Não sabe, não responde
É preciso não ter medo de o dizer: todos temos um pequeno livro de embirrações, algo inofensivo, mas nem por isso menos verdadeiro. Nesse inventário do quotidiano que nos aborrece podem caber pessoas, lugares, gestos ou, como é o episódio do que aqui se dá conta, comportamentos que atrapalham os dias. No meu caso nem é preciso ir mais longe: este já é o segundo texto em que falo destes parasitas pessoais, sendo que o outro, escrito num tempo e galáxia distante, ainda está válido. Se isso faz de mim um rezingão insuportável? Talvez, e com tendência a piorar. Mas ao que interessa por agora.
Primeiro pensei que fosse mania, afectação, maneirismo, sei lá. A coisa não deixava de me perturbar, mas nunca a tal ponto que merecesse que pensasse e escrevesse sobre o fenómeno, como agora mesmo.
Mas a verdade é que ao longo dos anos e apesar da facilidade das tecnologias de comunicação a irritação manteve-se. Pior: graças exactamente a isso foi perdendo desculpas e razão. E assim o mistério do porquê desta tradição foi-se adensando, adaptando-se aos tempos hodiernos e sem perder um ínfimo de irritação.
Desvendo, antes que a vossa paciência escasseie tanto quanto a minha quando isto acontece: trata-se da não resposta, a ausência de resposta a um pedido ou a uma pergunta directa e profissional. Nem sim nem não: nada, népia, nihil. Na minha vida profissional isso acontece há muito e agora — apesar do correio electrónico ou WhatsApp ou as mil e uma formas que temos para nos iludir de proximidade —, agora, escrevia eu, tornou-se pior. Uma pessoa escreve: “Gostaria de o convidar para tal e tal. Aguardo notícias”. Depois, e durante dias, o silêncio. E a minha irritação. O mesmo para entrevistas ou combinações simples e informais:
“O que achas de etc etc? “. Dias, semanas com o vento soprando na planície e as proverbiais plantas do deserto rebolando à minha frente.
A sério, não percebo. Eu estava habituado a isto com namoradas: o silêncio é igual a rejeição. Com isso lido eu bem, a ponto de o ter feito o meu fato de domingo. Mas uma pergunta simples com resposta simples? Vai não vai, sabe não sabe, gosta não gosta? Um mistério e uma profunda embirração.
Não quero passar a pedir respostas como se tivesse uma doença terminal e esse fosse o meu último desejo. Isso é estúpido. Francamente, trata-se apenas da ausência de uma coisa básica: boas maneiras. O que é mais simples, democrático, transversal e ao alcance de um teclado. Não me lixem.
Dado a minha pouca mas significativa experiência com contactos internacionais estou inclinado a pensar que este padrão de comportamento seja mais um atavismo nacional. Pois que o seja, e que isso seja decretado e proclamado. Se é uma coisa portuguesa, as Finanças irão perceber a minha ausência de resposta. É um costume, por Deus. Esperem aí que já vos atendo. Ou então não.
Esta crónica foi publicada originalmente no jornal Hoje Macau, tendo sido aqui reproduzida com a devida autorização.