Grande Prémio Cinanima para filme sobre imposições de vestuário nas escolas do Irão
O Cinanima – Festival Internacional de Cinema de Animação de Espinho atribuiu no sábado à noite o Grande Prémio ao filme “Our uniform” (“O nosso uniforme”), sátira da realizadora Yegane Moghaddam às imposições de vestuário nas escolas do Irão.
Essa obra feminista de sete minutos confirma assim, também na 47.ª edição do certame do distrito de Aveiro e da Área Metropolitana do Porto, as razões pelas quais já é uma das candidatas às nomeações para o Óscar norte-americano na categoria de curta-metragem de animação.
A história envolve uma menina iraniana que, através dos tecidos e rugas do seu uniforme, revela memórias dos tempos de aulas e explora como nasceu na própria escola a ideia de que “não passa de uma mulher”.
Em declarações à agência Lusa, o júri do Cinanima justifica o prémio de curtas-metragens pela forma como o filme aborda “um tema sensível e complexo com uma abordagem muito inteligente”, recorrendo a perspetivas estéticas e técnicas de animação não convencionais e inovadoras. “É uma história de que todos nós já ouvimos falar, mas em que parece que não acreditamos”, diz o júri.
Já o Grande Prémio na categoria das longas-metragens, foi atribuído ao filme “Four Souls of Coyotte” (“Quatro Almas de Coyotte”), uma aventura épica em que o húngaro Áron Gauder conta o mito da criação do universo na perspetiva nos nativos norte-americanos.
“É simultaneamente um tributo aos índios americanos e uma ode à Mãe Natureza, que precisa, mais do que nunca, da nossa atenção”, diz o júri, acrescentando que “o uso do desenho à mão não deixa espaço à queixa clássica ‘Porque é que este filme não foi feito em imagem real?’, já que a sua grande força reside no claro simbolismo das imagens e na pureza da sua animação”.
O Cinanima atribuiu depois o Prémio Especial do Júri à ‘curta’ de 15 minutos “Family Portrait” (“Retrato de Família”), em que a croata Lea Vidakovic recorre a marionetas para fazer uma análise simultaneamente poética, negra e humorada sobre os segredos de uma família aristocrata antes da I Grande Guerra.
“É uma excelente abordagem artística e técnica que revela o cenário de um período histórico conturbado e o ambiente complexo dos laços familiares”, defende o júri.
Ainda na competição internacional, o festival premiou também “Island” (“Ilha”), do israelita Michael Faust, e “The Garden of the Heart” (“O jardim do coração”), do húngaro Olivér Hegyi.
No primeiro caso, a distinção deve-se a “uma grande história” sobre a influência humana na natureza, contada com “algum humor, comentários perspicazes e um excelente design de personagens e direção artística”; no segundo, os fatores decisivos foram “o timing e o design das personagens”, que conferiram “um desconforto engraçado” a uma história “bem escrita e relacionável” sobre o nervosismo de um aspirante a pintor antes de entrar na universidade.
Quanto à competição entre filmes portugueses, o Prémio António Gaio foi para “Quase que me lembro”, curta-metragem de nove minutos em que Dimitri Mihajlovic e Miguel Lima dão a conhecer uma mulher que “deambula por entre a impermanência das suas memórias de infância, tentando reconstruir a história da casa onde viveu o seu avô”.
O júri considera que essa obra em animação 2D com pintura sobre impressão, pelas suas “imagens e texturas subtis e sedutoras”, resultou num “filme intrigante”, a que voz-off e som conferem um caráter “incrivelmente envolvente”, acentuando o jogo de contrastes que “acrescenta uma camada extra de profundidade à narrativa, tornando-a mais profunda”.
O Prémio do Público, por sua vez, foi entregue à curta “Rosemary A.D . (After Dad)” [“Rosemary D.P. (Depois do Pai)”], do norte-americano Ethan Barret. Totalmente desenhado a lápis de cera, o filme expõe as reflexões de um pai que, ao embalar a sua filha recém-nascida, questiona se ela estaria melhor sem ele.
A lista de vencedores do Cinanima de 2023 inclui ainda três outras distinções, todas para realizadores jovens.
Esses prémios foram para: “Home” (“Casa”), realizado por Filipa da Costa, na categoria de cineastas com idades entre os 18 e os 30 anos; “A princesa que venceu o medo”, dirigido por alunos do 2.º ano da Escola Básica Costa Cabral, com o apoio da Associação de Ludotecas do Porto, na rubrica para menores de 18; e “Crab Day” (“Dia de caranguejo”), de Ross Stringer, estudante da Escola Nacional de Cinema e Televisão do Reino Unido, na disputa entre estudantes universitários.
Para Henriques Mendes, responsável pela organização do Cinanima enquanto presidente da Cooperativa Nascente, que desde 1976 promove assim aquele que é o festival de cinema mais antigo do país, em atividade, e o terceiro de animação com mais longevidade no mundo, fica demonstrado que o certame “trouxe a Espinho muitas obras da mais elevada qualidade, dificultando mais uma vez a decisão do júri”.
Selecionados entre 3.791 candidatos de todo o mundo, os 130 filmes que estiveram em competição usaram abordagens inovadoras para retratar “assuntos delicados e complexos” e fizeram com que a edição que termina este domingo tivesse um mérito acrescido: “Apresentou-nos a realidade que muitas vezes queremos ignorar.”