‘Hearts that Strain’, Jake Bugg: um (pequeno) passo na direcção certa
Aos dezoito anos de idade, Jake Edwin Charles Kennedy, o artista conhecido como Jake Bugg, mostrava ao mundo o seu indie folk jovial, munido da sua habilidade instrumental na guitarra e um timbre que remonta aos grandes do country, blues e folk. Jake Bugg, o seu álbum de estreia lançado nessa tenra idade, está recheado de músicas intensas e cativantes, pequenos disparos melódicos que evocam vários sentimentos, temas rápidos, de “fácil digestão” e com muita emoção, como “Lightning Bolt”, “Taste It”, “Two Fingers” ou “Trouble Town”. O álbum conta com a participação de Iain Archer, que escreveu várias músicas com Jake, e foi aclamado pela crítica, sendo mais tarde nomeado para o prestigiado prémio Mercury. Mas após uma boa estreia, Jake Bugg tem demonstrado dificuldade em voltar ao nível desse primeiro álbum.
Shangri La, o seu segundo projecto, pega em aspectos do seu álbum anterior e demonstra um crescimento do cantor e uma instrumentação mais significativa (certamente influência do produtor deste álbum, Rick Rubin), mas não consegue ser um seguidor digno de Jake Bugg. Para o seu terceiro trabalho, o artista oriundo de Clifton, Notthingham abandonou as colaborações: em On my One, Jake Bugg decidiu tomar as rédeas do projecto, escrevendo todas as músicas, tocando a maioria dos instrumentos e produzindo a maioria dos temas. Parece ser um passo em frente mas soa como um passo para trás. A desastrosa opção de trabalhar sozinho resulta numa amálgama de estilos musicais e sons que se esforçam para ser relevantes sem nunca cativarem o ouvinte. Tenta inovar sem interesse ou genialidade (sou o único a corar de vergonha quando oiço a pobre amostra de rapper que Jake emula em “Ain’t No Rhyme”?) e faixas intragáveis como “Love, Hope and Misery” ou “Never Wanna Dance” revelaram as fragilidades musicais do cantautor. On my One foi sem dúvida um álbum para esquecer mas é das cinzas que a fénix renasce. E Hearts that Strain mostra que Jake Bugg ainda parece ter algo a dizer com a sua música.
Para o seu quarto projecto, Jake viajou até Nashville para gravar o álbum. As músicas foram escritas pelo jovem e gravou-as com um painel conceituado de músicos: a banda do agora defunto American Sound Studio, conhecida como Memphis Boys, que já colaborarou com artistas como Elvis Presley ou Dusty Springfield, e Dan Auerbach (também com álbum lançado este ano), vocalista da banda The Black Keys, que colabora nas músicas “How Soon the Dawn”, “Burn Alone” e “In the Event of my Demise”. Jake rodeou-se de pessoas diferentes num contexto diferente e parece surtir efeito na sua música. Sente-se que Jake está de volta às suas raízes, abraçando a sonoridade country em músicas como a melancólica “Southern Rain” ou “In the Event of my Demise”, com um refrão em que presta homenagem ao familiar timbre de John Lennon. Dan Auerbach faz-se ouvir nas entrelinhas da música, sente-se a sua influência ainda que surja apenas como intérprete. “Burn Alone” também aposta nas valências do artista, demonstra uma garra contida, alimentada a notas graves de um riff sedutor que electrifica esta fiel representação de blues. O belo pormenor das congas antes do solo é uma boa adição, incluindo tensão num momento mais “vazio” da música.
Nota-se um esforço para criar melodias bonitas em refrões cativantes, ainda que as músicas por vezes soem genéricas. No tema soul “Waiting” isso é especialmente óbvio: tem todos os trunfos que caracterizam este estilo musical mas não demonstra nada que ainda não tenha sido feito. A participação de Noah Cyrus, irmã de Miley Cyrus, passa despercebida, não tem impacto. “Bigger Love” e “The Man on Stage” cometem o erro de assumir que o piano é o instrumento central a Jake Bugg quando as virtudes e melhores músicas do cantor surgem quando empunha orgulhosamente a sua guitarra, algo tornado claro pela adorável “How Soon the Dawn”. É uma excelente faixa de introdução e cria uma atmosfera descontraída, leve, capaz. É simples, e as músicas que Bugg mostra continuam a ser simples. Mas, infelizmente, na maioria das casos são-o de uma forma anónima, tornando difícil distinguir Hearts that Strain no meio do mar de música que todos os dias tentamos desvendar. A fórmula de temas curtos e de rápido “consumo” também prejudica as músicas que procuram ser mais complexas. No caso de “Indigo Blue”, uma música séria e mais “adulta”, a música acaba repentinamente, sem explicação, quando havia espaço e necessidade de uma conclusão mais satisfatória. As músicas mais sentidas acabam por sofrer com a falta de tempo para se mostrarem.
Durante trinta e cinco minutos, Hearts that Strain tenta revitalizar a péssima imagem deixada pelo terceiro trabalho de Jake Bugg. Há uma descontracção inerente que On my One não mostrava, um à vontade que transparece, uma genuína tentativa de conciliar os vários aspectos da carreira do músico, e a consciência de que Jake aprendeu com os erros e está a trabalhar para os evitar no futuro. Pelo menos o constrangimento diminuiu, as músicas não parecem tão forçadas apesar de ainda ser difícil de soarem verdadeiramente originais e de transmitirem a genica que Jake demonstrou noutros tempos. Já não é o mesmo rapaz que vimos pela primeira vez a rasgar riffs no Optimus Alive 2013 e está lentamente a mostrar a passagem para a idade adulta, para músicas mais complexas sem nunca perderem a identidade que nos fez interessar por este músico. De guitarra em riste, Jake Bugg mantém-se resoluto no seu quarto projecto mas mostra que está num processo constante de aprendizagem e que ainda tem muito trabalho pela frente.
Músicas preferidas: “How Soon the Dawn”, “Burn Alone” e “Indigo Blue”
Músicas menos apelativas: “Waiting”, “The Man on Stage”, “Bigger Lover” e “Every Colour in the World”