Anne Applebaum defende que o império soviético tentou destruir as civilizações e sociedades na Europa de Leste
A historiadora e Prémio Pulitzer Anne Applebaum defende que o império soviético tentou destruir as civilizações e sociedades na Europa de Leste, anulando qualquer potencial ameaça, incluindo igrejas, grupos de jovens e partidos políticos.
A autora do livro “A Cortina de Ferro – A Destruição da Europa de Leste”, lançado em Portugal na quinta-feira pela Bertrand, sustentou, em entrevista à Lusa, que grande parte da história da ocupação soviética no leste da Europa, após a II Guerra Mundial, já era conhecida, mas a abertura de arquivos permitiu saber “mais precisamente como isso foi feito”
“Sabíamos que havia uma luta pelo poder político e que eles procuravam derrubar aqueles regimes nascentes em vigor após a guerra e substituí-los por regimes comunistas de estilo soviético”, comentou, mas os arquivos demonstraram que a União Soviética e o Exército Vermelho, além da secreta NKVD, “estavam muito interessados desde o início numa ampla gama de instituições” e procuraram anulá-las.
“Portanto, não se tratava apenas de política, ou economia. Na verdade, a mudança económica foi uma das últimas coisas que eles fizeram”, observou a historiadora, especializada em comunismo e Europa pós-comunista, professora na London School of Economics e Prémio Pulitzer, em 2004, com o livro “Gulag”.
Nascida nos Estados Unidos mas com fortes laços com a Polónia, onde foi correspondente da revista Economist, Applebaum apontou que “as primeiras coisas em que [os soviéticos] estavam interessados eram as instituições civis, o que chamamos agora de sociedade civil”, como igrejas, grupos de jovens e partidos políticos.
“Portanto, uma das primeiras coisas que eles tentaram fazer foi controlar as estações de rádio, que era o meio de transmissão mais importante da época e também uma dos mais perigosos”, observou, numa visão em que os soviéticos, através dos seus políticos, militares, polícias e burocratas, tentavam manipular a sociedade e suas instituições.
Justificando o pós-título da sua obra “Destruição da Europa de Leste”, a historiadora afirmou que foi disso que se tratou “em muitos níveis da civilização e da sociedade”.
Instituições que representavam qualquer tipo de ligação com o passado histórico, até na arquitetura, em que “os ocupantes tinham uma ideia diferente do tipo de edifícios deveriam ser construídos”, tinham de ser controladas e substituídas por um novo modelo.
“Na essência, foi realmente uma tentativa de construir um novo tipo de civilização. Eles estavam interessados em destruir quaisquer ligações com o que existia antes da guerra”, reforçou, comentando que o período em análise (1944-1956), apesar de longínquo, a que se seguiu o fim da Guerra Fria e desagregação da União Soviética décadas mais tarde, deve merecer a reflexão de que “a liberdade nunca durará para sempre”.
É muito importante, prosseguiu, “que as pessoas estejam vigilantes sobre a manutenção e reforma das suas instituições, prestar atenção quando elas estão a tornar-se desacreditadas e manterem-se abertas”, indicando os casos de países anteriormente dominados pelo império soviético, como a Polónia e Hungria, e que caíram nas mãos de poderes extremistas.