‘Lean on Pete’, mais do que um jovem e o seu cavalo
Lean on Pete é o mais recente trabalho cinematográfico de Andrew Haigh, realizador britânico que recentemente nos conquistou com o arrebatador 45 years, protagonizado pelos históricos Charlotte Rampling e Tom Courtenay. Tal como nos restantes trabalhos do realizador, este Lean on Pete volta a criar apego pela sua sinceridade e pela facilidade (se isto é por si uma boa ou má característica já lá vamos), com que nos comove e nos enleva.
Charlie Plummer tem uma interpretação brilhante ao transportar consigo a candura, a sensibilidade mas também o crescimento gradual necessário à sua personagem e o consequente peso da sua existência. Uma interpretação que o torna um nome a reter para o futuro. Ao vermos Charlie só nos ocorre a palavra “emancipação”. A fragilidade ocultada pelas vicissitudes da vida que o impedem de ser criança e de crescer com tempo. Lean on Pete é um filme de percurso. Um road movie sob a cobertura de western, sem no entanto ser nenhum deles em concreto.
Charley, filho de Ray (o excelente Travis Fimmel), apenas deseja uma infância normal. Aos 15 anos, sem mãe, vê-se obrigado a mudar de localidade e a viver tudo demasiado cedo e com demasiada normalidade. A falta de dinheiro, os casos amorosos do pai, e a constante confrontação perante “problemas de adultos” É nessa altura que surge Del (Steve Buscemi), dono de cavalos de corrida, para quem Charley começa a trabalhar. Com ele surge também Lean on Pete, um cavalo de corrida curta, de menor porte e que não é um campeão, à semelhança de Charley. É precisamente nessa semelhança e projecção da criança no cavalo, o seu animal, companheiro, que o filme ganha uma dimensão extraordinária de descoberta e superação.
À ostracização a que Lean on Pete é submetido neste mundo frio e calculista das corridas de cavalos é-nos colocada a comparação com a situação de Charley. Posto de parte pela sociedade, obrigado a sobreviver nesse mundo de “gente grande”. É por isso que surge uma ligação especial e ímpar entre o jovem e o cavalo numa jornada de crescimento e aprendizagem onde Charley trata de Pete como porventura gostava que alguém tratasse dele.
Tal como na vida nada é somente cor-de-rosa. A perda, a dor e a tragédia são palavras que seguem a viagem do protagonista. Os simbolismos de Andrew Haigh (o cinto do pai de Charley como legado e trajecto feito), as figuras de estilo, estão lá todas, na sua subtileza mas também na sua óbvia existência, num tal facilitismo que não conseguimos criticar. Por vezes as coisas são assim tão óbvias como aparentam. Há um desapego admirável de Andrew Haigh ao pretensiosismo de escrita. Ainda bem.
If anybody asks you who I am
Just stand up tall
Look ‘em in the face and say
I’m that mountain peak up high
I’m that star up in the sky
Hey, I made it
I’m the world’s greatest
I’m that little bit of hope
With my back against the ropes
I can feel it
I’m the world’s greatest
Faltam mais filmes com este carácter humano no Cinema que nos enchem os cartazes das salas actualmente, recheados de ofertas com os melhores efeitos especiais mas poucos efeitos práticos na mensagem que (não) passam. O último que nos lembramos do género, e que pela sua franqueza, simplicidade e significado nos conquistou, não querendo ser injustos, foi Lucky. Da composição do elenco à composição da obra, é também na banda sonora que o filme ganha ainda mais corpo, sobretudo com a cena final que é acompanhada de The World’s Greatest, de Bonnie Prince Billy, e que resume na perfeição a obra vista. Lean on Pete foi agora lançado em DVD pela Alambique.