As nossas mães não precisam de flores, precisam de nós

Hoje celebra-se o Dia da Mãe — e, como todos os anos, somos inundados com anúncios de perfumes, chocolates, flores e mensagens de “amor incondicional”.
Mas o Dia da Mãe não é só isso — é (ou devia ser) muito mais. É um dia para refletirmos sobre tudo o que ainda falta conquistar para muitas mães.
Lembrei-me da música “Mother”, dos Idles, cujo refrão é:
“My mother worked 15 hours 5 days a week.
My mother worked 16 hours 6 days a week.
My mother worked 17 hours 7 days a week.”
A letra da banda de Bristol é repetitiva, bruta, quase desconfortável. Mas é também um retrato honesto da vida de muitas mães — sobretudo daquelas que não aparecem nas campanhas publicitárias. Mulheres trabalhadoras, por vezes exaustas, invisíveis, que sustentam famílias sozinhas, trabalham em horários impossíveis e, ainda assim, são pressionadas a ser afetuosas, presentes e emocionalmente disponíveis.
O mais interessante é que os Idles não se limitam à denúncia — são provocadores:
“The best way to scare a Tory is to read and get rich.”
Uma frase crua, mas clara. Um grito contra a hipocrisia das sociedades conservadoras que falam muito do “papel da mãe”, enquanto perpetuam sistemas que a mantêm na pobreza. Porque o problema nunca foi a falta de amor — é a falta de tempo, de apoio.
Celebrar o Dia da Mãe sem falar de política é uma escolha. E é uma escolha confortável. Porque, quando falamos de mães, falamos de trabalho não remunerado, de desigualdade de género, de precariedade laboral, de políticas públicas de parentalidade. É por isso que a canção termina com um insulto — é raiva, sim, mas também é luto. Luto por tudo o que foi exigido às nossas mães. E por tudo o que continua a ser exigido.
Falta muito para alcançarmos a plena igualdade. Não é normal, nem aceitável, que uma mulher, só por ser mãe, seja julgada quando procura emprego, ou pior, despedida por isso. Educar uma criança exige tempo, cuidados e recursos. Ao ignorarmos essa realidade, estamos a perpetuar desigualdades profundas entre homens e mulheres, entre mães e o resto da sociedade. É urgente, alargar as licenças parentais — para que cuidar de um filho não seja uma penalização profissional, mas um direito partilhado e protegido.
Neste Dia da Mãe, talvez o melhor presente não seja um ramo de flores, mas um olhar mais sério sobre o que é ser mãe no século XXI.
E, quem sabe, uma promessa: que vamos lutar por um futuro em que ser mãe não seja sinónimo de sacrificar tudo.
Porque, como dizem os Idles, “I know nothing, I’m just sitting here looking at pretty colours.” E talvez esteja na hora de parar de olhar para as cores e começar a ver o que está mesmo à frente dos nossos olhos.