Entrevista com Mathias Modica, líder da Toy Tonics. O impacto da editora na noite de Berlim e a descoberta de novos artistas

por Francisco Espregueira,    17 Abril, 2021
Entrevista com Mathias Modica, líder da Toy Tonics. O impacto da editora na noite de Berlim e a descoberta de novos artistas
Mathias Modica, fotografia de David Bornscheuer
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A Toy Tonics é neste momento uma das principais editoras europeias nas ondas da música house com muita influência da soul e do jazz. Baseada na Meca do techno que é Berlim, a editora encabeçada por Mathias Modica (também conhecido por Kapote ou Munk) tem liderado uma mudança de paradigma na capital alemã, com a curadoria de festas que têm sido apelidadas de ‘lendárias’.

Dos tempos à frente da Gomma Records até às recentes incursões pelo mundo desconhecido do jazz germânico, através da Kryptox Records, Mathias tem-se tornado numa espécie de ‘Midas’, lançando vários artistas através da Toy Tonics que têm conquistado as pistas de dança um pouco por toda a Europa. A pandemia levou ao cancelamento de gigs em Milão, Londres, Paris, Munique e, claro está, Berlim, não impedindo, no entanto, a editora de lançar alguns dos melhores discos de música de dança de 2020. Virando a página para 2021, esta é a entrevista exclusiva da Comunidade Cultura e Arte e d’O Sótão com Mathias, que olha com humildade para o percurso da Toy Tonics.

A Toy Tonics foi criada em 2012 com uma clara intenção de editar música house de influência jazz. Mas a tua carreira como produtor e líder de editoras começou muito antes com a Gomma Records — mais focada em indie disco e eletrónica não convencional. O que te fez diversificar o teu output e apostar no projecto Toy Tonics?
A ideia para a Gomma Records era muito flexível. Fazíamos música, exposições, artigos de revista… mas depois de 10 anos começou a ficar um pouco ultrapassada. Portanto foi uma lufada de ar fresco começar um novo projecto. Aí criamos a Toy Tonics: muito focada numa só coisa no início, que era editar música disco underground cheia de funk. Sempre com o mesmo selo. Só para DJ’s. Nos últimos dois anos abrimos o nosso espectro e começamos mesmo a incluir vocalistas, a fazer álbuns e a expandir a marca com peças de roupa exclusivas e a nossa própria revista. É um sentimento diferente do que tínhamos na Gomma Records. Melhor. Mais fresco.

Também estás à frente da Kryptox, uma editora que introduz jazz futurístico de novos projectos baseados na Alemanha. Podes-me contar como a editora começou em 2017 e como é liderar três editoras com um registo sonoro tão diferente entre si?
Em primeiro lugar, sou um nerd por música. Todos os géneros são interessantes para mim. Vi que à minha volta, em Berlim, existiam novas bandas com muita onda, tanto de músicos internacionais, como de locais… mas não existia nenhuma editora para estas bandas. Foi então que comecei a Kryptox. Para os mostrar… e mostrar esse jazz contemporâneo e psicadélico.

Voltando à Toy Tonics, o impacto que a editora tem tido é muito relevante. Neste momento será difícil encontrar um único DJ de música house sem pelo menos um par de discos da Toy Tonics. Penso que é justo dizer que algumas referências musicais da editora são agora os seus maiores fãs. Qual foi para ti o ponto de viragem para a Toy Tonics? Aquele ponto que te fez sentir que estavam a criar uma editora que perduraria no tempo?
Obrigado pelas palavras simpáticas. Nós não sentimos isso assim tanto. Especialmente agora que não temos os nossos habituais eventos. Mas sim, houve um ponto de viragem quando o DJ Harvey começou a tocar imensos discos nossos (por exemplo os dos Phenomenal Handclap Band ou do Kapote) e quando outros grandes DJ’s começaram a fazer o mesmo. Ter Dixon e Motor City Drum Ensemble a tocar discos Toy Tonics no OFFSonar também teve a sua influência.

Desde a sua criação que a Toy Tonics tem lançado artistas que agora são aclamados. COEO, Black Loops, Jad & The, Rhode & Brown, Cody Currie… a lista é muito longa. Como é que vocês estão a caçar tanto talento de qualidade? É possível desvendar um pouco de como isso acontece?
Boas vibes e mente aberta. Soa a lugar comum… mas não consigo dar outra resposta.

A editora teve também um grande impacto na ‘noite’ de Berlim. Antes uma Meca para o techno (continua a ser a Meca para o techno, ainda assim), a cidade tem-se tornado cada vez mais o sítio para se estar para quem quer ouvir música house. No universo cultural que é Berlim, qual foi o papel da Toy Tonics na cultura de noite da cidade?
Nós só nos limitamos a fazer a residência no Griesmühle. Dia e noite. 24 horas. Isso sim tornou-se lendário, com pessoas a visitarem-nos vindas de toda a Europa. Também fizemos uns gigs semi-legais num bunker e noutros lugares escondidos pela cidade. Apenas isso… Não cremos ter, como editora, um papel activo na noite de Berlim.

E agora falta essa peça do puzzle da Toy Tonics e de muitas outras editoras, artistas e DJ’s. A pandemia desligou os sistemas de sons em todas as discotecas. Tu tiveste eventos da Toy Tonics a ser cancelados em Milão, Londres, Munique, Berlim. Como é que isso foi gerido por vocês em termos da promoção de novos discos? Isto porque, apesar disso, a editora acabou por lançar cerca de dez vinis em tempos COVID.
Nós temos sorte em não termos sido dos mais afetados. Perdemos todos os nossos eventos, sim, mas outras pessoas estão com problemas muito maiores. Claro que alguns dos nossos artistas passaram por um mau bocado. Mas nós temos um governo alemão que nos tem ajudado em alguns projectos. Também os artistas que não são alemães têm sido ajudados pelo departamento do estado de Berlim.

Mathias Modica. Fotografia de David Bornscheuer

Quais são os vossos planos para eventos em 2021, se for possível revelar algo? A vossa intenção de expandir as festas da Toy Tonics para outros locais continua presente?
Temos aí alguns planos… mas não podemos falar sobre eles ainda. Uma nova residência em Berlim está a chegar, mas quem sabe…

E novos discos? O que podemos esperar da Toy Tonics e da Kryptox para 2021?
Para já estamos com Osmosis, o novo EP do Joel Holmes, que é um fantástico pianista de jazz americano a viver em Berlim a produzir house-jazz de muita qualidade. E na Kryptox estamos a editar a compilação Kraut Jazz Futurism Vol 2. Esses são os principais discos que estamos a lançar neste momento.

Recentemente a Toy Tonics lançou a sua própria revista e a sua própria marca de roupa, colaborando com promissores artistas alemães. Podes falar um pouco desses novos projectos para a editora?
É divertido poder incluir diferentes artistas dos mais diversos tipos de arte nos nossos projectos na Toy Tonics. Para as t-shirts e postermagazine, pudemos fazer algo diferente com amigos do mundo da pintura da ilustração. Foi assim que começou e agora estamos a expandir para que mais e mais criadores colaborem connosco. Temos uma nova edição da nossa revista a caminho, onde introduzimos artistas como Why Ebay, Miruel, Barbara Luedde ou Leonhard Laupiehler; e as novas t-shirts sairão na primavera, criadas pelo Will Sweeney e pelo Why Ebay.

Para terminar, existem planos para eventos da Toy Tonics em Portugal? Pergunto, porque é notório que nos últimos anos a reputação da editora cresceu por cá e a possibilidade de receber uma das vossas festas seria muito fixe.
Ainda não… mas queremos muito fazer aí uma das nossas festas. Esperemos que sim.

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