As mães no cinema
“Menos de um em cada quatro realizadores europeus é uma mulher”, diz o Observatório Europeu do Audiovisual. E acho que, só isto, diz muito. Mas, avancemos com mais dados do mesmo Observatório: “na Europa apenas entre 8 a 35% dos filmes são realizados por mulheres, perfazendo uma média de 23%. Em Portugal essa média desce para 15%.”
E a questão fica no ar: “porquê?”
Muito haverá a dizer para conseguir responder a esta pergunta. A priori, sabemos de antemão que existe desigualdade salarial intrínseca; dificuldade no acesso à carreira, progressão e oportunidades; assédio; abuso do poder e benefício de grupos privilegiados de homens; entre muitos outros. No entanto, há outro ponto que acaba por ser transversal, não só para mulheres que ambicionam uma carreira em Cinema, mas para qualquer carreira: a maternidade.
E foi sobre isso mesmo que, numa tarde de junho, me sentei numa mesa redonda com a realizadora alemã, Franziska Margarete Hoenisch e o realizador Pedro Cabeleira, para falar de Maternidade dentro da Indústria Cinematográfica, dentro do Directors Hub do FEST – New Films, New Directors, em Espinho, um dos maiores festivais do país, no que concerne a contacto com a indústria cinematográfica.
Ser mãe numa área como a do Cinema não é de todo simples. Os trabalhos não surgem todos os dias e, em Portugal, então, parece que vivemos de migalhas, andamos a pedinchar apoios aqui e ali. A grande parte de nós, tem de ter outros trabalhos que permitam continuar a produzir. Os pagamentos são incertos; a recibos verdes. E vamos colocar os pés na terra: num set, que não é um trabalho fixo, das 9 às 5, uma mulher grávida ainda é vista como um problema. Depois, a criança nasce e há toda a licença de maternidade que afasta, obrigatoriamente, a mulher do meio. Numa trabalhadora a recibos verdes, o que isso significa? E, depois de voltar ao mercado de trabalho, com dias de rodagem de 18 horas, quem fica com a criança, já que não existe qualquer apoio num set? Como se consegue manter a amamentação?
Se formos a imaginar um casal moderno, sem rede de apoio, alguma carreira fica para trás. E, diz a “tradição” que: os cuidados dos filhos ficam, principalmente, a cargo da mãe. Apesar de, hoje em dia, já termos evoluído para uma divisão mais igualitária das funções paternais, ainda há muito a palmilhar. O que não quer dizer que as mulheres as queiram deixar de fazer. Só naquela mesa redonda, e em conversa com outras mulheres e mães e pais do público, descobrimos que ninguém se quer afastar dos filhos. Portanto, a presença dos bebés e crianças num set teria de ser uma realidade.
Realizar um filme é comunicar um forma de olhar o mundo. Ter mulheres e mães a trabalhar num filme, qualquer seja a função, enriquece-o. Se continuarmos a impedir as mães de o fazer, perdemos essa visão. Será que é justo? Fica a questão.
Esta crónica foi originalmente publicada no Jornal de Leiria, tendo sido aqui publicada com a devida autorização.