APEL rejeita uso generalizado de Inteligência Artificial pelas editoras portuguesas denunciado em carta aberta
A Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) rejeitou que exista uma prática generalizada de recurso à Inteligência Artificial (IA) para tradução de livros, como denunciado numa carta aberta, admitindo apenas casos isolados que não definem a prática comum.
A reação da APEL surge na sequência de uma carta aberta assinada por mais de 60 tradutores, escritores, editores e livreiros portugueses, que denunciam o uso de ferramentas de IA em traduções urgindo medidas de regulação em defesa das obras e dos profissionais.
“A APEL não tem informação de que, e citando a carta, ‘A tradução de livros feita essencialmente com recurso a programas de Inteligência Artificial (ChatGPT, DeepL) tem sido uma prática cada vez mais utilizada no mercado editorial português’”, disse o presidente da associação à Lusa, em respostas por escrito.
Pedro Sobral negou ainda que esta prática seja um processo comum dos editores portugueses, muito menos usando ferramentas abertas como as indicadas.
O presidente da APEL, como membro do comité executivo da Associação Internacional de Editores (IPA, na sigla em inglês) – e a APEL como associada da IPA -, “assinou e apoiou uma declaração conjunta sobre este tema e sobre o uso de sistemas abertos”, na qual “é clara a necessidade de regular o uso de sistemas abertos como o ChatGPT, que são opacos quanto aos dados editoriais adjacentes que usam para treino de algoritmos e que não estão a cumprir os códigos de direitos de autor remunerando-os através de acordo com os editores”.
Para o representante dos editores e livreiros, esta é uma situação que “tem de mudar e é necessária regulação urgente para resolver esta questão que é premente, ilegal e grave”.
Mas quanto à ideia de traduções feitas por IA, o responsável garante que “os editores portugueses cumprem escrupulosamente a lei e são os guardiões na defesa e garantia” dos direitos de autor e dos direitos editoriais, pelo que “não tornariam ‘prática comum’ o uso de ferramentas que estão feridas de ilegalidade neste tópico e não estão a garantir quer os direitos dos editores, quer dos autores”.
“Claro que poderão existir casos isolados de vários agentes do livro (de autores a tradutores e revisores) que usam estas ferramentas, mas isto nem define prática comum e apenas responsabiliza individualmente quem o faz”, sublinhou.
Por não se rever nesta posição conjunta, a APEL não assinou a referida carta aberta, considerando que “relevar uma prática comum que não existe nos editores portugueses”, denunciar “políticas editoriais que empobrecem o livro, que são inexistentes”, e, por casos precisos e isolados, tentar “inferir uma caracterização coletiva dos editores portugueses está errado, não é real, nem poderia ser endossado pela APEL”.
Voltando a citar a carta, Pedro Sobral afirmou que a APEL também “não tem dados de mercado que provem que ‘os leitores, atraídos pelos preços baixos destas edições e desconhecendo os motivos que os justificam, adquirem traduções de fraca qualidade; as editoras abalam a confiança dos leitores quanto à qualidade dos seus livros, o que os levará a optar por edições de referência noutras línguas’”.
Na opinião do responsável, “não há uma política editorial que contribuía para o empobrecimento real de leitores e escritores”, porque não é essa forma que os editores pautam a sua posição no mercado, antes pelo contrário, uma vez que tem havido uma crescente diversidade editorial e preocupação em responder à procura dos leitores.
“Parece-nos também que, felizmente, não é só preço baixo que seduz o leitor. É também a qualidade da escrita, da tradução e também da edição”, afirmou, lembrando que os editores portugueses têm consciência de que “a excelência do que editam é o que lhes permite construir um catálogo credível, um conjunto de livros que ao serem editados perduram e continuam sempre a vender e a ser procurados”.
“Iniciar o uso de ferramentas que ferem essa excelência, que produzem um livro onde a qualidade não é central, é considerar que os editores portugueses não só não sabem o que fazem, mas também que não têm tido a capacidade de colocar no mercado do livro milhares e milhares de livros que são qualitativamente impolutos. Por isso esta afirmação é incorreta”, considera, acrescentando acreditar que os casos excecionais que “não têm estas características” estão condenados a uma “vida curtíssima”.
Pedro Sobral destacou ainda que os editores não encaram a tecnologia como um inimigo, reconhecendo a mais-valia dos parceiros tecnológicos que contribuem para “um ecossistema do livro mais saudável, mais sustentável, rentável e inovador e que chegue a cada vez mais pessoas”.
“Como tal, veem na IA oportunidades para melhorar esse ecossistema e usar a inovação para criar mais valor não só para os editores, mas também para autores, livreiros e restantes agentes”, desde que esta não comprometa a qualidade e o cumprimento do licenciamento dos direitos autorais e editoriais que subjazem a essa tecnologia e a esses modelos de inteligência artificial”.
A este propósito, aplaudiu a recente aprovação do Regulamento para a Inteligência Artificial – AI ACT – pelo Parlamento Europeu, considerando estarem reunidas as condições para “potenciar as oportunidades que a IA cria para a edição cumprindo integralmente com a defesa e remuneração dos direitos de autor e de edição”.