Impacto do 25 de Abril nas artes e o domínio das energias desde o paleolítico até à industrialização são temas das novas exposições do MAAT
O impacto do 25 de Abril nas Artes e o domínio das energias desde o paleolítico até à industrialização são temas de duas das quatro exposições que abrem na quarta-feira no Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia, em Lisboa.
“Hoje soube-me a pouco – Introversões e utopias artísticas no pós-25 de Abril” dá título à exposição coletiva que reúne artistas e obras que marcaram o período posterior ao momento fundador da democracia em Portugal, evocando o “espírito” desse marco histórico, disse hoje o diretor do museu, João Pinharanda.
Numa visita para jornalistas às quatro novas exposições, João Pinharanda e o diretor-adjunto, Sérgio Mah, sublinharam a importância da mostra coletiva que reúne obras de mais de 40 artistas de várias gerações, para celebrar os 50 anos da Revolução dos Cravos.
“A seleção de obras revela os efeitos da revolução na criação artística. Provocou uma expansão do imaginário e o surgimento de novos artistas, muitas mulheres afirmaram-se nesta área”, sublinhou Sérgio Mah na visita, apontando que estão representados autores que já tinham trajetórias iniciadas antes do 25 de Abril, muitos no exílio, até aos que surgiram no período pós-revolucionário.
Gabriel Abrantes, Helena Almeida, Ana Hatherly, Leonor Antunes, Eduardo Batarda, Maria Beatriz, Sara Bichão, Inês Botelho, Joaquim Bravo, Carlos Bunga, Fernando Calhau, Alberto Carneiro, Pedro Casqueiro, Lourdes Castro, Rosa Carvalho, Rui Chafes, António Dacosta, Armanda Duarte, José Escada, Carla Filipe, Horácio Frutuoso, Ana Jotta e Álvaro Lapa são alguns dos artistas representados, com obras que abrangem pintura, fotografia, desenho, escultura, vídeo e instalação.
O título cita um verso de uma célebre canção do músico Sérgio Godinho “Com um brilhozinho nos olhos” (1981), que conduz o visitante para “sentidos múltiplos”, segundo os curadores, “transferindo a expressão do desejo não satisfeito da esfera pessoal para a coletiva, mas regressando depois ao aspeto individual da criação”.
No percurso da exposição apresentada na Central Tejo surgem obras da coleção da Fundação EDP e também provenientes de colecionadores privados e de instituições como Fundação Calouste Gulbenkian, Fundação PLMJ e Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento.
As obras revelam o reflexo dos tempos de mudança política e social que originou percursos artísticos particulares “e autónomos relativamente às utopias coletivas abertas pela revolução”, nos quais os artistas “revelaram pulsões narcísicas, inquietudes, emoções, fantasias pessoais, e também novas formas de experimentar materiais e romper com limites”, nomeadamente através do humor.
Ao lado desta exposição, foi aproveitado o espaço histórico da antiga central de eletricidade para apresentar “Energias. Perpétuo movimento: O Museu Nacional de Arqueologia visita o MAAT”, uma parceria inédita que se insere no programa de celebração dos 130 anos deste do MNA.
Numa altura em que o museu se encontra encerrado no âmbito da remodelação através do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), o diretor do MNA, António Carvalho, congratulou-se pelo bom acolhimento da iniciativa, que resultou na exposição – entre a Sala das Caldeiras e a Sala dos Cinzeiros – de um diálogo que envolve mais de 150 peças proveniente do museu e da Coleção do Património Energético da Fundação EDP.
O percurso exibe objetos inventados pela humanidade, desde a pré-história ao período industrial, procurando dominar as fontes naturais de energia como o sol, a água, o vento e o fogo para suprir as suas necessidades de sobrevivência.
Entre as peças da coleção do MNA estão quatro painéis do Mosaico de Ulisses de Santa Vitória do Ameixial, alusivos aos ventos e às estações do ano, apresentados publicamente pela primeira vez após vários trabalhos de restauro no Museu Nacional de Conímbriga, segundo os curadores João Pimenta e Patrícia Batista.
Outros exemplares incluem pontas de lança, pedras de corte, um relógio de Sol, datado do ano de 1775 – complexa ferramenta científica que se destinava às aulas de geografia e gnomónica da então Real Casa Pia de Lisboa -, enquanto do espólio da Fundação EDP, as curadoras Rosa Goy e Ivone Maio destacaram a chave de válvulas, uma ferramenta de trabalho usada na Central Tejo entre 1908 e 1972, e um sofisticado mecanismo tecnológico conhecido como submarino, que permite efetuar a ligação e passagem de dois cabos elétricos no subsolo.
Em declarações à agência Lusa, António Carvalho sublinhou que, apesar do MNA estar encerrado para obras, “continua aberto para várias iniciativas também fora de portas”, e que esta, em particular, visa celebrar os 50 anos da revolução do 25 de Abril.
Com curadoria de Sérgio Mah, é também inaugurada a mostra “Três Moscas, 2012-2024”, de André Maranha, Francisco Tropa, Jorge Queiroz e Pedro Morais, uma obra concebida a quatro artistas que “há muito partilham cumplicidades pessoais e criativas”.
O projeto abrange uma instalação coletiva que inclui esculturas, pinturas, motores, objetos, espelhos, luz, água e ações performativas, pensado como um dispositivo de acontecimentos, ou teatro em miniatura, numa construção fortemente inspirada em “Impressions d’Afrique”, do escritor francês Raymond Roussel (1877–1933), romance publicado em 1910 que influenciou a história da arte.
Além da instalação, o projeto integra o retábulo dos Bonecos de Santo Aleixo, “relíquia de um teatro de marionetas de matriz popular alentejana”, que usa “figuras de rostos idênticos e olhos arregalados, animadas de forma rudimentar por uma vareta fixada na cabeça, que corporizam as figuras necessárias à representação de textos de tradição oral inspirados em narrativas bíblicas onde cabem improvisações cómicas e apartes burlescos destinados a estabelecer uma relação direta e duplicada com o público, assente no riso e na catarse”, segundo a curadoria.
Relacionada com a atividade da Central Tejo, o MAAT apresenta ainda “Luz em toda a parte II: A primeira Central Tejo”, construída no aterro em frente à Rua da Praia da Junqueira pela Companhias Reunidas Gás e Eletricidade (CRGE), para dar resposta à crescente procura de eletricidade na cidade de Lisboa.
Esta estação foi programada para funcionar por um período de seis anos (1908–1914), mas a conjuntura da Grande Guerra acabou por prolongar o seu funcionamento até 1921.