Chamar debates é exagero, a começar pela duração e a terminar no conteúdo
Portugal vai a votos no próximo dia 30, e como é habitual já tiveram início os debates que colocam frente a frente os candidatos dos partidos que concorrem à casa da democracia. Sendo que desta vez, chamar debate ao que temos visto é um claro exagero, a começar pela duração, a terminar no conteúdo.
Já todos ouvimos o provérbio popular português que diz que três é a conta que deus fez. Está na internet e todos sabemos que se está na internet é verdade. Ainda que me custe a acreditar que deus saiba fazer contas, mas isto são orações para outros terços. E se, para alguns, não existem dúvidas em relação a conta que deus fez, também não existem dúvidas em relação a conta que as televisões fizeram. Vinte e cinco minutos: foi esta a conta que a TV fez. Isto à propósito da duração dos debates. A contar com o dia de hoje estamos há precisamente 25 dias das eleições (sou muito dado a simbolismos) e a única coisa que estes debates, cujo objetivo é, digo eu, discutir o futuro do país, conseguiram o mais difícil, fazer-nos ter conversa de elevador, andamos a falar do tempo. E há quem continue sem saber como ascender ao piso de cima.
As televisões optaram por conceder 25 minutos para se debater ideias para o futuro de uma das eleições mais importantes para o país, e o triplo do tempo aos ditos especialistas que surgem, qual reis da interpretação para nos elucidar sobre aquilo que deixamos passar. Depois segue-se a habitual escolha de um vencedor, quando a continuar assim, fica claro que perderemos todos.
Ainda sobre este assunto das análises à posteriori dos debates, dizer que devíamos ter aniquilado os primeiros youtubers que surgiram com os primeiros vídeos de react na internet. Nada fizemos e agora há quem acredite que é mais importante a reação ao conteúdo do que o conteúdo em si. Agora se percebe o porquê de alguns serem primeiro comentadores e apenas mais tarde candidatos.
E numa altura em que um canal de televisão estreia pela milésima vez um reality show que consiste em trancar pessoas numa casa, desta vez com uma quantidade de famosos duvidosos, fica bastante claro que este país tem um fascínio estranho por reality-shows quando os canais propõem um modelo de debate que parece o confessionário destes mesmos programas, e os candidatos aceitam. Para quem já viu, uma vez que seja, o Big Brother, a referência é de fácil acesso. Os concorrentes, à vez, ora sozinhos, ora em par ou tripla, dirigirem-se à uma pequena sala, a que dão o nome de “confessionário” e vão respondendo às perguntas da apresentadora. Normalmente estas perguntas andam à volta do que aconteceu durante a semana, das relações que se iniciaram, as que terminaram, as que estão por iniciar, e as que estão por terminar. Do que temos visto, os debates não andam longe disso. Fala-se das coligações que estão por iniciar, das coligações que terminaram, e tal como no Big brother, nos debates para legislativas também temos o nosso arruaceiro de serviço que junta a uma necessidade estranha de falar muito alto o racismo, misoginia e a mentira. Não se ficam por aqui as semelhanças, porque tanto nestes debates que temos visto, como no Big Brother, eles falam, falam, mas não dizem nada. Pelos menos, até agora não têm dito. E a continuar assim, não há chamadas que nos valham, porque perdemos todos.
A ver o debate de ontem entre o líder o Partido Comunista e o actual Primeiro-Ministro somando as intervenções do pivot, Pedro Mourinho, que insistia em saber porque é que a geringonça tinha chegado ao fim, a sensação com que fiquei é que não estávamos perante um debate, mas sim, uma espécie de intervenção de um amigo ao casal recém separado. Quando calha, fala-se do passado, Portugal e o seu saudosismo. Também se fala da maquilhagem certa que o líder do CHEGA tem de usar para que o líder do PSD aceite enrolar-se com ele. Falar do futuro é que nada. Mas como se costuma dizer, no programa já citado, “os portugueses estão a ver tudo”. Ou não.