Em 2020, os Whosputo lançam-se novamente para a excelência musical com um novo EP
Criativamente falando, 2020 tem sido um ano em cheio para os Whosputo, banda lisboeta que lançou o seu álbum de estreia há alguns meses e lança agora um novo EP. Claro que, do ponto de vista artístico, tem sido um ano desafiante para todos, principalmente aqueles que necessitam de concertos para mostrar o seu produto. Quando escrevemos sobre o álbum de estreia da banda em Maio, não esperávamos que após seis meses fôssemos brindados com novas músicas, mas os tempos mais difíceis obrigam-nos a passar mais tempo fechados e isso potencia outros factores.
Whosputo são uma das bandas portuguesas mais interessantes do momento. O quarteto explora diversos universos, desde o jazz ao rock, passando pela electrónica e até pela pop, tudo com uma enorme excelência, conduzidos pela belíssima voz do seu vocalista, Raimundo Carvalho. Este novo EP, gravado pelo próprio Raimundo e masterizado por Luís Lucena, um velho conhecido dentro do contexto underground português (Quartoquarto, Melquiades, Lydia’s Sleep, entre outros), intitula-se Buffer Sketches e foi lançado no passado dia 13 de Novembro.
Comecemos com “Weird Thing”, a primeira faixa do EP. É um sentimento quase nostálgico, o de regressarmos ao estilo bem próprio da banda. As influências estão lá, mas há qualquer coisa de muito próprio em Whosputo. Esta primeira faixa segue a mesma linha do que foi feito no álbum: um ambiente bastante próximo do jazz, mas com toques de electrónica e rock, estilos que combinam bastante bem e de forma natural. A voz de Raimundo é mais uma vez o elemento que colmata todos os outros instrumentos e cria uma harmonia perfeita para toda a complexidade que vai sendo construída em seu redor. Atenção: a originalidade e qualidade de Whosputo não se faz apenas com o seu vocalista; há um talento imenso em cada um dos músicos e isso pode ser escutado em todas as canções e em diversos momentos, como nos últimos 50 segundos desta “Weird Thing”.
Saltamos para “Eternity”, uma música mais calma que as demais, mas com a qualidade do costume, principalmente do ponto de vista técnico e instrumental. “Are You Just Like Me?” é o single de estreia, com um belíssimo videoclipe e participação de mais dois músicos talentosos — André Murraças (Tenor) e Zé Maria Carreira (Baritone). Clássico single “cantável”, esta terceira faixa é, provavelmente, uma das melhores músicas da banda e um excelente cartão de visita para quem não a conhece.
“Casedrop” é um exemplo do que o quarteto lisboeta consegue fazer num campo mais experimental. Embora a voz de Raimundo torne a música mais “fácil” de ser escutada, o instrumental pode afastar alguns ouvintes. Esta não é uma crítica negativa, pois estamos perante uma excelente música, principalmente a partir dos dois minutos, quando se começa a desenvolver mais, mas pode ser exigente para alguns ouvidos.
Há um sentimento familiar ao ouvirmos “Quarantine” — e não, esta não é uma piada relacionada com a situação mundial actual, mas sim uma referência objectivamente musical. Esta é possivelmente uma das características mais fortes da banda, a capacidade nos deixar confortáveis ao ouvir o seu som e fazer-nos sentir que já ouvimos alguns segmentos noutro lado, quando na verdade estamos a ouvi-los pela primeira vez. Tudo isto é fruto da capacidade da banda de criar sons com grande coerência e adequados a um grande número de pessoas, sem que toquem num lado meramente comercial.
Eis que, em pouco mais de 20 minutos, chegamos à última faixa do EP, “Cupid”. Parece que o tempo passou a correr e que estamos numa viagem que se interliga desde o primeiro segundo. Esta última faixa, tal como “Casedrop”, entra num universo mais experimental e electrónico, oferecendo-nos uma surpresa nos minutos finais.
Se é verdade que havia o risco de em tão pouco tempo a banda se repetir ou não criar algo propriamente interessante que acrescentasse ao álbum de estreia, o que se passa na realidade é que este EP é uma continuação perfeita desse álbum, com enorme qualidade e uma clara amostra que a criatividade da banda roça o infinito.
Whosputo são uma das bandas a seguir com atenção, não só pela qualidade das suas músicas, mas também pela criatividade. Há muito talento nesta banda, mas há também muita inteligência para saber criar um projecto assim. Os projectos musicais não vivem só da sua música, vivem de uma gestão exterior que faz com que consigam sobreviver no meio de tanto talento e tanta oferta. A gestão da banda, tanto a nível de redes sociais, como comunicação directa, design/ilustração e timing de lançamento, revela um cuidado extra e uma grande organização. Se não estivéssemos numa época em que muitos dos concertos estão restritos, festivais estão suspensos e apostas em novos projectos são adiadas, os Whosputo estariam possivelmente a tocar em todas as cidades do país, em todos os festivais mais importantes e num ponto de crescimento maior do que aquele que seria de esperar. Contudo, e mesmo com todas estas adversidades, a banda tem conseguido crescer e manter uma qualidade muito grande. Venha o que vier, pois o futuro da música passa por eles.