A simplicidade e descontracção de Duquesa em ‘Norte Litoral’

por Miguel de Almeida Santos,    16 Fevereiro, 2017
A simplicidade e descontracção de Duquesa em ‘Norte Litoral’
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O nome de Nuno Rodrigues estará para sempre intimamente ligado aos The Glockenwise, banda portuguesa de garage rock que anda na luz da ribalta há já seis anos e da qual Nuno é o vocalista. Mas desde 2014 que o rapaz nos mostra que há mais a desvendar na sua mente em constante procura da próxima melodia intoxicante: esse foi o ano em que surgiu Duquesa, o seu projecto a solo, que traz consigo um som descontraído de Verão que encanta realeza e plebe. O EP Duquesa tem todo o charme de um dia solarengo em que o ócio parece infinito, e troca as guitarras gritantes e distorcidas de The Glockenwise por uma sonoridade mais recôndita e pessoal. O assobio de “True” dá corpo à leveza deste lançamento e a faixa final “Abade Nation” assegura definitivamente essa descontracção. E mesmo que não seja a mais memorável das canções, “Douchebag” é um dos principais destaques, recordada instantaneamente mal se ouve aquela primeira guitarra rasgada do início. Duquesa é uma colecção de temas que não concretizam totalmente mas que funcionam como um vislumbrar de Nuno e do seu novo alter ego, um projecto jovial e constante, consistente na sua abordagem ao indie rock e fresco na sua mensagem mundana.

Três anos e um álbum de The Glockenwise depois chega Norte Litoral e à partida é claro que este lançamento é mais desenvolvido que o seu antecessor. Sente-se algo mais ardente e uma produção mais pormenorizada aliada uma maturidade musical contribuem para uma nova etapa na carreira do artista, tanto a nível instrumental como a nível de letras, onde vemos Nuno a escrever de forma mais profunda e concisa, mais séria e emocional. Tem mais andamento e corpo que Duquesa, com uma base harmónica mais desenvolvida e em Norte Litoral Duquesa ganha uma voz mais singular, o artista cada vez mais se descobre a si mesmo. No entanto, a leveza musical é algo que transparece também neste álbum, embora mais disfarçada pelo enriquecimento instrumental que separa os dois lançamentos de Duquesa. O reverb é a sua principal arma de ataque em Norte Litoral, seja na guitarra ou no microfone, e em músicas como “Shape and Size” (com um instrumental à The Cure) ou “Afinal” as linhas de baixo fazem a diferença com uma forte e criativa presença.

Há uma sonoridade partilhada entre Norte Litoral e a música de Mac DeMarco, uma comparação incontornável e certamente uma inspiração. Mas nota-se uma divergência desse estilo, desse modo de fazer música: “Point of No Return” soa a algo que o músico norte- americano faria mas Duquesa dá-lhe o seu toque pessoal, dando andamento ao tema com uma bateria mexida, numa faixa munida de um refrão com um arranjo vocal simples mas eficaz na sua simplicidade. “Better Men” é outro exemplo mas o belo pormenor do saxofone e do bonito solo de baixo bem conseguido fazem da música algo diferente, mostrando Duquesa inspirado pelo que se faz mas determinado em mostrar como ele o faz. A preponderância de arranjos vocais também é algo novo e muito mais explorado neste álbum do que em Duquesa, cobrindo de som as melodias vocais modestas.

Os pontos negativos são poucos mas a ausência de erro não é necessariamente prova de arte. Os “agrafos” musicais no final de algumas músicas destoam e são experimentação sem nexo: em “Myrna”,a música mais desconcertante do álbum, há um piano alegre (reminiscente de “Better Men”) que soa depois da música acabar e que deita por terra a seriedade que os três minutos anteriores construíram. Em “Afinal” ocorre o mesmo, a música acaba e ouve-se um grito suspirado e melódico de Nuno, que se volta a ouvir em de “Point of no Return” mas que não acrescenta nada à música em que se insere.

Norte Litoral é um novo capítulo musical de Duquesa com a já conhecida simplicidade e descontracção do artista, começando na suave “Afinal”, passando pela melancolia regada a  amor de “Closed on Sundays” e acabando de volta a Portugal com a glória do seu “Norte Litoral” e de volta às origens de Nuno, um rapaz com uma guitarra a compor melodias que lhe surgem durante o decorrer da vida. É um álbum transitório mas a vida também o é, com uma sonoridade comum como a vida o é na sua maioria, e Duquesa sempre foi sobre espelhar a vida na sua maioria, abordar o mundano com o seu modo de ver e pensar. É mais complexo que o seu antecessor o que nos mostra que a vida e música de Nuno Rodrigues estão em sintonia, ambas a evoluir e a coleccionar novos momentos com o passar dos anos.

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