Entrevista. Realizadora Rita Nunes diz que há mais mulheres no cinema mas mudanças levam tempo
A realizadora Rita Nunes acredita que há um caminho de representatividade “que está a dar frutos”, sobre a presença de mulheres na realização e produção de cinema e audiovisual, mas “as mudanças nunca são radicais”.
Em entrevista à agência Lusa a propósito do filme “O melhor dos mundos”, que se estreia no dia 10 nos cinemas, Rita Nunes reconheceu que hoje “já há mais mulheres realizadoras na ficção do que havia há uns anos”, mas que é preciso continuar a falar-se de questões de paridade de género no setor. “As mudanças nunca são radicais, nunca será de um dia para o outro que as coisas mudam, mas se se for falando disso e fazendo alguma pressão, com o passar dos anos as coisas podem vir a mudar. E já estão a mudar”, afirmou.
Rita Nunes trabalha há quase trinta anos em cinema e televisão, já fez ficção, documentário e também publicidade, numa versatilidade de géneros que se adaptam aos interesses enquanto autora e às circunstâncias do panorama de financiamento do setor.
“O melhor dos mundos” é a segunda longa-metragem de ficção, depois de “Linhas Tortas” (2019), e nela a realizadora também assumiu a produção, tal como aconteceu com a série documental “Efeito Estufa” (2022), para a plataforma de ‘streaming’ OPTO.
Interessada em trabalhar sobre questões do tempo presente, Rita Nunes fez uma ficção ancorada na realidade, sobre a possibilidade de um novo sismo em Lisboa semelhante ao de 1755.
Essa foi a premissa deste filme, uma ideia que tinha em mente há muitos anos e que acabou por se concretizar recentemente, depois de Rita Nunes ter tido conhecimento de um projeto português de investigação científica, de instalação, no Atlântico, de cabos submarinos de telecomunicações para alerta precoce de sismos e tsunamis.
Com consultoria do sismólogo Luís Matias, do Instituto Dom Luiz, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, e apoio de várias entidades, nomeadamente do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, Rita Nunes transpôs para cinema a ideia de se poder detetar precocemente um sismo, e criou uma narrativa passada em Lisboa com personagens ficcionais.
No filme, com a ação situada em 2027, um grupo de cientistas concluiu que em escassas horas haveria em Lisboa, com elevada probabilidade, um sismo da magnitude semelhante ao terramoto de 1755.
Entre os investigadores, em particular entre dois – Marta e Miguel – instala-se um dilema ético sobre se se deve ou não avisar a população sobre esse risco.
O elenco é encabeçado por Sara Barros Leitão e Miguel Nunes, um casal de cientistas que não só discorda sobre o passo seguinte em relação a uma possível catástrofe como põe em causa o relacionamento afetivo de ambos. Rita Nunes explica que “O melhor dos mundos” não é um “filme-catástrofe” sobre terramotos, e o interesse pelo tema tem uma escala maior.
“Estamos numa era de pré-catástrofe sistematicamente, temos a ameaça das guerras nucleares, a ameaça das grandes crises financeiras. Vivemos, como Humanidade, nas últimas duas décadas, pelo menos, nesta questão de pré-catástrofe permanente. E é disso que o filme trata”, disse.
Tendo trabalhado com vários produtores, Rita Nunes quis passar a produzir as suas próprias obras, perceber todos os passos que estão antes e depois da realização, e tem atualmente alguns novos projetos a concurso para obter apoio financeiro no Instituto do Cinema e do Audiovisual.
“É preciso um grande esforço individual e tem sido uma grande, grande luta para chegar onde estou a chegar. E ainda não cheguei a lado nenhum. Este projeto ainda está aquém do que eu gostaria de fazer”, disse.
“O melhor dos mundos” já esteve integrado, este ano, na programação do festival IndieLisboa e faz parte do festival de cinema ambiental da Serra da Estrela CineEco, que começa na quinta-feira em Seia, no distrito da Guarda.