Chemtrails Over the Country Club: a música cinemática de Lana Del Rey a meio-gás
A frase “not all who wander are lost” remete-nos à liberdade para divagar, para escolher a direcção que mais chama por nós sem confirmar com a bússola. Fazemo-lo cientes de que o desconhecido não é sempre sinónimo de perdição. A frase foi popularizada por J.R.R. Tolkien no clássico O Senhor dos Anéis: A Irmandade do Anel. É também majestosamente proferida em falsete no refrão de um tema lançado por Elizabeth Grant, que faz parte do seu mais recente álbum Chemtrails Over the Country Club. A gigante da pop mais conhecida como Lana Del Rey “rouba” a frase de Tolkien sem nunca lhe tirar o significado e junta-lhe um pacífico instrumental, qual banda sonora para ver pinheiros abanar ao sabor do vento.
À semelhança da magistral epopeia visual que é a adaptação para o grande ecrã da obra de Tolkien, não há como negar a qualidade cinemática da escrita de Grant. Neste seu sétimo álbum, a artista norte-americana convida-nos a explorar locais do mundo e da sua mente através de sonoridades recatadas e mais íntimas. Confrontada com a bênção/maldição do estatuto de celebridade, Chemtrails Over the Country Club é uma ponderação do escrutínio e análise a que é sujeita a existência pública de Lana del Rey. “White Dress” abre o álbum com um curioso esforço vocal de Grant num sôfrego e nostálgico refrão, ansiando por tempos em que tudo era mais simples. Imaginamo-la a cantar este refrão de olhos fechados, totalmente absorta neste desejo de andar para trás no tempo.
Mas ainda que pareça tudo mais complicado, há que saber apreciar o momento e é isso que a faixa-título demonstra. A tranquilidade de um country club é sobreposta ao significado mais metafórico dos chemtrails, rastos deixados por aviões e que alguns “iluminados” erroneamente consideram ser agentes químicos ou biológicos, frequentemente associados à insanidade das teorias das conspirações. No meio de toda a estática, há que saber parar e apreciar as coisas boas que a vida tem para nos oferecer, junto daqueles que nos fazem felizes. Grant está ciente dos perigos da fama, como descreve na potente “Dark But Just A Game”, estabelecendo uma dualidade entre a tensão das estrofes (“The faces aren’t the same, but their stories all end tragically”) e a clarividência do refrão, em que se mantém fiel a si mesma independentemente do que aconteça à sua volta (“So I’m not gonna change / I’ll stay the same”).
E, ao manter-se fiel a si mesma, Grant volta a discutir as suas experiências amorosas com um condão exclusivamente seu. Em “Wild at Heart”, ouvimo-la gloriosamente livre, convidativa para o seu amante sem nunca o deixar escapar impune (“You’re killing me more / Than coffee pots and Insta’ thots”). “Breaking Up Slowly” é uma balada de contemplação que remonta a uma relação que se arrasta pelas ruas da amargura, a outra face da moeda que é a fértil relação descrita em “Yosemite”. Por outro lado, “Tulsa Jesus Freak” e a sua batida pacatamente mexida encontram-se algures no meio, ansiando pela relação que existiu um dia mas que, pelo tom de voz da artista, sofrido e debilitado, talvez não exista mais. São músicas que nos relembram que este é definitivamente um projecto de Lana Del Rey.
Mas ainda que Chemtrails Over the Country Club seja um álbum em que é patente a artista, os atributos da música de Lana Del Rey já foram mais habilmente explorados pela própria em projectos anteriores. O álbum desenvolve-se a meio-gás, sem nunca atingir verdadeiramente o seu potencial, como em “Dance Till We Die”, que desagua num apogeu blues que peca por não ser maior. É uma ponderação sobre a situação actual de Grant, sem esquecer as temáticas que a trouxeram à ribalta. Mas na passagem da mente para o estúdio perdeu-se algo e é aí que Chemtrails Over the Country Club não cumpre.