Entrevista. Vitorino Silva: “Se Marcelo for reeleito será o oposto do que é hoje. Terei pena de António Costa”
Depois das entrevistas a Marisa Matias e Tiago Mayan, Vitorino Silva é o terceiro candidato às eleições presidenciais que se senta para conversar com Francisco Cordeiro de Araújo, coordenador do projeto Os 230.
Popularmente conhecido como “Tino de Rans”, Vitorino Silva candidatou-se pela primeira vez à Presidência da República em 2016. Relativamente à recolha de assinaturas, revela: “Há 5 anos foi mais difícil. A cada 10 pessoas, só duas assinavam e com muita insistência.” Agora, Tino diz ser reconhecido “apenas pela voz” e acrescenta: “Pensava que ia ser mais difícil este ano, mas a cada 20 pessoas, 19 assinavam”.
Ao contrário dos restantes candidatos, Vitorino não foi colocado nas listas dos debates presidenciais nos canais generalistas, tendo só sido incluído após revolta do público: “Colocaram-me para fora [dos debates] e eu não me queixei. Mas o povo não é burro e percebeu que ficou um candidato de fora. O povo, tal como eu, não gosta de injustiças e começou a ‘cair em cima’ das televisões e agradeço a quem o fez”, conta.
O candidato começou o seu percurso político em 1993, quando foi eleito Presidente da Junta de Freguesia de Rans, em Penafiel. Viveu e cresceu na freguesia, que descreve como “uma terra muito bonita, com vistas para o céu e com muita vida.” Foi só depois da morte do irmão mais velho que decidiu ingressar no mundo da política, com o grande objetivo de colocar Rans no mapa.
Tino, com 22 anos na altura, foi eleito Presidente com quase 70% dos votos, embora revele que houve quem duvidasse da sua capacidade de liderança, muito devido à idade. No entanto, o candidato diz “nunca ter baixado os braços” e defende que: “Uma pessoa não pode ser prejudicada, nem por ser mais velho, nem por ser mais novo.”
Em relação ao seu percurso pessoal, Tino revela que aprendeu a ler e escrever num café: “Sou muito curioso, sempre gostei de viver intensamente,” e acrescenta, “alguns dos meus colegas iam para o café por causa das guloseimas, eu ia para pedir o jornal.”
Órfão de pai, foi criado pela mãe, a quem homenageou com o livro ‘A… CORDA P’RÁ VIDA’, lançado em 2019. “A minha mãe não queria ver um filho dela lutar pelo poder, dizia que a política só acarreta desgostos”, conta. Embora tenha contrariado a vontade da mãe, orgulha-se dos feitos como presidente da junta. Lembra, com entusiasmo, a construção da escola para os habitantes analfabetos, onde conseguiu que a mãe ingressasse aos 61 anos.
Durante o mandato, acredita ter feito obras pequenas, mas importantes. “Não tenho nenhuma placa em Rans, e se alguém metesse uma, eu arrancava. Eu não fiz obras importantes à procura das placas. Os políticos não devem estar à procura das placas. Política é uma missão”, explica.
Questionado sobre a sua vinda a Lisboa para o congresso do Partido Socialista (PS), onde também estava António Guterres, Tino fala da oportunidade que teve em discursar, e diz sentir que estava finalmente a colocar Rans no mapa. Conseguiu ainda dar um abraço a Guterres, figura política que admira.
Calceteiro de profissão, Vitorino Silva diz ter sentido que o olhavam com “desprezo”, até mesmo durante a candidatura à Presidência da República: “Dizem que eu não tenho competências porque sou o único que não sou doutor”, e acrescenta “eu não sei inglês, tenho dificuldades em inglês, mas como muitos outros, tenho muitas falhas.” Revela ainda que se for eleito, vai falar sempre em português quando estiver fora do país e justifica a sua decisão dizendo termos que “defender o que é nosso”.
Confrontado sobre o conjunto de poderes do regime semi-presidencialista, e como pretende exercer a magistratura de influência, o candidato diz haver confiança a mais, e que tem de haver mais distância entre o Primeiro Ministro e o Presidente da República: “Muitas das decisões que se tomaram é porque precisavam um do outro.” Acrescenta dizendo ainda que “a partir do momento em que o Marcelo for eleito a segunda vez eu vou ter pena do Costa, porque o Marcelo vai ser totalmente o oposto”.
Perguntas do público
Mas o que pensa Vitorino Silva sobre a democracia participativa e a descentralização? O candidato diz que, havendo regiões com mais meios que outros, há uma necessidade em sermos mais solidários e justos.
Relativamente às propinas, Tino diz não achar que se deve pagar para estudar numa universidade portuguesa. Justifica dizendo que, quem estuda “está a ganhar conhecimento que pode ser muito útil ao estado” e que “há muita gente que não tirou um curso porque não tinha direito para pagar propinas.” Embora não se sinta arrependido por não ter ido para a faculdade, revela que uma das grandes razões pelas quais não tem um curso, se deve aos custos do ensino superior.
“Tudo o que seja investir em educação é serviço publico”, defende.
As escolhas do candidato à Presidência da República
Na segunda parte da entrevista, Vitorino Silva responde a perguntas de carácter mais dinâmico. Entre várias questões, ao ser questionado sobre qual o melhor Presidente da República, o candidato não hesita em responder Ramalho Eanes.
E, enquanto PR, haveria algum líder mundial com o qual se recusaria encontrar? O candidato garante não ter nada contra pessoas mas contra ideias. No entanto, esclarece não conseguir estar ao lado de alguém que “manda os imigrantes para fora”. Como se, por exemplo, Marine Le Pen fosse eleita presidente.
Quanto a escolhas mais práticas, entre humildade e ambição, Tino acha que uma mistura de ambos é o ideal. Já entre sonho e realidade, o candidato diz ter a sorte de ter “sonhado acordado” e com poucos sonhos que tenham ficado a meio. Entre campo e cidade prefere os dois, mas entre poesia e prosa não tem dúvidas que a sua escolha é prosa.
Gostaria de almoçar com António Guterres, alguém que considera ter chegado ao topo do mundo. Recorda ainda o abraço que deu ao secretário geral das Nações Unidas, que diz provar que é possível “uma pessoa que está lá em cima abraçar quem está cá em baixo.”
Relembra ainda Carlos do Carmo, o falecido fadista português, figura que admira e com quem teve a oportunidade de partilhar um episódio curioso nas ruas do Algarve.
Por fim, Vitorino Silva deixa uma simples mensagem aos portugueses. “Façam de tudo para serem felizes, vale a pena ser feliz.”
Entrevista escrita por Daniela Fernandes Costa