Mucho Flow: o futuro da música começa aqui, em Guimarães
No mês de outubro teve lugar, no Centro para os Assuntos da Arte e Arquitectura (CAAA) em Guimarães, o Mucho Flow: um festival que, já fora da época de verão, traz ao público o que de melhor se faz na música portuguesa neste momento, e que certamente nos irá ficar nos ouvidos no futuro; o que pode eventualmente soar pretencioso, mas quem lá esteve, ou já marcou presença nas edições anteriores a esta 5ª, pode confirmar a veracidade dessa afirmação.
Organizado pela Revolve, leva a Guimarães os mais emergentes nomes da música da atualidade; e este ano não foi exceção. Debruçamo-nos sobre os concertos a que assistimos, após a avalanche de sensações que nos foi apresentada nos três palcos do Mucho Flow, a 7 de outubro – pois as palavras para descrever o que se tinha passado, até agora, escasseavam.
Começamos pelo ambiente, muito descontraído, e que convida a duas de letra com amigos ou festivaleiros que por ali encontramos, e com quem criamos laços graças à boa música que nos une. O espaço é acolhedor; ali, festivaleiro e banda são um só, unindo-se na celebração da boa música e da convivência e calor humano.
A tarde começa com Veer, no Palco Musa. Uma sonoridade harmoniosa que dá o pontapé de saída e nos embala no início desta celebração. Seguem-se os El Señor, com um lo-fi/surfer rock no mesmo palco. O público senta-se em frente do palco, situado à porta do CAAA; outros mexem o corpo com a batida, ou aproveitam para petiscar ali ao lado do palco, num espaço patrocinado pela Musa. Imagine-se tudo o que de bom as recordações dos festivais de verão nos trazem, com tainadas, concertos de início de tarde com os amigos, danças energéticas – tudo reunido num só espaço, e já depois de oficialmente declarada encerrada a época de festivais de verão; chega a ser utópico, na verdade.
Com a noite já a cair, Filipe Sambado encerra as honras do Palco Musa, apenas voz e guitarra que colocam um ponto final, de forma suave e harmoniosa, na tarde de música, antes de entrarmos para dentro do CAAA e explorarmos os próximos dois palcos.
Chinaskee & os Camponeses apresentavam ao vivo o seu «Malmequeres» no Palco Mucho. Uma sala cheia vibrava a cada tema, numa energia contagiante que dava início a uma noite que se adivinhava de muito boa música e muito frenética. Do outro lado do CAAA apresentava-se o Palco Revolve, e a abrir as honras Dada Garbeck, que colocou toda a sala a dançar com ritmos – dizia o próprio – construídos há vários anos, e que ali partilhava conosco.
Seguiu-se Mlynarczyk, no Palco Mucho. E, neste compasso de palco para palco, a energia ia subindo a cada concerto. Chegava a vez dos portuenses 800 Gondomar no Palco Revolve, que nem com uma corda de guitarra a partir deixam que o concerto seja menos épico. Tocaram pouco, devido ao incómodo da corda, mas deixaram a sua marca, numa sala a transbordar de energia e suor.
Scúru Fitchádu são também portugueses, e encheram a sala de energia com uma sonoridade inovadora, onde a fusão e exploração de instrumentos e sons é rainha. Horse Lords, oriundos de Baltimore, deram uma lição de experimental e jazz com uma sala rendida a si. Cada instrumento teve o seu momento de glória individual e os solos assumiam planos celestiais.
No Palco Revolve, um dos concertos certamente mais aguardados, God Colony + Flohio, com o que de melhor se faz neste momento no rap e hip-hop, e não desilude – num concerto que deixa a sala a transbordar de energia e vontade de voltar a repetir a dose. Por fim, Nadia Tehran: uma sala quase completamente às escuras, e um concerto arrebatador. Provavelmente o melhor da noite. Os movimentos de Nadia distinguiam-se na escuridão da sala, e completavam a sonoridade, que parecia tomar o espaço de uma maneira muito particular.
O Mucho Flow é a prova de que a boa música está viva e se recomenda, e tem em Guimarães um palco de onde todos os anos saímos de coração cheio e de ouvidos presos a novos talentos, sem nunca nos desiludir.