Entrevista. NEEV: “A música sempre foi a minha Estrela do Norte”
Philosotry é o primeiro longa duração de NEEV, o alter-ego de Bernardo Neves, que será lançado em formato digital no dia 24 de Julho. Em Setembro, sairá em formato físico nos mercados português e francês pela mão da Universal Music. Há alguns dias, sentámo-nos à conversa com NEEV para lhe apanhar as inspirações e os processos, para lhe conhecer os caminhos que o levaram a Londres e ao trabalho com Larry Klein.
Conversador nato, NEEV sempre viu na música a sua estrela do Norte, o ponto de chegada e de certa forma o ponto de partida. O facto de ser autodidacta não é algo que considere como uma lacuna, pois assume nunca ter tido “vontade de ter uma mestria gigante sobre o instrumento”. O principal objectivo sempre foi “materializar o que pensava e sabia que a música seria sempre o pilar”. O caminho fê-lo caminhando, com os “vários professores que vamos tendo ao longo da vida, desde que estejamos dispostos a aprender”. Nessa liberdade que imprimiu à sua criação musical, mais do que a parte técnica quis “trabalhar a imaginação, que os rasgos se materializassem em música ou no que for, e ter a técnica suficiente para quando esses momentos, esses rasgos acontecem, conseguir pô-los cá fora da melhor maneira possível”. É nesta forma que se assume mais como autodidacta e como alguém que não quer sentir as limitações da técnica, “trabalhar o pensamento crítico, aprender a pensar”. Não será o caminho mais fácil porque, sem o escudo de uma técnica, é “necessária uma disciplina diferente e uma aceitação da falha. E ainda bem que é assim, porque é um processo e nós temos de nos dar a oportunidade de falharmos.”
Com 18 anos, e alimentado pela educação de fortes influências britânicas, NEEV partiu para Londres para estudar. A ligação a Londres sempre foi forte mesmo sem nunca ter lá estado, sendo até hoje um sítio onde regressa amiúde. Embora a experiência não tenha sido a mais positiva, Londres marcou “pelo circuito da música, pela forma como a música é vivida, pela seriedade e pelo melting pot de culturas que existe ali. Não há segregação, sente-se que um aglomerado de pessoas diferentes que coexiste de uma forma ativa e como aceitação diferente. Isto revê-se muito na cultura e na forma como interagem uns com os outros”.
Londres foi também palco da escrita de grande parte das músicas de Philosotry, contudo, muito mais pela experiência do próprio do que pelas influências musicais da própria cidade. “Foi mais a história de alguém que saiu do seu elemento, foi para outro elemento onde foi testado de várias formas, como acontece com todas as pessoas que partem à descoberta e arriscam. É mais essa história do que a história de alguém que foi bebeu daqui e dali. Foi mais uma viagem interior”.
O primeiro trabalho de estúdio de NEEV passou por vários altos e baixos, passando por um contrato de difícil resolução com uma editora de Los Angeles, por muitas músicas deitadas para o lixo e de uma procura incessante por um produtor que acompanhasse NEEV no processo, por “ter a necessidade de partilhar a jornada com alguém”. Esse alguém seria Larry Klein, que trabalhou com músicos como Joni Mitchell, Herbie Hancock, Melody Gardot ou Tracy Chapman. Mais do que o currículo, Larry Klein foi para NEEV fundamental para o álbum soar e comunicar da forma como comunica, em grande parte devido ao diálogo constante antes de entrar para estúdio. “A falta de conexão humana foi sempre um obstáculo no trabalho com outros produtores. Alguém que estivesse disposto a falar e a comunicar e a partilhar ideias antes de entrar no estúdio. Larry tem essa essência dentro dele.”
Numa entrevista, Larry Klein diz estar a trabalhar com um “Prince português”, com “influências de hip-hop, da tradição de songwriting e de sons maiores como os Pink Floyd”. Com alguma antipatia pela classificação do género musical, e com um fugir à nomeação de influências por querer, mais uma vez, encontrar a sua própria voz, NEEV considera que “as influências, sejam elas musicais ou não, são coisas que vivem dentro de nós sem que nós as racionalizemos. Fazem parte de nós, aquilo que nos toca.” São algo que indelevelmente estará sempre presente na composição e no resultado, mas olhando para trás, NEEV percebe que “Ray LaMontagne influenciou muito a composição do álbum, assim como os Beatles ou os Radiohead. Os Bon Iver, por exemplo, influenciam na forma de fazer a música, assim como Sufjan Stevens. As referências funcionam de muitas formas diferentes. E revêem-se de formas diferentes na música.”
A mescla que apresenta em Philosotry não lhe foi fácil do ponto de vista pessoal, por considerar a criação da música em si como algo doloroso, por ter de “olhar para coisas que não se quer olhar, encarar coisas que não se quer encarar, procurar verdade quando nós muitas vezes encontramos paz a ver só meia verdade. Procurar essa verdade entre nós é o verdadeiro sacrifício, porque para além da cara que damos a essa verdade, existe uma verdade por trás e essa sim é que eu gosto de explorar. Daí dizer que o álbum não é autobiográfico, porque não se foca na cara, foca-se dos sentimentos.”
É também por isto que NEEV anseia pelo regresso à estrada. Depois de ter actuado no Festival MEO Sudoeste, Festival Vilar de Mouros, MIL – Lisbon International Music Network, e Westway Lab, NEEV assume que andar na estrada é a parte em que mais se diverte por serem “esses momentos em que eu sinto que a música tem um lugar dentro de mim e que me faz sentir feliz. A estrada é muito isso. É como se fosse uma conversa, uma partilha.”