Entrevista. António Coimbra de Matos: “Há doenças mentais porque há pais e sociedades doentes”

por Fumaça,    17 Agosto, 2020
Entrevista. António Coimbra de Matos: “Há doenças mentais porque há pais e sociedades doentes”
António Coimbra de Matos
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O que vais ouvir, ler ou ver foi produzido pela equipa do Fumaça, um projecto de media independente, progressista e dissidente e foi originalmente publicado em www.fumaca.pt.

“Ainda se acredita muito que as doenças mentais vêm de dentro do indivíduo, que são pulsões, fantasias. Não se dá muitas vezes o peso suficiente à sociedade. Há doenças mentais porque há pais e sociedades doentes.” 

António Coimbra de Matos diz isto a Miguel Mealha Estrada, psicanalista pediátrico com quem conversa no livro A Vida é um Sopro (Oficina do Livro, 2018). É uma generalização que o médico, figura incontornável da pedopsiquiatria e da psicanálise em Portugal, passa uma parte desta entrevista a explicar: uma criança doente pode ser uma sintoma de uma família perturbada. Então, como tratamos a família?

Coimbra de Matos, 91 anos, dedicou grande parte da sua vida a tentar entender a depressão. Desinteressou-se pela psiquiatria nos primeiros anos de carreira, no início dos anos 60. A prática era pouco eficaz: havia poucos medicamentos, acabavam de aparecer os antidepressivos, usavam-se eletrochoques e choques insulínicos (provocados pela injeção de insulina). Iniciou o internato em neurologia, que não terminou, e encontrou-se, por mero acaso, na psicanálise.

Trabalhou com adultos no Hospital Júlio de Matos, atual Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa. Em 1967, foi para o Centro de Saúde Mental Infantil e Juvenil da cidade, onde trabalhou com João dos Santos, pioneiro da pedopsiquiatria em Portugal, e ficou diretor durante 20 anos. O centro encerrou em 1992 para dar origem ao Departamento de Pedopsiquiatria do Hospital D. Estefânia, onde Coimbra de Matos deu consultas até à reforma. Hoje trabalha apenas no seu consultório privado, em Lisboa.

Iniciou carreira como professor em 1982 na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, e em 1990 tornou-se docente no Instituto Superior de Psicologia Aplicada. Foi presidente do Colégio da Especialidade em Psiquiatria da Infância e Adolescência da Ordem dos Médicos. E, agora, vê-se como professor-investigador: “Não baseado nas doutrinas do Freud ou de outro qualquer, é na observação dos meus pacientes que retiro informação e construo as minhas teorias”, costuma dizer.

Hoje resume os mais de 60 anos de prática clínica a um conjunto de histórias que gosta de contar. Nesta entrevista, gravada numa manhã de julho no seu consultório em Lisboa, conta umas quantas, enquanto falamos de depressão, doenças mentais e as relações com a família e o trabalho.

Esta entrevista foi feita a propósito de uma grande reportagem sobre saúde mental e prevenção do suicídio na qual estamos a trabalhar, financiada com uma bolsa de dois mil euros atribuída pela ARIS da Planície – Associação para a Promoção da Saúde Mental. O contrato pode ser consultado aqui.

[Imagem retirada do vídeo II Encontro Internacional sobre o Desgaste na Profissão Docente – António Coimbra de Matos]

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