A casa ou a comida

por Fumaça,    1 Outubro, 2019
A casa ou a comida
Pedro Salgado / Fumaça

O que vais ouvir, ler ou ver foi produzido pela equipa do Fumaça, um projecto de media independente, progressista e dissidente e foi originalmente publicado em www.fumaca.pt

Pedro Salgado trabalha na função pública como assistente operacional no hospital de São José, em Lisboa. Ganha o salário mínimo e vive num T2, no bairro da Bica, no centro da capital, com a sua companheira e três filhos.

Há cerca de dez anos que tem problemas em pagar a renda. Foi despejado de uma casa que arrendava à Santa Casa da Misericórdia, em 2016, e recebeu este ano uma nova ordem de despejo, desta vez, de um senhorio individual, no mercado privado.

“Houve um ponto em que tive de escolher: ou dava comer aos meus filhos ou pagava a renda”.

A partir de dia 7 de Outubro de 2019, a família de Pedro Salgado pode ser despejada a qualquer momento. Mas a sua história, da companheira, Julieta Salgado, e dos três filhos, está longe de ser única.

Desde 2013, a nível nacional, mais de 9000 famílias foram despejadas de suas casas – o que equivale a quatro famílias por dia. Isto são apenas os números oficiais. De fora das contas estão pessoas sem contratos de arrendamento formais, outras cujos contratos terminaram e não foram renovados e ainda famílias despejadas de casas que ocuparam. Nenhuma destas realidades está nas contas. Nenhuma destas pessoas tem garantido qualquer tipo de acompanhamento ou ajuda.

A partir de hoje, 1 de Outubro de 2019, entra também em vigor a primeira Lei de Bases da Habitação do país, depois de, em 1976, a Constituição da República Portuguesa ter instituído, no artigo 65.º, que:

“Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar.”

Em relação a despejos, a nova Lei de Bases da Habitação apenas garante “serviços informativos, de meios de ação e de apoio judiciário” durante o processo de despejo e diz que existe “a obrigação de serem consultadas as partes afetadas no sentido de encontrar soluções alternativas ao despejo”, mas não se compromete a encontrá-la para cada caso.

Até ao dia 6 de outubro, vamos estar focados no escrutínio de alguns dos assuntos que consideramos mais importantes à medida que se aproxima a votação que definirá a composição da próxima Assembleia da República e do próximo Governo. Vê toda a nossa cobertura das Eleições Legislativas 2019 aqui.

Correção (02-10-2019 – 09:18)
Ao contrário do que se lia no texto e se ouve na versão áudio, Pedro Salgado e a família poderão ter de deixar a casa a partir de 7 de outubro e não 1 de outubro. As nossas desculpas pelo erro.

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