Entrevista. Kings of Convenience: “Há uma altura em que temos de escolher entre paz e amor”

por Linda Formiga,    18 Junho, 2021
Entrevista. Kings of Convenience: “Há uma altura em que temos de escolher entre paz e amor”
Kings of Convenience / Fotografia de Salvo Alibrio
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Em Rocky Trail, o single de avanço do álbum Peace or Love dos Kings of Convenience, ouve-se “Let’s start from what we left unsaid”. Muitas coisas aconteceram desde Declaration of Dependence, o último longa-duração da banda norueguesa, datado de 2009. Entretanto, Erlend Øye mudou-se para a Sicília, onde trabalha com a banda que o acompanha nas suas incursões a solo, pôs um ponto final nos The Whitest Boy Alive e colaborou com dezenas de músicos nos dois festivais do colectivo PEOPLE em Berlim. Enquanto isso, Eirik Glambek Bøe, a outra metade dos Kings of Convenience, manteve-se na Noruega, menos publicamente activo do que o seu colega de banda, com aparecimentos esporádicos com a sua banda Kommode.

Encontrámos os Kings of Convenience no apartamento de Eirik em Oslo, através da já banal aplicação ZOOM, para falarmos com Erlend enquanto Eirik fazia o pão para o pequeno-almoço.

As perguntas sobre o paradeiro dos Kings of Convenience, sobre as voltas e reviravoltas que desembocaram no novo álbum Peace or Love, que sairá a 18 de Junho, seguem-se abaixo.

Como tens estado nestes últimos meses?
Quando a pandemia começou, eu estava no México com amigos. Tinha a minha pequena família corona. A pandemia proporcionou muitas oportunidades e fez com que o mundo ficasse diferente devido às restrições e silêncio nas ruas, mas a partir de Novembro, na Europa, estávamos só à espera do que podíamos ou não fazer e, para mim, foi muito difícil lidar com isso.

Se a pandemia fez com que o mundo se tornasse diferente num ano, mais o mundo mudou nos dez anos que decorreram desde o lançamento do último disco, “Declaration of Dependence”. Como é que vocês, como banda, têm estado?
Depois de o álbum sair, andámos bastante na estrada até 2013 ou 2014. Começámos a sentir que precisávamos de material novo antes de continuarmos a fazer digressões. Começámos a trabalhar neste álbum no final de 2015, começámos a gravar em 2016, mas como eu e o Eirik vivemos em países diferentes, tínhamos de planear tudo e demorou muito tempo. Em 2018, senti-me pessoalmente muito cansado do material e não sabia o que era bom e o que era mau. Depois a nossa amiga Leslie Feist veio à Europa e quis fazer algo connosco e isso ajudou-nos a continuar. Gravámos duas canções com ela e voltámos a ouvir o que tínhamos gravado e descobrimos que havia muitas coisas muito bonitas.

Kings of Convenience - PR
Kings of Convenience / Fotografia de Salvo Alibrio

A Feist também participou no vosso segundo álbum. É uma pessoa a quem recorrem ou uma boa amiga que por acaso vos ajuda a chegarem lá?
Quando trabalhámos com ela pela primeira vez, em 2003, foi antes de ela se tornar muito conhecida. Depois disso, ela estava quase sempre ocupada, mas sempre que podíamos juntávamo-nos e fizemos alguns concertos juntos. Neste jogo, ela é alguém que faz algo semelhante ao que nós fazemos, e por isso é uma pessoa muito importante.

Em 2018, tocaram com a Feist no festival PEOPLE em Berlim [vídeo]. Foi aí o desbloqueio?
Foi o princípio. Lembro-me da sensação de ainda não estar totalmente preparado para mexer nos Kings of Convenience, mas foi aí que as sementes foram plantadas. Mas foi no Verão de 2019 que a Leslie nos fez dedicar tempo ao álbum.

Ao longo desta década, com as vossas vivências individuais e colectivas, a vossa própria percepção sobre a música mudou?
Sinto que, e a julgar da reacção ao nosso primeiro single e também com os concertos que temos dado na Noruega — com distanciamento social — ao mantermo-nos muito próximos do que temos feito desde sempre, temos um grande impacto. Porque parece que a maioria das pessoas fica feliz por algo se manter mais ou menos igual. A resposta a isso é mesmo muito positiva. 

Agora ou está relacionado com a pandemia?
Não, diria que isso acontece desde há uns 5 anos. Não sei o que a pandemia fez à música. A pandemia não fez muito à música porque há muito tempo que achamos que vai acabar em breve. Se soubéssemos desde o início que a pandemia iria durar 15 meses e que teríamos de ficar em casa, teria tido uma influência bastante maior no contexto musical. Mas temos estado à espera que o “acabar em breve” termine.

Houve um boom nas plataformas de streaming nos últimos anos. A vossa música pode agora chegar a muitos sítios sem que tenha de existir uma loja de discos aí. Isso também mudou a vossa forma de fazer música ou é irrelevante?
De um modo geral, somos bastante a favor do streaming. Nunca fomos grandes coleccionadores de música. Mas não gostamos da forma como o foco sobre o álbum mudou. Por exemplo, o Spotify tenta que nós [os utilizadores] não consideremos a música como um álbum, mas sim como canções individuais como parte das playlists que fazem. E disso eu não gosto. Porque nós trabalhamos muito nos álbuns. Os nossos álbuns podem ser ouvidos num café, por exemplo. Há muitas pessoas que põem Kings of Convenience a tocar num café porque sabem que mantêm no mesmo tom ao longo do álbum.

Uma espécie de playlist com a curadoria dos Kings of Convenience?
Sim, os nossos álbuns têm uma grande curadoria. Há muitos álbuns que são organizados de uma forma muito aleatória, e nesses acho que o Spotify é muito bom, porque há mais probabilidades de as pessoas gostarem de pelo menos uma música.

O vosso próximo álbum, Peace or Love, sairá em Junho. Se o tiverem de definir, como o definiriam?
É como um grande apartamento open-space, mas depois percebemos que a estante dos livros é uma porta.

Esta nova era dos Kings of Convenience é de Paz ou Amor ou ambicionam ambos?
Bom, nós todos ambicionamos ambos, mas chegamos a uma determinada altura das nossas vidas em que, subitamente, temos de escolher. E eu não posso dizer qual é a opção certa. “Peace or Love” é um pouco como ter uma mãe e um pai que nos dizem coisas diferentes e têm opiniões diferentes sobre o que é importante na vida. Depois crescemos e temos de saber, por nós próprios, que voz devemos ouvir em momentos diferentes.
Não é propriamente um conselho, mas há uma altura em que temos de escolher entre paz e amor e ambos são muito importantes. E há algumas pessoas que escolhem paz e outras que escolhem amor. Não há uma escolha certa.

A banda actua em Portugal a 16 de Maio de 2022 no Coliseu do Porto, a 18 (já esgotado) e 19 de Maio no Coliseu de Lisboa.

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