A solidão mascarada de comédia em “Rent-a-Cat”
Muitas são as pessoas que combatem a solidão humana recorrendo a animais de estimação. No Japão os gatos são vistos como animais de respeito e elemento fundamental na cultura nipónica, num contexto que se expande aos videojogos ou animação.
“Rent-a-Cat”, da cineasta Naoko Ogigami, é uma comédia (com toques dramáticos) centrada numa jovem mulher, Sayoko, que vive sozinha com os seus gatos e decide abrir um negócio de aluguer de gatos. As situações são exploradas com um tom cómico. A maior parte dos personagens tem alguns toques cartoonescos ou vários estereótipos nipónicos para que seja fácil relacionarmo-nos imediatamente com eles. Essa fina camada emocional existe para esconder um tema mais profundo: a solidão. Este é um dos temas mais preocupantes da sociedade japonesa actual, além de ser também um problema mundial.
O principal objectivo de Sayoko é alugar gatos a pessoas solitárias, que não tenham companhia e que vejam nestes animais um possível amigo. Ao longo da narrativa vamos conhecendo diversas personagens que se enquadram num universo estereotipado japonês: a senhora idosa que vive sozinha e que no passado teve um gato; o homem de negócios que vive longe da família e que tem uma imagem descuidada (porque, teoricamente, nenhum homem no Japão sabe cuidar de si mesmo – ironia); a rapariga que vive insatisfeita com o seu trabalho e que nunca explorou o mundo. Todos estas personagens simbolizam diferentes classes e faixas etárias no Japão e apontam preocupações actuais.
“Rent-a-Cat” aponta para o Japão e grita a largos pulmões por ajuda a nível social. O que fazer a milhares de pessoas que vivem isoladas porque a sociedade japonesa não as consegue integrar? Ou simplesmente porque a vida as encaminhou nesta direcção. Deste ponto de vista, “Rent-a-Cat” ultrapassa a sua fronteira e olha para o mundo.
A personagem de Sayoko é bastante interessante de um ponto de vista mais profundo. À superfície é apenas uma jovem mulher que viveu com a avó, agora falecida, e que agora vive com dezenas de gatos. Além da sua principal ocupação a alugar gatos, Sayoko tem outros trabalhos (ou será tudo apenas uma ilusão?) que vão desde cartomante a vender acções na bolsa. É nesta mistura cómica que o drama é explorado. Sayoko é uma pessoa bastante solitária que deseja encontrar um marido, embora essa solidão não se reflita nas suas acções, já que parece viver tranquila com os seus gatos. É apenas no confronto com a sua vizinha (?!) que Sayoko demonstra mais a sua frustração.
“Rent-a-Cat” não é um filme criativamente complexo ou denso, é apenas uma elaboração cómica e algo exagerada (será?) do que a solidão simboliza para várias pessoas e de como os gatos podem ajudar-nos a combater essa tristeza/vazio. Não existem planos elaborados, uma montagem eximia ou uma banda sonora cativante. Tudo é simples do ponto de vista técnico e resulta tudo bem por ser assim.
Naoko Ogigami explora de forma bastante consistente os medos e confrontos da sociedade global, inserindo sempre personagens carismáticas ou momentos caricatos, próprios da cultura japonesa, mas facilmente compreendidos por todos os espectadores.