“Armadilha”, o despretensioso e entretido filme de M. Night Shyamalan
Este artigo pode conter spoilers.
“Trap”, no português “Armadilha”, é o novo trabalho de M. Night Shyamalan. Depois do hábil “Knock at the Cabin”, o realizador traz-nos agora um filme inspirado na vida real, mais concretamente na ‘Operation Flagship’, onde em 1985 as autoridades norte-americanas convidaram uma série de criminosos para um jogo de NFL fictício, juntando-os no mesmo local, à mesma hora, permitindo assim uma operação policial que resultou em mais de uma centena de detidos.
Neste “Armadilha”, a acção desenrola-se num concerto de uma estrela pop, Lady Raven, interpretada pela filha do realizador, Saleka Shyamalan (ignoremos o óbvio nepotismo), onde se sabe que um assassino em série, conhecido como “The Butcher”, irá marcar presença com a filha, fã da cantora. Desse dado parte-se para uma autêntica caça ao homem com um cerco feito ao local do concerto e o criminoso, que descobre que a operação policial é por sua causa, a tentar encontrar uma maneira de sair.
Comece-se pelos apontamentos (bastante) positivos para as cenas filmadas no concerto que retrata desde início com bastante competência a atmosfera de grande sala e de grande produção musical, para o qual muito ajuda o som – imaculado naquilo que é o retrato de uma sala de concertos – num ambiente rodeado de histerismo e entusiasmo adolescente. Na mesma senda, há que salientar Josh Hartnett, num papel onde é bastante competente enquanto Cooper e “The Butcher”, aliando a postura e ternura paternal com a frieza e calculismo de “ambas” as suas existências. A conexão entre o actor e a filha Riley (Ariel Donoghue) é mesmo um dos pontos altos do filme.
A realização falha no momento em que foge ao próprio conceito a que se propõe. Em vez de trabalhar esse jogo de gato e do rato durante o concerto, o realizador desenvolve quase separadamente duas narrativas, a do próprio concerto e a da descoberta do cerco policial por parte do criminoso, sem nunca conseguir agilmente conjugar esses dois focos num só. A certa altura chega a tornar-se inexplicável a quantidade de pessoas que, enquanto o concerto decorre, estão do lado de fora a comprar merchandising ou comida, já para não falar de vários encontros “acidentais” nos corredores do pavilhão. Um exercício de suspensão de descrença necessário para que aproveitemos uma obra que é, ainda assim, bastante agradável, pelo menos até ao acto final.
“Armadilha” é um filme competente e agradável enquanto resiste aos múltiplos finais que M. Night Shyamalan insere no último terço do filme, dando ideia, a certa altura, que o realizador decidiu colocar na tela todos os possíveis desfechos que idealizou para o filme. Tudo isso resulta numa conclusão demorada, arrastada e que dá ao filme bem mais minutos do que seria recomendável, não existindo qualquer evolução na última meia hora. É também a prova de que neste filme M. Night Shyamalan largou o pretensiosismo e excesso de sobriedade de que muitas vezes foi criticado e decidiu fazer uma obra que não se leva demasiado a sério, sendo uma boa proposta de experiência cinematográfica se o público for sem grandes expectativas ou apenas em busca de um filme entretido, com uma cena pós-créditos bem disposta e imperdível.