Misândricas – as mulheres que odeiam os homens
Podia ser um título da obra de Stieg Larsson, bastaria mudar a direcção do ódio para o género masculino. Se o título de Larsson é expressamente misógino, arriscaríamos então dizer que a sua protagonista, Lisbeth Salander (interpretada no cinema pelas actrizes Noomi Rapace e Rooney Mara), tem por contraste um carácter misândrico.
O termo misandria é real e antiquíssimo, data do grego misosandrosia, composto pela junção das partículas misos, que significa ódio, e andros que significa homem. Contudo, a misandria continua a ser uma designação pouco conhecida. Não é claro que este ódio e/ou desprezo pelo género masculino seja expresso só pelas mulheres; também poderá ser pelos próprios pares de género. Mas, tal como a misoginia (o ódio dos homens pelas mulheres), a aversão concentra-se no género oposto. Mais recentemente, e como equivalente ao termo misoginia, também se usam as palavras androfobia (aversão ao homem, mas também ódio ao género humano).
Convém contextualizar que a misandria é sobretudo conhecida pelo chamado femismo (e não feminismo, atenção), e é considerada como sinónimo do machismo, ao mesmo tempo que é o seu oposto, pois trata-se de uma “ideologia” de supremacia da mulher sobre o homem. O femismo, assim como o machismo, defende a construção de uma sociedade hierarquizada a partir do género sexual, e, neste caso, baseada num regime matriarcal. Um dos exemplos públicos mais célebres de misandria é o de Valerie Solanas – a feminista radical que atentou contra Andy Warhol, em 1968. Solanas criou um manifesto intitulado SCUM Manifesto (Society for Cutting Up Men, 1967). Trata-se de um apelo claro à eliminação do homem. Através deste manifesto, Solanas manifestou, e de forma literal, o desejo de destruir o género masculino.
Mas qual será a génese desta palavra que significa desprezo pelos homens? Uma vez que a palavra é antiquíssima, terá certamente surgido da necessidade de nomear uma emoção que já existia na Grécia Antiga. Segundo uma professora de Literatura da Universidade de Princeton, que escreveu um artigo sobre padrões de género na arte dramática de Ésquilo, a misandria surge como reacção natural à misoginia vigente na sociedade da Grécia Antiga. Nas sociedades contemporâneas, apelidam-se erroneamente de misandria alguns dos movimentos feministas de expressão violenta, como, por exemplo, o sufragismo – caso claro de não-misandria, uma vez que aquelas mulheres apenas se bateram pelos direitos de igualdade de género e não por qualquer espécie de supremacia.
Resumindo, a misandria (independentemente de existir ou não como reacção aos abusos vividos pelas mulheres ao longo da História) corresponde à misoginia, e a toda a fundamentação radical, tratando-se de uma forma hostil e maniqueísta de tentar organizar a sociedade a partir dos géneros. É fraco organizar seja o que for através de um binómio de género, e lembra-me um verso de Cesariny — “ele há tanta maneira de compor uma estante.”