Entrevista. Ai Weiwei: “O Ocidente já não defende os direitos humanos, a dignidade humana, a liberdade de expressão, como pensa que defende”
O artista chinês Ai Weiwei argumentou hoje que o Ocidente “já não defende os direitos humanos” como quer fazer crer, exemplificando com as guerras na Ucrânia e no Médio Oriente, com os quais os países ocidentais lucram.
“O Ocidente já não defende os direitos humanos, a dignidade humana, a liberdade de expressão, como pensa que defende, ou assim o propagandeia, o que não é verdade. Eles [países ocidentais] são tímidos em relação aos direitos humanos” e no que toca a “defender as condições humanas”, opinou o mais famoso artista chinês.
Em entrevista à agência Lusa, no seu novo ateliê em construção na herdade no Alentejo onde passou a residir nos últimos anos, no concelho de Montemor-o-Novo (Évora), Ai Weiwei dá como exemplos desse seu olhar crítico em direção ao ocidente “as duas guerras que estão a acontecer”.
Uma “na Europa, entre a Rússia e a Ucrânia”, e também a que “está a acontecer no Médio Oriente”, que “têm um envolvimento do Ocidente, um forte envolvimento”, não só devido aos países que estão “a enviar armas”, mas que também têm “um grande lucro com a guerra”.
“E nem sequer querem parar a guerra”, frisou, considerando “óbvio” que, perante estes cenários, “o Ocidente não está em posição de ensinar às outras nações o que são os direitos humanos, porque apenas os utilizam como uma espécie de moeda de troca económica, o que é muito mau”.
Na visita realizada hoje à sua herdade no Alentejo por um grupo de jornalistas, a propósito da sua exposição intitulada “Paradigm”, que vai estar patente na Galeria São Roque, em Lisboa, a partir desta quarta-feira, o artista dissidente chinês também anteviu à Lusa que o confronto entre o Ocidente e a China vai prosseguir.
“Penso que, obviamente, vai haver um confronto contínuo entre os Estados Unidos e a China e o Ocidente e a China, mas penso que uma coisa é certa: a China vai continuar a desenvolver-se e não acho que o Ocidente o possa impedir”, afirmou.
Segundo Ai Weiwei, nascido em 1957, em Pequim, na China, “a economia livre é uma espécie de pilar fundamental do capitalismo ocidental”, mas o verdadeiro “problema” é, “quando no Ocidente não se consegue fazer frente à concorrência da China”.
Questionado pela Lusa sobre as últimas eleições legislativas em Portugal e o aumento do número de deputados de partidos à direita do espetro político, assim como sobre as eleições europeias que se avizinham, o artista disse não acompanhar a política nacional.
“Bem, não estou a estudar política portuguesa, porque estou a construir os meus edifícios, mas acho que, na construção dos edifícios, não se pode ser de direita ou de esquerda, tem de se construir no meio, senão [o edifício] desmorona-se”, respondeu, durante a entrevista realizada no edifício em construção, feito de paredes de tijoleira portuguesa e madeira europeia, pilares e telhado de madeira e chão de pedra que disse ser local. Uma construção que disse ser conceptual e que pretende deixar vazia.
Em 2021, também numa entrevista à Lusa, dessa vez no Porto, Ai Weiwei realçou que se deve “respeitar a vida, todas as vidas” e que “todas as vidas foram criadas iguais por algumas forças desconhecidas”.
Agora, em Montemor-o-Novo, o artista chinês voltou a lembrar que, tal como consta da Declaração Universal dos Direitos Humanos, “todos somos criados iguais e temos os mesmos direitos, idealmente”.
“Mas, na realidade, isso nunca aconteceu e talvez nunca venha a acontecer. É algo pelo qual temos de lutar”, defendeu.
E sobre se se continua a fazer ouvir a sua voz na defesa dos direitos humanos, mesmo estando numa região desertificada e não tão conhecida como é o Alentejo, o artista é taxativo: “Penso que, com a tecnologia atual e se a nossa voz tiver algum significado, pode ser ouvida, não interessa onde estejamos”.