Estima pelo ditador Pinochet e o seu Governo ainda divide chilenos
O número de chilenos com uma imagem positiva do ditador Augusto Pinochet tem aumentado, notam especialistas ouvidos pela Lusa, indicando que a sociedade chilena se divide no que pensar do general responsável pelo golpe de estado de 1973.
“Não existe nenhum ditador na história do Ocidente que tenha, 50 anos depois, uma imagem positiva tão elevada. É um fenómeno absolutamente inédito na história”, aponta à Lusa a economista Alejandra Muñoz, diretora da consultora de opinião pública Equipos Mori, uma referência no Chile.
Alejandra Muñoz, de 37 anos, cresceu quando a ditadura de Pinochet (1973-1990) já tinha terminado. Mesmo ciente da quantidade de torturados e mortos, considera os 17 anos do regime autoritário um dos melhores governos da história do Chile.
“Apesar de tudo o que se viveu naquela época, mortes e torturas, acho que o governo Pinochet foi um dos melhores deste país porque levantou o país da pobreza que se vivia antes com o governo de Salvador Allende. Graças a Pinochet, o país conseguiu avançar, independentemente de tudo de mau que dizem dele”, pondera Alejandra à Lusa.
Pinochet deixou o governo com 45% de pobreza e 25% de inflação, mas poucos recordam esses números.
“Pelo que me contaram do governo de Allende, havia muita pobreza, muita falta de alimentos, longas filas para conseguir um quilo de açúcar. Com Pinochet, isso não existiu. O Chile levantou-se graças ao seu governo e à estrutura que ele gerou dentro de todos os chilenos. Outro problema que não existia é a insegurança que vivemos hoje”, defende Alejandra.
A experiência de Salvador Allende (1970-1973) representava um socialismo pela via democrática, enquanto a esquerda latino-americana apostava na luta armada para tomar o poder, a exemplo de Cuba.
Todo o seu mandato foi marcado por tentativas orquestradas de desestabilização por parte de empresários, sindicatos, opositores, os Estados Unidos e, por último, militares, a partir de evidências documentadas ao longo das últimas décadas. Dois dias depois do golpe, repentinamente, os alimentos apareceram e as filas acabaram-se.
“Houve coisas más e coisas boas durante o governo de Pinochet. Houve muitos assassínios. Eu mesmo vi o meu avô esconder-se porque era comunista e o meu pai precisar esconder-se porque tinha amigos comunistas. Mas havia mais respeito pelas autoridades e mais valores. Já durante o governo de Allende, havia muitas filas para conseguir comida e não havia emprego”, compara o comerciante Marcos Andrés, de 45 anos.
“As pessoas costumam justificar as ações de Pinochet e a contrabalançar com a economia. ‘Sim, Pinochet matou, mas reformou a economia’. Eu não vejo ninguém a fazer uma lista das coisas boas que Hitler fez”, reflete a especialista Marta Lagos, que faz um seguimento da opinião sobre Pinochet desde 1987, quando o general ainda estava no poder.
Segundo estatísticas recolhidas por Lagos, para 64% chilenos, Pinochet é um ditador, mas 39% veem-no também como “o homem que modernizou a economia” e 20% como “um dos melhores governantes do Chile no século XX”.
“Eu sinto que aqueles que antes rejeitavam Pinochet agora perderam a vergonha e manifestam-se a favor sem maiores pudores”, conta à Lusa Sara Canales, de 75 anos.
Sara foi presa em 1974 por fazer um trabalho social. Depois de presa, foi despedida do emprego. Teve vários amigos presos, desaparecidos ou mortos, alguns dos quais aparecem nos painéis de uma exposição montada na Praça da Constituição, em frente ao Palácio La Moneda, sede do Governo em Santiago do Chile.
“Você pode imaginar o que esta data de 50 anos representa para mim. Não podemos continuar a permitir que se repita o que aconteceu e, neste momento, neste país, há gente que quer que se repita”, garante Sara, apontando para a foto de um amigo, vítima da ditadura.
Marta Lagos coloca em números a sensação de Sara: segundo um recente estudo da sua consultora, intitulado “O Chile sob a sombra de Pinochet”, em 2006, quando Pinochet morreu, aqueles que garantiam que tinha destruído a democracia chegavam ao máximo histórico de 68%. Os que afirmavam que Pinochet tinha salvado o Chile do marxismo somavam 19% em 2006 e caíram para um mínimo de 18% em 2013.
“Atualmente, são 36% os chilenos que dizem que Pinochet salvou o Chile do marxismo, o dobro de há dez anos atrás. E aqueles 68% que afirmavam que Pinochet destruiu a democracia, agora são 44%. Ou seja: apenas quatro en cada dez acham que Pinochet destruiu a democracia. Parte da população entende que o autoritarismo faz parte da democracia”, observa Marta Lagos.
Para a especialista, a melhoria na opinião sobre Pinochet combina a promessa de ordem e progresso como resposta à onda de violência que o Chile tem vivido, com a penetração do tráfico de drogas e do crime organizado e um agravamento da situação económica.
“Sempre houve 17% dos chilenos que preferem o autoritarismo. O resto são ‘pinochetistas’ circunstanciais”.
Os chilenos que acreditam que os militares tinham razões para dar o golpe de Estado de 11 de setembro de 1973 somam 36%. Apenas cinco pontos separam essa visão daqueles para os quais os militares “nunca têm razão” para dar um golpe (41%).
“É o único ditador do Ocidente que, 50 anos depois de dar um golpe, continua valorizado”, conclui Marta Lagos.