No negócio do Futebol, ‘a bola não entra por acaso’

por Pedro Fernandes,    25 Julho, 2017
No negócio do Futebol, ‘a bola não entra por acaso’
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Nas duas últimas décadas, os clubes de futebol têm passado por um processo de profissionalização, isto é, as suas estruturas organizativas passaram a ser semelhantes às de uma grande empresa de outra indústria. Por exemplo, o número de licenciados, mestrados e doutorados que trabalham num clube de futebol aumentou drasticamente no contexto europeu. Esta evolução deve ser vista paralelamente à evolução da sociedade em geral. Se pensarmos em Portugal, por exemplo, enquanto há uns anos atrás se discutia porque havia falta de licenciados para desenvolver o país, hoje discute-se porque há licenciados a mais em situação de desemprego. Os níveis de educação cresceram e isso é bom. As organizações do mundo do Futebol acompanharam estas mudanças.

Voltando ao Futebol, hoje os clubes têm departamentos Financeiros, de Marketing, de Recursos Humanos e até de Inovação em tecnologia; têm lojas, fazem acordos com outras empresas para o uso dos camarotes, entre outros. No entanto, há diferenças em vários aspectos entre Ligas, ou seja, entre países diferentes. Por exemplo, em Portugal, os clubes são dos sócios, os investidores individuais detêm parcelas pequenas e insignificantes em termos da tomada de decisão do Capital Social, mas em Inglaterra é o contrário, os clubes são adquiridos por investidores muito ricos, maioritariamente da China ou da Arábia, que fizeram as suas fortunas em indústrias completamente diferentes, como, por exemplo, o petróleo e derivados. Na maioria dos casos, estes assumem o papel de Chairman, elaborando uma estratégia geral de topo e colocando objectivos gerais para o clube, e nomeiam alguém que consideram de grande competência para CEO, que irá tomar conta da gestão de todas as operações que o clube como empresa necessita, é o gestor principal do clube.

Estes, no que à área do Futebol diz respeito, têm um Director Desportivo, que faz um planeamento do futebol a longo prazo, ou seja, pensa a equipa a 3 ou 5 anos, e o Treinador, que ajuda nesse planeamento, mas que tem funções a curto prazo, ou seja, cria os treinos, comunica diariamente com os jogadores para os motivar e ensinar, prepara a equipa para os jogos, representa o clube nas conferências de imprensa dos mesmos, e ajuda a fazer uma gestão do plantel, no que toca a saída e entrada de jogadores. O Treinador também ajuda o clube trazendo know-how dos clubes anteriores onde esteve. Por exemplo, Louis Van Gaal mudou o centro de treinos do Manchester United, colocando mais árvores à volta dos campos para cortar vento e mandou instalar câmaras de vídeo HD para gravar os treinos e depois mostrar aos jogadores como correu o treino de outra perspectiva. Por outro lado, há sempre exceções à regra; o Real Madrid não tem Director Desportivo, porque como explicou uma vez o seu Presidente, Florentino Pérez, não é preciso alguém preencher esse cargo para detectar os melhores jogadores no mercado, isso torna-se evidente.

Já Andrea Agnelli, CEO da Juventus, explicou em 2012 numa conferência na London Business School que o futebol é um negócio diferente. Em primeiro lugar vem o futebol, ou seja, os resultados no campo, só depois a gestão da empresa. Aqui o que interessa é ganhar troféus e não gerar ganhos de capital para os accionistas: “o nosso objetivo é ser competitivo ao mais alto nível e manter um equilíbrio financeiro”. Ou seja, mais importante do que saber se o clube teve lucro, é julgar se a equipa foi capaz de ganhar títulos.

Outro CEO muito experiente no futebol é Ferran Soriano, actual CEO do Manchester City e ex-Vice Presidente do Barcelona. No livro A bola não entra por acaso, que escreveu em 2010, e publicado em Portugal pela editora Gestão Plus, Soriano conta que quando chegou ao clube lhe tinham dito que o futebol era uma questão de sorte: “se a bola entra, está tudo bem, se a bola vai ao poste, é um desastre.” No resto do livro, descreve como um clube de futebol deve ser visto como uma empresa de qualquer outro sector, exemplificando as grandes componentes da Receita e da Despesa, no que toca ao aspecto financeiro.

Tudo isto para defender que o sucesso dentro do campo depende muito do que é feito fora de campo. Esforço e trabalho inteligente são necessários da parte de toda a gente no clube. Dá o exemplo do Chelsea que perdeu, em 2008, e ganhou, em 2012, a final da Liga dos Campeões, em ambas as ocasiões, no desempate por grandes penalidades. Na sua opinião, isto mostra que o trabalho duro contínuo e inteligente permitiu ao Chelsea voltar à final e ganhar. Soriano enumera outra grande diferença no que toca aos media: um clube de futebol tem o seu trabalho escrutinado e julgado todos os dias, todas as semanas nos meios de comunicação, algo que não acontece com outro tipo de empresa. Agora, as redes sociais também entraram neste debate. Quando um clube grande perde ou empata, em poucos minutos, há imediatamente um grupo largo de pessoas que partilha fotos, montagens e memes com os falhanços, ridicularizando o trabalho destes profissionais à menor falha.

O Futebol é, essencialmente, uma metáfora da vida. Tudo o que acontece dentro do campo, o trabalho de equipa, o colega que se esforça menos, o talentoso que faz coisas que os outros não conseguem, o jogador visionário que vê antes do tempo, histórias de superação de jogadores que eram criticados e acabaram a resolver títulos, como o nosso Éder, por exemplo. Tudo isto são histórias que as pessoas vivem em todo o mundo, em diferentes sociedades, independentemente dos seus empregos. Como define Soriano, “o Futebol é a vida em 90 minutos”.

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