Eleições Legislativas. Uma última análise

por Bernardo Oliveira,    1 Fevereiro, 2022
Eleições Legislativas. Uma última análise
Parlamento Português / Fotografia de Carlos Pombo, 2009
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As eleições legislativas de 2022 vieram dar ao país resultados que, estou convencido, muito poucos previram. A vitória por maioria absoluta do PS foi algo que as sondagens estiveram longe de apontar e, por esse motivo, há razões de sobra para as pessoas passarem a desconfiar das previsões apresentadas por quem as realiza.

Há várias conclusões que se podem retirar destes resultados, mas vamos por partes. Primeiramente, importa destacar a vitória categórica de António Costa nestas eleições. Na minha opinião, a sua vitória era mais ou menos certa, mas longe de imaginar que a maioria absoluta fosse uma realidade. Devemos ficar felizes por isso? Se apoiarmos partidos políticos como apoiamos clubes de futebol, então devemos ficar extasiados com tamanho acontecimento. Se queremos ter uma visão mais ponderada, então devemos ter consciência de que ter poder absoluto é bastante perigoso, mesmo em democracia. Ter maioria absoluta é quase como um rei governar em monarquia absoluta, no sentido em que pode tomar as decisões que quer, uma vez que nunca terá quem lhe consiga fazer oposição. Numa altura em que Portugal vai receber o famoso PRR, ter um governo a dispor de avultadas quantias e manuseá-las sem ter quem possa fazer-lhe frente pode ter um mau desígnio. Não quer dizer que vá acontecer, e importa por isso dar o benefício da dúvida a António Costa. Teremos quatro anos para o analisar.

Se o PS teve uma vitória categórica, o contrário se pode dizer de Rui Rio. Parecia estar-se a aproximar do seu maior opositor e, na minha opinião, até tinha vencido o debate com António Costa. Portugal partiu com incerteza para o processo eleitoral, e o líder social-democrata pensou que seria esta a sua oportunidade. Perdeu-se, contudo, em contos que envolviam animais, quando a situação no país não parece estar para brincadeiras, e onde é com ideias claras e inequívocas que se conseguem ganhar eleitores. Não o vi apresentar ideias devidamente estruturadas para a Educação, para a Cultura ou para o papel de Portugal na União Europeia. No fim, enquanto o voto útil da esquerda se mobilizou, o da direita dispersou-se, e Rui Rio certamente não ficará no cargo mais quatro anos a ver a banda passar, ainda por cima agora que a banda passa menos, já que concordou em terminar com os debates quinzenais. Para quem não entendeu isto em português, o próprio traduz para alemão.

Se o PS conseguiu albergar os votos da esquerda, a CDU e o Bloco de Esquerda foram os principais derrotados, não conseguindo eleger deputados considerados importantes no Parlamento. Tais resultados deveriam fazer repensar as lideranças dos partidos. Se num deles a substituição prevê-se para os próximos meses, noutro a coisa não parece tão certa. Certo é que a extrema-direita passou, quando nos prometeram o contrário. Redefinir estratégias e impedir o crescimento de forças antidemocráticas tem de passar pelas cabeças dos líderes dos partidos de esquerda.

Quanto ao CDS, apesar de inúmeras críticas às ideias do partido, consideradas atrasadas no seu tempo, considero que é bastante prejudicial um dos partidos fundadores da democracia não conseguir sequer eleger um deputado no Parlamento. É certo que este sistema de círculos eleitorais foi prejudicial, porque se somarmos os votos, superaram-se, por exemplo, ao Livre. Contudo, são as regras do jogo, e o partido pode estar perto do fim. Espero, sinceramente, que não aconteça. 

Por fim, algumas ideias gerais que se podem destacar. O facto, por exemplo, de que uma coligação entre PSD e CDS permitiria que o PS não alcançasse a maioria absoluta. Por outro lado, a enorme subida da Iniciativa Liberal, que está a conseguir puxar os mais jovens, muito graças a boas estratégias de comunicação, que levam as gerações jovens a interessarem-se pelo partido em si, e que revela potencial para ainda maior crescimento. Em relação aos partidos que elegeram apenas um deputado, felicidades distintas: excelente vitória para o Livre, derrota pesada para o PAN. Por fim, a afirmação do Chega como terceira força política, e o segundo grande vencedor da noite. André Ventura vai subindo a pulso. Colocar umas pessoas contra as outras não é de agora, e a História demonstra-o. Tem resultado, e se é verdade que há pessoas que votam por descontentamento com a situação atual, também há quem goste de líderes autoritários. Como diz o Fado Bicha na música que vai levar ao Festival da Canção deste ano, há quem tenha “amor ao bastão”. Vá-se lá entender porquê.

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