Entrevista. André Barros: “Partilhando histórias minhas consigo universalizá-las apelando à empatia”
Foi com a banda sonora do filme “O Fabuloso Destino de Amélie”, de Yann Tiersen, que o seu gosto pela música começou. Sem bases teóricas ou formais sobre música, o seu lado autodidata falou mais alto e, já na fase final do curso de Direito, sentiu-se impelido a aprender a tocar piano. Se André Barros sentia-se ligado à estruturação lógica, a música, actualmente, dá-lhe o espaço emocional necessário para se sentir livre. Deixou de ser jurista e agarrou por completo a veia artística, muito pautada por bandas sonoras que o acompanharam durante o seu trajecto enquanto músico.
Em Outubro de 2021, lançou o seu último trabalho, “Vivid”, tanto em formato digital como em vinil. “Measures” foi o single de avanço, com gravações caseiras que revisitam a sua própria vida. Segundo as suas próprias palavras, “partilhando histórias minhas, consigo universalizá-las apelando à empatia e nostalgia de quem me escuta e se atrai pelo meu trabalho.” Falamos com André Barros sobre tudo isto, na entrevista que se segue.
Passaste do Direito para música, o Direito é a tua formação base. Como foi essa transição e como ganhaste as tuas bases musicais?
Vou tentar sintetizar pois poderíamos estar horas a fio a falar. Comecei a explorar o piano, tocando de forma autodidata já na fase final do meu curso de Direito — foi por volta dos 20 anos, tenho hoje 37. Aconteceu de forma algo inusitada porque nunca tive formação musical — nem a nível do instrumento, nem sequer a nível teórico — mas já há muito que me sentia inebriado sobretudo por música instrumental, em grande parte por música composta para filme.
Era, assim, evidente a minha paixão pela música mas andava nessa altura do meu curso fascinado, em particular, pela banda sonora do filme “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”, do músico Yann Tiersen. Vibrava imenso com aqueles temas muito melódicos, de pendor nostálgico e algo melancólico e, em particular, com o instrumento piano. Um amiga próxima, a Margarida Rovira, tinha um belíssimo piano acústico em casa, na altura em que estudávamos em Lisboa, antigo e que soava muito bem, som doce e bem característico. Durante a minha licenciatura encontrávamo-nos imensas vezes em casa dela e eu, numa dada ocasião, tentei tocar um dos temas da banda sonora, até porque andava até ali a reproduzir repetidamente os movimentos padronizados desse tema em particular, que observara em intérpretes que pululavam pela internet na altura dado o sucesso do filme.
Estarreci, ali, completamente enamorado pelo instrumento — tocava, obviamente, ainda de uma forma muito rudimentar — mas fui voltando e paulatinamente desenvolvendo uma paixão enorme que se tornou o combustível para prosseguir com a prática. Durante os anos seguintes — dois, três anos até terminar o curso — comprei um piano digital e, ainda nos meus tempos livres, andava sempre a tentar compor algo, ou interpretando peças mais simples de bandas sonoras, assim sempre numa aprendizagem autodidata, progredindo lentamente.
Fui aprimorando, sempre numa aprendizagem intuitiva, quer o aspeto técnico quer o de composição e em algumas peças comecei a querer juntar cordas — violino, viola e violoncelo — e comecei, assim, a criar aquelas que seriam as minhas primeiras composições. Depois de terminar o curso de Direito, trabalhei ainda como jurista, na Caixa Geral de Depósitos em Lisboa, na sede desse banco, durante um período de sensivelmente meio ano. No entanto, decidi, de forma algo arriscada, sair desse trabalho ao fim desse curto período porque sentia que já estava numa fase em que já tinha algumas composições, e estando eu algo obcecado com a música, tinha vontade de perceber qual o alcance daquela minha faceta criativa.
Decidi tirar um curso de “Produção e Criação Musical”, na belíssima ETIC (Escola Técnica de Imagem e Comunicação), para que pudesse auto-produzir os meus temas e, portanto, dar-lhes uma nova forma, um registo, o que me permitia partilhar com quem queria que escutasse. Aprender a gravar, os primeiros passos no processo de mistura e masterização, fez com que a minha paixão com a música crescesse e foi, mais ou menos ali, que senti que, de facto, me estava a afastar do mundo do Direito, pese embora ainda hoje o use para vários aspetos (sobretudo negociais e contratuais) do meu percurso enquanto compositor. Tudo isto sem saber bem o que viria a seguir.
Interessante que tenha sido, justamente, por causa de uma filme, que o teu gosto mais profundo por música tenha começado.
Exactamente, exactamente. É interessante porque, diria 80 % do meu trabalho nos dias de hoje, é precisamente compor bandas sonoras, quer para filmes quer para outros projetos audiovisuais, quer ainda para teatro ou peças de dança. Os outros 20% passam por me apresentar ao vivo com o meu projecto a solo ou em outras formações, como o projecto Melodium que partilho com a Joana Inês Santos ou o projecto de piano a 4 mãos com o pianista e compositor Tiago Ferreira. Mas o que predomina é a composição para projectos audiovisuais.
Mas o que é que te agrada numa banda sonora em si, e porque é que isso te cativou? O que te fez mergulhar nesta arte vindo de uma área tão distinta como o Direito?
Acho que há diferentes respostas por onde poderia pegar, mas um ponto interessante e que senti aquando da minha incursão repentina na música, em primeiro lugar, prende-se com a circunstância de ter sido sempre alguém que estudava e lia imenso (sobretudo livros técnicos específicos do curso), era uma pessoa muito racional e disciplinada. Antes do Direito, estive até na Academia da Força Aérea e cheguei a lá estar quase um ano. Fui, sempre, uma pessoa ligada à matemática, ao raciocínio, ao lógico e, nessa altura, o que eu senti com a música foi que conseguia estar num plano completamente diferente, no plano da ausência da razão, no plano do inesperado, da aprendizagem por instinto também, e isso agradou-me imenso.
Se aliarmos esse facto à melodia, à sua magia e à importância dos sentimentos, das emoções incomunicáveis senão pela arte — o facto de nos expressarmos através da música e do que conseguimos sentir através dela — fez ali um cocktail muitíssimo interessante para mim e sobretudo para o que desejava transmitir a quem me escutasse. Claro que, depois, tornar isto uma profissão para poder viver da música, estamos aqui obviamente a falar de um processo que levou alguns anos e que está em constante mutação, até.
Mas, pensando no que concretamente possa ter induzido esta transição do Direito para a música, acho que tem que ver precisamente com isso, com o facto de me sentir apaixonado pelo quão livre posso ser a compor e, em especial, desta forma tão empírica, natural e desprendida, sem necessidade de um processo de raciocínio, como que um Alberto Caeiro! Acrescento que acho que cada um de nós, todos nós, temos jeito para algo dentro do mundo das artes — seja para a escrita, para as artes plásticas, para o desporto ou para a pintura, etc. Assim, num cenário ideal e se as condições o permitissem, deveríamos conseguir viver/usufruir, sustentar a nossa existência dentro da arte.
Acho que tive a sorte e, também, algum engenho — sou de facto, muito empreendedor — para estar, hoje, a viver da arte e neste caso em particular, da música e poder, com ela, veicular e potenciar os sentidos de quem assiste a um filme.
Além do piano, também acabas, no processo de composição, por fazer arranjos ou, de alguma forma, tentar ali organizar outros instrumentos que entrem na composição. Acabas por ser um orquestrador, digamos assim.
Exactamente, ou seja, é evidente que não me atrai somente o som produzido pelo piano. Sempre gostei de música instrumental, sobretudo, música para bandas sonoras e, na sua maioria, ela é povoada por esta instrumentação de cariz até mais clássico — o piano, as cordas e, num contexto mais alargado de uma orquestra , a família dos metais, das madeiras e da percussão.
Ao sentir-me inicialmente atraído por isso, penso que foi natural o começar no piano, que é um instrumento um pouco mais fácil e imediato de se tirar um “bom som” logo de início — pelo menos, de forma autodidata; sempre se torna mais fácil do que um violino por exemplo, que é bem mais complexo no sentido do início da aprendizagem — depois, a partir daí, é que fui paulatinamente juntando outras cores, ou seja, outros instrumentos, diferentes timbres, dando uma nova dimensão à música que até ali ia criando; explorando posteriormente sons eletrónicos, produzidos por sintetizadores, e a sua mistura com sons acústicos, navegando nesta constante “modernização” sónica tão fascinante e, por vezes, na própria manipulação do som real de cada instrumento e até na inclusão de sons concretos.
Penso que tudo isto parte também desta premissa: não sou um pianista virtuoso, precisamente pela minha ausência de formação tradicional, ou seja, as minhas peças não primam pela virtuosidade da execução, sobretudo ao piano (instrumento interpretado por mim). Sinto que estou algo focado com a preocupação constante em veicular a intensidade das emoções, embora no sentido estrito destas surgirem por procurar proporcionar ao ouvinte a possibilidade de abstracção do que está a ouvir, quase como se fosse hipnotizado pela forma algo circular e minimal como construo os temas (regra geral, claro está). Daí gostar tanto da corrente do minimalismo — do Steve Reich, Philip Glass, Arvo Part, entre outros.
Comecei, pouco a pouco, a trazer para as gravações instrumentos de uma dita formação de música de câmara — ou seja, poucos instrumentos, é um ensemble com poucos músicos — e comecei a juntar primeiro um violino, depois um violoncelo e, de seguida, um trio, um quarteto, e fui assim explorando diferentes configurações que me trouxessem também diferentes resultados.
Faço os arranjos ao piano para os instrumentos que não este, exporto as partituras recorrendo ao software DAW que esteja a usar, e de seguida, conto com a comunicação verbal facilitada e com a excelência e generosidade dos músicos que me acompanham para “dar vida” às criações que vão surgindo, em que partilho a minha intenção, as dinâmicas, a energia que quero transmitir. É um processo que fui aprimorando, naturalmente, e é fabuloso poder trabalhar com músicos tão fascinantes.
O vídeo do single de avanço do álbum, o “Measures”, é feito com gravações caseiras, da tua infância. Além da nostalgia, o que pretendias explorar aí? O conceito de memória na música?
Sim, completamente. Este single chama-se “Measures”, em português, medidas. Há aqui, desde logo, uma coisa que eu penso que será óbvia para as pessoas, é sempre dispendioso fazer um videoclipe, não é? Pode ser ou não ser tanto assim, embora à partida contamos com que seja um processo que implica alguns custos significativos, não obstante a complexidade do que se pensa fazer. Pensei logo nisto — na possibilidade de recorrer a filmagens que já fossem minhas — como uma forma de conseguir reduzir os custos a nível da produção e, obviamente, ao usar imagens de super 8 e tratar só o aspecto da edição, faz com que o trabalho fique bem menos dispendioso.
Mas, também — e sendo esta claramente a razão fundamental —, explorar esse lado mais cru, mais singelo e frágil, mais real daquilo que é um registo da minha infância. Tudo aquilo ganhou uma outra dimensão de importância porque, quando começo a reviver essas imagens — com a ajuda do meu irmão que tem uma produtora de filmes na Marinha Grande ( a Lua Fimes) e que me fez a edição —, começo a perceber que elas conseguem efectivamente contar uma história, apesar da distância temporal a que foram filmadas e a consequente ausência de guião — agradou-me imenso. Basicamente, o conceito para este vídeo é o seguinte: a música reporta ao conceito de “Medidas” e, ao que eu quero aludir, metaforicamente, é que há diferentes medidas de vermos e interagirmos com as emoções.
Pode haver a medida do tempo: que é pensar nestas imagens e pensar no passado e no quão feliz foi, e pensar que, se calhar, hoje, já não posso viver aquilo da mesma forma porque foi um momento que ficou ali como que preso no tempo, restando a memória; e há o plano da medida meramente da emoção, ou seja, pensar que não obstante aquilo ter acontecido há muito tempo, eu posso olhar para a intensidade emocional vivida e tentar transmutar aquilo para o tempo que vivemos hoje. Vivê-lo, talvez, não com as mesmas pessoas, ou com algumas delas — porque, por exemplo, tenho imagens das minhas avós que já nos deixaram, assim como o meu avô — mas posso reviver aquilo, emocionalmente, nos dias de hoje, com novas pessoas ou em novos contextos.
É, portanto, uma medida diferente de ver aquela riqueza de emoções, com novos contextos, é uma medida nova, renovada, de ver as coisas e que supera a possível tristeza do “passado já não voltar”. Ao invés de estarmos limitados à medida do tempo, é olharmos para o passado somente com o olhar das emoções — o passado torna-se o presente. É jogar um pouco com este conceito — foi essa a ideia.
Dirias, então, que há aí nostalgia, mesmo?
Sim, sem dúvida. É, aliás, um traço muito presente na minha música. Se considerarmos que o meu interesse por tocar piano começou com a tal banda sonora de Yann Tiersen, todos reconhecemos, certamente, uma enorme sensação de nostalgia (na aceção mais positiva da palavra) naquele filme e banda sonora.
É, claramente, um traço vincado das minhas produções, da minha música em geral, e é algo que move a minha intuição musical. Há, também, uma coisa curiosa nesse videoclipe: eu penso que as pessoas podem estar a ver estas imagens e, obviamente, não me conhecendo e não conhecendo a minha família, não estão a viver aquilo da forma intensa pelas minhas relações familiares, mas, sim, porque se vem e reveem a elas próprias naqueles conceitos de família, férias, festas e períodos de escola. Partilhando histórias minhas, consigo “universalizá-las” apelando à empatia e nostalgia de quem me escuta e se atrai pelo meu trabalho.
Devolves o convite para quem ouve.
Sem dúvida. O que quero muito é que as pessoas, ao escutarem a minha música, sintam, mas que sintam de uma forma bem intensa e no sentido de reviverem, de viverem — de terem emoções, experiências — e que possam, a cada passo que escutam a minha música, povoar diferentes cenários, diferentes contextos. Quero que seja abrangente a esse ponto, penso que aí poderá residir a real “virtuosidade” na minha música. Claro que isso acaba por acontecer com todas as músicas, não é?
Mas quero acreditar que por ser instrumental, e por ter muitos espaços e silêncios, por induzir o tal “hipnotismo” em virtude da construção que lhe dou, eu sinto que as pessoas poderão ter muito espaço para se imiscuírem nas próprias composições e, também, poderem criar as suas próprias linhas melódicas dentro dos meus temas, poderem ter uma voz forte e ser assim uma relação bem simbiótica. Não quero nem dou toda a informação, não quero que escutem apenas e analisem algo, quero somente que encontrem espaço para entrar na música e se sintam num “embalo”.
Por isso é que é curioso dizeres que a tua relação com a música começou pelo cinema. As bandas sonoras não têm letra, geralmente, e é mais fácil para as pessoas reverem-se naquele tema.
É normal que, em temas instrumentais que não tenham uma letra, logo aí haja uma ausência deliberada de orientação por via da palavra. Quando há uma letra, acabamos por ser orientados para um determinado caminho, há uma contextualização, uma poesia, uma narrativa mais tangível, no plano das emoções e no plano das ideias. Pode nem sempre ser assim, normalmente, é o que acontece. Então, o facto de ser instrumental, permite desde logo isso, viajar mais e mais livremente. Penso que isso acaba por ser uma coisa comum a este género de música e, por isso, como disseste, funciona tão bem com imagem porque dá — e pretende dar — espaço a que possamos perceber a narrativa, a história, as personagens.
E no “Vivid”, o novo álbum, tens quatro bandas sonoras que recuperaste e uma delas, inclusive, ganhou o prémio do “Independent Music Awards”.
Este disco compreende dez temas, quatro foram originalmente compostos para bandas sonoras, como disseste. São temas que escolhi, porque pensei serem os temas mais fortes de cada uma das bandas sonoras — são quatro trabalhos diferentes — e a razão pela qual fiz isso e não povoei “Vivid” apenas com temas compostos propositadamente para o disco, foi porque achei que encaixavam muito bem pensando no contexto global do álbum, mas também porque, como disse há pouco, grande parte do meu trabalho é para bandas sonoras e tenho imenso trabalho produzido nessa área — trabalho gravado, peças longas e não apenas pequenos trechos para sequências dos filmes, e portanto, faria todo o sentido tentar editá-las.
Depois, uma delas, Leda, como disseste, foi gravada com um trio de cordas da orquestra sinfónica da Islândia e com a presença do realizador e do produtor, que são norte-americanos. Foi o tema da banda sonora composta para o filme surrealista com o mesmo nome, Leda, que é baseado num mito, a “Leda e o cisne”, no fundo, é uma obra ficcionada, com uma visão “enriquecida” pela genialidade do argumentista. É a preto e branco, sem diálogos, que vive muito da banda sonora. Em Nova Iorque, em 2019, nos Independent Music Awards, com alguma sorte (acredito!) consegui ganhar esse prémio, foi importante para mim, e foi numa altura em que o filme já estava terminado, foi submetido mas ainda não tinha estreado oficialmente. Ganhar esse prémio, portanto, antes do filme sequer ter saído, foi muito motivador para toda a equipa, também.
Uma das características que tens, penso que se prende com o espaço que dás às notas, apresentas notas mais longas. Faz sentido para ti? Ajuda nesse sentimento de nostalgia?
Uma das minhas grandes influências é o compositor belga Wim Mertens, é um compositor incrível já com alguma idade, com mais de 80 discos editados, penso, para quem já tive a honra de fazer as primeiras partes dos seus concertos em Portugal. Ele começou, também, na onda do minimalismo, mas hoje em dia tem coisas muito virtuosas — tem música de câmara bem vibrante, com imenso movimento, agitação, geralmente com piano, cordas, sopros — mas noto que tenho, nomeadamente, alguns temas que entraram no álbum de 2016, o “In Between”, que têm muito esse cunho, ou seja, são coisas mais virtuosas, mais rápidas, e que ainda assim não deixam de ter, também, esse pendor nostálgico.
O que eu sinto é que na maior parte do meu trabalho tenho, de facto, essa característica da repetição e leveza do minimalismo, tenho de facto essas notas mais longas, ritmos mais lentos. Penso que essa lentidão, na música, ajuda, por vezes, a que seja mais fácil ter este efeito quase hipnótico — uma coisa não impede a outra, naturalmente! — mas penso que é mais fácil isso acontecer em andamentos mais lentos, com mais e evidentes momentos de silêncio, de respiração. Há, ali, um estado quase hipnótico e de embalo, e isso torna mais fácil ao ouvinte no poder entrar nas suas próprias memórias — o tal efeito que eu quero.
Uma das coisas que vinha no press do álbum, era a indicação de que era mais cru face aos álbuns anteriores. Concordas com esta asserção?
Está na mesma onda dos meus álbuns anteriores, este é o meu quinto álbum, mas penso que vem muito na sequência de estilo e sonoridade dos meus álbuns anteriores e não é por aí que vai destoar, certamente. A trazer algo de diferente, ou algum melhoramento, penso que passa mais pela maturidade da composição porque, entretanto, já tive oportunidade de compor para projectos novos, desafiantes a vários níveis, peças de teatro, peças de dança e, portanto, a maturidade, claramente, vai aumentando até também na gravação, na qualidade da gravação, mistura e daquilo que pretendo fazer.
A relação com os músicos também vai aumentando, vai-se solidificando cada vez mais — eles vão-me conhecendo cada vez melhor — ; na parte da mistura, neste álbum, introduziram-se ainda mais elementos como os sintetizadores e a percussão, como acontece, por exemplo, nos temas “Measures” e em “Vivid”. Essa parte também é algo que me atrai imenso, como já havia referido, fundir a electrónica com o mundo do acústico, e penso que isso vai melhorando e tem melhorado ao longo dos tempos, naturalmente, por experiência empírica — é natural que eu sinta que isso vai melhorando. O ser um álbum mais “cru” relativamente aos meus anteriores, liga-se com a intensidade particular e bem vincada das emoções retratadas, quer as sugeridas pelos filmes que motivaram os temas de bandas sonoras, quer os temas compostos propositadamente.
Qual é a tua relação com o post-rock?
Engraçado, foi uma conversa que acabámos por não desenvolver muito, mas eu tenho uma relação de facto muito intensa com a Islândia — e também com os Sigur Rós —, já lá estive imensas vezes a gravar bandas sonoras ou projectos próprios. Desde 2012, em que estagiei no estúdio deles durante o Verão onde fui assistente de técnico de som, tenho ido praticamente todos os anos, incluindo para a colaboração especial que tive com a cantautora Myrra Rós, quer em 2016 quer em 2017. Com essa colaboração, e até pela presença de “Rós” no nome da cantora, soube logo que era previsível as pessoas lembrarem-se dos Sigur Rós ao lerem sobre o meu percurso, são uma banda ímpar no mundo do post-rock.
Conheces Mono?
Sim, então não conheço?
Eles agora estão mais épicos, mas muito do que fazes lembram essa linha.
Até mesmo os leirienses First Breath After Coma, não é? Com quem já colaborei também. Gosto imenso do trabalho deles, são verdadeiramente geniais. Aliás, neste disco, o tema “Vivid”, que tem o mesmo nome do álbum, tem a participação do Pedro Marques que é baterista dos First Breath After Coma. A peça “Measures” também tem a colaboração dele, é de facto um baterista extremamente intuitivo, engenhoso e criativo, para além de ser um amigo fabuloso.