A morte do poster?
Na semana passada, enquanto ia para o Metro, um antigo aluno parou-me na rua, chamando-me a atenção para a qualidade de uma série de posters colados num tapume ali perto. Eram bastante diferentes entre si, mas via-se claramente que faziam parte de um conjunto, parecendo-se um pouco com cartazes antigos de Jazz, embora em versão vectorial. Nesse mesmo dia, à noite, dois amigos meus tinham uma opinião mais negativa: achavam o pastiche bastante forçado, abaixo do nível habitual do atelier Martino & Jaña. Perguntei-lhes onde os tinham visto, e eles descreveram o mesmo tapume – a caminho do Metro, à entrada do Campo 24 de Agosto.
Era interessante que os mesmos posters, colados no mesmo tapume, despertassem opiniões tão antagónicas, tendo em conta que, nos últimos anos, se tem declarado com bastante frequência que o poster é um formato morto.
Rick Poynor disse-o num artigo publicado na revista Print, salvaguardando que o poster estava mais vivo na Europa continental do que na Inglaterra ou Estados Unidos. Alice Twemlow, escrevendo no Design Observer, foi mais dura do que Poynor, criticando a quantidade de posters feitos de propósito para concorrer a concursos ou aparecer em exposições. Mais recentemente, na Eye, Veronique Vienne resumia as queixas: na era do mupi, o poster tinha-se tornado num formato domesticado; as exposições e concursos tinham feito dele um formato auto-indulgente, concebido por designers para designers; já não era verdadeiramente universal, estando reduzido à esfera da cultura mais alternativa; também não era um formato universal no sentido mais literal, sendo usado apenas em certos países ou cidades, enquanto em outros era considerado obsoleto.
Criando um retrato-tipo a partir destes textos, ficava-se com a ideia de que, para um poster ser realmente um poster, teria de ter um formato superior ao A3 (não podia ser uma fotocópia); podia ter apenas texto, mas não podia ter só imagens (devia ser informativo); teria de ter uma grande tiragem (nada de serigrafias); teria de ser colado numa parede da rua (e não num mupi, outdoor, ou numa sala de exposições); finalmente, teria de ser feito por encomenda de um cliente para anunciar um produto comercial (não podia ser feito por iniciativa do designer, num contexto escolar ou para anunciar eventos culturais).
Este género de crítica demonstra que os designers não julgam o design apenas pelas suas características formais, mas por uma série de questões contextuais muito precisas, o que é interessante, mas levanta também alguns problemas. Em primeiro lugar, revela uma certa incapacidade para pensar no design fora de um contexto laboral muito restrito. Se um poster só é um poster se for produzido ao serviço de um cliente e para anunciar um produto, boa parte dos objectos produzidos por designers hoje em dia ficam de fora do discurso crítico do design. Ficam de fora, também, todos os contextos laborais que não obedecem à norma: designers que não trabalham directamente para um cliente, que trabalham para o Estado, que fazem design para consumo interno de uma empresa, por exemplo. Disto tudo, fica a ideia de que um poster só pode servir um determinado tipo de cliente, produto ou designer – todos os outros usos possíveis são considerados ilegítimos.
No fundo, toda a discussão em torno da morte do poster ilustra uma insegurança crítica dos designers em relação ao estatuto actual da sua profissão – sobretudo em relação às escolas, exposições, publicações e mesmo à própria história do design, que já não parecem servir os interesses imediatos do design enquanto profissão. É precisamente por representar muito bem estas tensões que o poster continua um objecto criticamente importante, seja ele feito para anunciar um automóvel ou para ganhar um concurso de posters.