Exposição em Lisboa mostra porcelanas criadas pelo artista chinês Ai Weiwei
A porcelana, “o mais antigo produto artificial” do homem e que ‘sobrevive’ ao plástico, é o material de quase todas as obras do artista chinês Ai Weiwei que compõem uma exposição em Lisboa, a abrir na quarta-feira.
Intitulada “Paradigm”, a mostra vai poder ser visitada na Galeria São Roque, até 31 de julho, e é constituída por 17 obras inspiradas na liberdade de expressão e criadas pelo artista e ativista chinês, residente no concelho alentejano de Montemor-o-Novo (Évora), nos últimos anos.
Trata-se sobretudo de trabalhos em porcelana, mas a exposição integra também uma nova série de retratos com peças de LEGO, que o artista começou a usar em 2014, quando trabalhou com um material associado ao lúdico para produzir retratos de presos políticos.
Em entrevista à agência Lusa, Mário Roque, proprietário da Galeria São Roque, explicou que Ai Weiwei “é um grande colecionador de cerâmicas, já o seu pai era”, o poeta Ai Qing (1910-1996), possuindo peças desde “a dinastia Song”, que governou a China no período de 960 a 1279.
O artista interessou-se mais por esta arte e tornou-se “um grande ceramista, domina perfeitamente a cerâmica”, frisou o mesmo responsável.
“Neste momento, tem interpretações dessas porcelanas feitas agora, já com um caráter completamente diferente, porque há sempre uma irreverência [no seu trabalho], mas poderiam ser perfeitamente [peças] do século XVI ou XVII, mas feitas por ele”, realçou Mário Roque.
Já Ai Weiwei, em declarações aos jornalistas esta semana, numa visita promovida à sua residência no Alentejo, disse interessar-se muito “pelo que aconteceu no passado” e destacou que “a porcelana é o mais antigo produto humano”.
Trata-se de “um produto artificial que atingiu uma qualidade muito elevada desde tempos muito antigos, talvez desde o tempo das cavernas, e, até hoje, ainda usamos porcelana. É claro que muitas são substituídas por plástico, mas, ainda assim, a porcelana detém uma qualidade muito especial” e está presente em muitas casas, argumentou.
Destacando que a porcelana chinesa sempre teve uma qualidade muito elevada, o artista corroborou que esta mostra em Lisboa, “uma das mais pequenas exposições de sempre”, partiu do seu “interesse antigo por antiguidades” e do “laço de confiança” que criou com Marco Roque, cuja galeria visitou.
“É muito irónico fazermos uma exposição de porcelanas numa galeria de antiguidades”, considerou.
Mário Roque confirmou à Lusa que a exposição “começou quase como uma brincadeira”, mas enquadra-se no foco da galeria, cujas iniciativas “têm sempre a ver com os Descobrimentos e a fusão entre os objetos de arte portugueses e desses países”.
Os portugueses foram “os primeiros importadores” de porcelana oriunda da China e, graças a isso, provocaram “uma revolução nas cerâmicas europeias”, disse.
Até então, estas eram “sempre policromadas”, mas “Portugal trouxe o branco e o azul da China”, levando a faiança portuguesa a ser “comprada e divulgada por toda a Europa e pelo mundo”. E o azul-cobalto até serviu para os azulejos portugueses, “um objeto icónico”, pelo que é clara a fusão de culturas, frisou Mário Roque.
Nascido em Pequim, na China, em 1957, Ai Weiwei tem desenvolvido o seu trabalho em instalação escultórica, cinema, fotografia, cerâmica, pintura, escrita e já expôs em instituições e bienais em todo o mundo.
Em 2023, recebeu o grau de doutor ‘honoris causa’ pela Universidade de Évora, que o distinguiu por ser “uma das figuras culturais mais destacadas da sua geração, e um símbolo da liberdade de expressão tanto na China como internacionalmente”, sublinhou a instituição, na altura.