Álbuns com Pó. Redescobrindo Marcos Resende e o seu Index

por Francisco Espregueira,    6 Fevereiro, 2021
Álbuns com Pó. Redescobrindo Marcos Resende e o seu Index
Capa do disco
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Pouco se sabe sobre o trabalho de Marcos Resende & Index, mesmo para os aficionados e coleccionadores de música brasileira, para além do clássico LP Festa Para um Novo Rei, lançado no fim dos anos 70 pela icónica MPBC. Agora, é a partir de Londres que essa história é, em parte, desvendada. A editora Far Out Recordings — que dedica grande parte dos seus esforços a reeditar pedaços de ouro de música brasileira — apresenta o álbum de estreia deste projecto, nunca editado ao longo destes 35 anos que, entretanto, passaram. O auto-intitulado Marcos Resende & Index, agora reeditado em vinil, é um contributo essencial dessa época gloriosa para a música progressiva e instrumental do nosso país irmão.

Tendo começado a tocar o acordeão aos dois anos de idade e tendo aprendido por si só piano quando tinha seis, Marcos Resende foi desde cedo visto como um músico prodigioso. Apesar do seu imenso potencial, Resende veio para Lisboa durante os anos 60 para estudar Medicina, não deixando, no entanto, de explorar a sua paixão, formando um trio que chegou a abrir para o lendário Dexter Gordon no Cascais Jazz Festival, em 1971. O sucesso relativo, fazendo parte de um meio onde a música jazz nunca foi valorizada em larga escala, não foi suficiente para que deixasse qualquer gravação desses tempos. Marcos Resende haveria de voltar ao Brasil após a revolução de 1974, estabelecendo-se mais tarde como um compositor, teclista e inovador de renome.

As influências da sua longa estadia em Portugal, especialmente do rock progressivo que chegava dos hubs do Reino Unido e dos Estados Unidos com facilidade, começaram a marcar presença nas suas obras. É por esta altura que forma um novo quarteto com Rubão Sabino (baixo), Cláudio Caribé (bateria) e o grande Oberdan Magalhães, conhecido por ser parte da Banda Black Rio. Marcos Resende & Index mistura, como poucos projectos conseguiram, as texturas do rock progressivo dos anos 70 com todo o universo de sonoridades e ritmos tipicamente brasileiros. Ao fim de seis faixas, tão desenvolvidas musicalmente que nos abstraem da vida ao longo de cerca de 40 minutos, não encontramos razão alguma para não incluir esta obra na mesma ‘prateleira’ onde guardamos João Donato, Marcos Valle ou Azymuth.

Depois de ter partilhado palcos com Gilberto Gil, Chico Buarque, Edu Lobo e tantos outros gigantes, a sua carreira como líder de banda ficou mais para trás, sendo esta a oportunidade de a conhecermos (ou de a relembrar). Marcos Resende guardou um tesouro, talvez porque não sentiu na altura que seria valorizado na magnitude que mereceria. Então resta-nos a nós, que vivemos nesta era fantástica em que temos acesso ao infinito passado e ao infinito presente, estejamos onde estejamos, apreciar Marcos Resende & Index — conectando histórias passadas em Lisboa, no Rio de Janeiro e em Londres. O disco encontra-se disponível em vinil, CD e formatos digitais através da Far Out Recordings.

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