Entrevista. Branko: “Além de cidade, Lisboa é também um epicentro de criação de cultura dos vários países de expressão portuguesa”
O DJ e produtor Branko edita hoje um novo álbum, “SOMA”, para o qual convidou músicos que marcam o “som de Lisboa”, criado localmente, mas pensado para o mundo, e que irá apresentar entre hoje e domingo num espaço em Alfama.
O quarto álbum de Branko (João Barbosa) é, segundo o próprio, “a soma de todas as pessoas envolvidas e de todas as energias e coisas que tem”.
Com tantas pessoas “a partilharem e a contribuírem para a mesma equação”, o título só podia ser “SOMA”.
“O disco começou de uma forma muito coletiva, quase como se fosse uma ‘jam session’, uma sessão improvisada, em que eu levei alguns ‘beats’ e convidei alguns dos músicos que acho os músicos mais importantes de Lisboa, pessoas que sem dúvida marcaram aquilo que se chama, ou que se pode considerar minimamente, o som de Lisboa”, contou em entrevista à Lusa.
A Lisboa de que fala Branko, além de uma cidade, “é também um epicentro de criação de Cultura dos vários países de expressão portuguesa.”
“A nível musical, para mim, se calhar é o valor cultural mais importante que temos e aquilo que deveria mais ser preservado e trabalhado”, partilhou.
Os ‘encontros’, nos quais “nasceu a base das músicas” que compõem o álbum “SOMA” e em que participaram músicos como João Gomes, Ivo Costa, Francisco Rebelo ou Djodje Almeida, aconteceram em fevereiro do ano passado, ao longo de três dias, nos estúdios Namouche, em Lisboa.
“Estivemos em estúdio, gravámos coisas, apanhámos um bocadinho aquele improviso, aquele impulso das pessoas que estão a tocar sem pensar. Não havia uma missão, ninguém recebeu os ‘beats’ antes, foi tudo 100% ali”, recordou Branko.
Na fase seguinte, o artista dedicou-se à seleção e ao ‘corta e cola’ do material que tinha ficado gravado.
“Depois, cheguei a uma quarta fase, em que agarrei nessas bases e fui começar conversas com alguns vocalistas. Em contraste com o meu disco anterior, que foi feito durante a pandemia e eu estava um bocado mais sozinho, aqui foi mesmo uma construção muito social”, referiu.
Como Branko ao longo da carreira sempre pensou “na criação local, mas para os ouvidos globais, para o mundo todo e para tocar pelo mundo todo”, neste álbum tentou “ir propositadamente atrás de pessoas que estão a construir as suas carreiras noutros mercados, “como Carla Prata que, apesar de ter origem angolana e ter vivido uma série de tempo em Portugal, está a desenvolver a sua carreira no Reino Unido”, ou June Freedom que, “tendo origem cabo-verdiana, está a desenvolver a carreira nos Estados Unidos”.
“Achei interessante ir atrás dessas conexões e de pessoas que, entendendo o local, tal como eu, também estão presentes no global”, disse.
Entre as vozes de “SOMA” estão também Teresa Salgueiro, “uma pessoa que a cantar o lado mais tradicional da música portuguesa está presente no mundo inteiro”, Carlão, Dino D’Santiago, Gafacci, Jay Prince e Bryte.
As pessoas envolvidas na criação de “SOMA” foram tantas, que na ficha técnica de um dos temas, “Mood 111”, Branko bateu “o recorde de composições”. “São 12 pessoas nos créditos de autoria da música”, contou.
O álbum fica hoje disponível nas plataformas de ‘streaming’, mas Branko quis “transportar o disco e o processo criativo para um espaço” que o público pudesse visitar.
“A ideia veio talvez pelo aborrecimento que é lançar um disco na era digital da música. Sai o disco e fico a olhar para o Spotify à espera que aconteça alguma coisa de incrível, a ver números, que é o que deveríamos estar menos à procura nos dias de lançamento e focar mais nas pessoas”, justificou.
Assim, entre hoje e domingo, o Antù Alfama, no Largo de São Miguel, será a SOMA House.
No espaço, que tem três andares, haverá “uma loja com ‘merch’ exclusivo, onde as pessoas podem comprar o vinil”, uma exposição de fotografia, DJ sets e ‘talks’ (debates, em português) focadas no processo criativo.
“Entre as 17:00 e as 20:00 há programação e coisas a acontecer, nos três dias, mas as pessoas podem visitar a qualquer hora: há a loja, a exposição de fotografia e gastronomia. O menu do Antù vai ter umas coisas inspiradas no álbum e nas influências do álbum”, referiu Branko.
A apresentação ‘convencional’ de SOMA está marcada para 24 de março no Pavilhão Carlos Lopes, em Lisboa, no âmbito do festival Sónar Lisboa.
“Depois de dez anos a apresentar-me mais focado no ‘DJing’, com este disco fazia sentido, com todas as participações musicais que tem, avançar para um formato mais de banda, então convidei o Danilo Lopes, dos Fogo Fogo, que estará na guitarra, e a Ola Mekelburg, nas teclas”, revelou Branko.
Esta “reinvenção ao vivo” dá início a um novo ciclo na carreira de Branko, que já há algum tempo tem vindo a construir a ideia “de que a música eletrónica não pertence só aos clubes”, mas também cabe em teatros e auditórios, onde se assiste aos concertos sentado.