Congresso francês aprova inclusão da interrupção voluntária da gravidez na Constituição
O Congresso francês aprovou hoje a inclusão do aborto na Constituição, tornando-se no primeiro país do mundo a garantir a interrupção voluntária da gravidez como um direito na lei fundamental.
Em Congresso hoje reunido em Versalhes, os senadores e deputados franceses aprovaram o texto com 780 votos e 72 contra, assegurando a maioria de três quintos necessária.
Com esta última etapa legislativa, o projeto de lei constitucional, relativo à liberdade de recurso ao aborto, alterou o artigo 34.º, que passará a incluir “a garantia da liberdade das mulheres de recorrer à interrupção voluntária da gravidez”.
Os deputados e senadores saudaram a votação histórica com uma ovação, enquanto no centro da capital francesa também se registaram celebrações de organizações de defesa dos direitos das mulheres e de apoiantes da alteração constitucional.
Em reação à aprovação, o Presidente francês escreveu na rede social X: “Orgulho francês, mensagem universal. Vamos celebrar juntos a entrada de uma nova liberdade garantida na Constituição”.
Macron anunciou uma grande cerimónia na próxima sexta-feira, coincidindo com o Dia Internacional dos Direitos da Mulher, em frente do Ministério da Justiça, onde pela primeira vez na história o público poderá assistir à promulgação de uma lei pelo Presidente da República.
Gritos de alegria foram ouvidos na praça Trocadero, em frente à Torre Eiffel, ao lado do monumento aos Direitos Humanos, onde centenas de defensores do direito ao aborto se reuniram em frente de um ecrã gigante que transmitia a sessão do Congresso.
“Meu corpo, minha escolha” foi inscrito no famoso monumento parisiense para marcar este passo histórico.
Em sinal contrário, um grupo de ativistas antiaborto reuniu-se perto do Palácio de Versalhes, onde se realizou o Congresso, sob o lema “Eu também fui um embrião”.
Numerosos líderes políticos tomaram a palavra para defender que, embora o aborto não seja questionado em França neste momento, com mais de oito em cada dez franceses a favor da sua inscrição na Constituição, poderá sê-lo no futuro, à semelhança do que aconteceu nos Estados Unidos, Hungria, Polónia ou Argentina.
Com a consagração deste direito na Constituição será mais difícil modificá-la, sendo exigida uma maioria de três quintos para alterá-la novamente.
A maioria dos deputados da extrema-direita votou a favor da reforma, mas os seus dirigentes deixaram uma nota discordante, considerando que se tratou de uma manobra do Presidente francês para esconder a sua fragilidade parlamentar.
“Vamos votar esta constitucionalização, porque não nos representa nenhum problema, mas a partir daí não podemos falar de um dia histórico. É um dia explorado por Emmanuel Macron para a sua própria glória”, disse a líder da extrema-direita, Marine Le Pen.
Outros parlamentares conservadores expressaram dúvidas se a reforma adotada poderia infringir a liberdade dos médicos de se oporem à realização de abortos com base na objeção de consciência.
Antecedendo a votação histórica, a Pontifícia Academia do Vaticano para a Vida defendeu hoje que “não pode ser um direito” acabar com uma vida humana.
“A Pontifícia Academia para a Vida reitera que precisamente na era dos direitos humanos universais não pode haver um ‘direito’ de suprimir a vida humana”, afirmou em comunicado.
A iniciativa já tinha sido aprovada no final de janeiro por uma maioria esmagadora na Assembleia Nacional e, na semana passada no Senado, apesar da relutância de alguns senadores de direita e do centro, que têm a maioria na câmara alta.