúvidas que o AgitÁgueda é um sucesso (e, até, diga-se, o garante de vitórias eleitorais!), mas o festival pode (e deve!) consolidar-se como um grande projeto de futuro, indo além de repetitivas iniciativas e do mero espetáculo visual, de modo a transformar-se num verdadeiro evento que celebre a Arte e a Cultura em todas as suas formas e dimensões. Será essa, no meu entendimento, a chave para o seu crescimento e para o seu reconhecimento mais amplo.