Crise Climática. Saber sem acreditar
Os avisos dos cientistas acerca das alterações climáticas crescem em gravidade, tendo culminado no mais recente relatório do IPCC, que comprova que as mudanças estão a surgir mais cedo do que inicialmente previsto. O alarme continua a soar, alto e forte, mas talvez por ser permanente se misture tão facilmente no fundo da nossa vida diária, onde é ignorado. Sabemos que existe pressa, mas como num pesadelo, quando tentamos correr sentimos os nossos pés firmemente colados ao solo.
O filósofo inglês Timothy Morton define as alterações climáticas como um “híper objeto” — isto é, um facto conceptual tão grande e complexo que não consegue ser completamente compreendido pelos nossos cérebros. O escritor americano Jonathan Safran Foer descreve este fenómeno de forma mais poética, criando uma distinção entre saber e acreditar. Salientando a ausência de discussões do nosso destino climático na literatura, Safran Foer refere que as alterações climáticas não figuram uma boa história, pois “the planetary crisis — abstract and eccletic as it is, slow as it is, and lacking in iconic moments — seems impossible to describe in a way that is both truthful and enthralling”. Isto é, nós sabemos racionalmente que as alterações climáticas são um problema urgente, mas as nossas emoções não acompanham essa urgência e, portanto, não despoletam ações.
O nosso cérebro sabe que a continuação do business as usual nos levará inevitavelmente a uma catástrofe climática, mas o nosso coração, incapaz de ver mais do que um passo à sua frente, não encontra motivação para se desviar do caminho em que se encontra. Isto é claramente um problema evolutivo, das nossas mentes humanas que se adaptaram a estar atentas a necessidades imediatas e que facilmente ignoram consequências a longo-prazo. No entanto, estando cientes desta limitação, é essencial arranjarmos forma de a contornar. Safran Foer, por exemplo, sugere que não devemos esperar por determinados sentimentos, pois se nos obrigarmos a atuar, os sentimentos seguirão as ações.
Honestamente, não tenho uma boa solução para esta barreira cognitiva. A nossa mente, adepta em dissociação, procurará sempre o caminho mais fácil para evitar emoções negativas. No caso das alterações climáticas, esse caminho é ignorar o problema, fechá-lo numa caixinha dentro de nós, onde sabemos que existe, mas está longe da nossa linha de visão. Não, não somos negacionistas, porque sabemos com os nossos cérebros que o problema existe. Sim, somos negacionistas, porque nos recusamos com os nossos corações a olhar para ele e para todas as suas implicações.
Não possuo nenhum método secreto de eletrocutar os nossos corações para que acordem para esta crise. Provavelmente não existe nenhum, simplesmente teremos de beliscar-nos diariamente para nos relembrar-nos da urgência da nossa situação. Contudo, o que sei com toda a certeza é que não nos podemos dar ao luxo de esperar pelas circunstâncias perfeitas antes de intervir.
Como última instância, a nossa mente recorrerá ao fatalismo para evitar qualquer atuação, convencer-nos-á que estamos condenados, já não há nada a fazer e, portanto, mais vale não pensarmos sequer no assunto. Nada poderia estar mais errado, pois se é verdade que pelo menos dois graus celsius de aumento de temperatura são provavelmente inevitáveis, também é verdade que um mundo dois graus mais quente é diferente de um mundo quatro graus mais quente, que é diferente de um mundo oito graus mais quente. Cada grau que evitamos significa casas que não são destruídas, cidades que não ficam submersas e vidas que não são perdidas.
Os nossos filhos e netos crescerão indubitavelmente num mundo diferente do nosso, mas quão diferente — melhor ou pior — está ainda nas nossas mãos. Eles não nos questionarão sobre o que sentimos ou pensámos, mas sim como e quando agimos.
Crónica de Maria do Carmo Candeias.
A Maria é licenciada em Biologia e estudante de Ciência Política e Relações Internacionais.