O futuro do movimento associativo popular em Portugal
O Movimento Associativo Popular, que conta com uma história secular em Portugal, está a atravessar uma severa crise, talvez a mais severa de sempre e Órgãos Sociais com várias frentes. Desde logo e a mais evidente, a crise económica, que com a Pandemia de COVID-19, muitas das coletividades portuguesas ficaram em severas dificuldades, pois tinham as portas encerradas e as despesas correntes não paravam de aparecer. Apesar da retoma já existente face ao plano de desconfinamento, estas Instituições de Caráter Recreativo, Cultural e Desportivo ainda estão longe de voltar ao nível financeiro pré-pandémico. E em muitos casos, se não fossem as ajudas das Autarquias (Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia), embora não conseguissem equilibrar na totalidade as contas, sem estas, muitas Coletividades em Portugal tinham neste momento as suas portas encerradas.
A segunda vertente da crise atravessada pelo Movimento Associativo é uma crise de força humana, pois em grande parte das Coletividades Portuguesas, a média de idades quer dos seus Órgãos Sociais quer dos seus associados tende a aumentar e a juventude de hoje já não frequenta tanto as Coletividades como há cerca de 15 ou 20 anos, algo que poderei explicar num outro texto. Muitas destas Coletividades têm funcionários efetivos a seu encargo e famílias que dependem de si para obterem o seu sustento. Para quem hoje pertence aos Órgãos Sociais de uma Coletividade, é uma enorme responsabilidade e talvez por isso não exista tanta adesão da juventude quer a se tornarem associados, quer associados. Mais de 3,3 milhões de Portugueses são associados numa Coletividade e/ou Associação Cultural. Sei que parecem números razoáveis, mas se calcularmos as médias de idades, poderemos verificar que as mesmas são elevadas e que o número de associados com o passar dos anos vá tender a diminuir.
Há alguns meses, participei num debate promovido pela Confederação Portuguesa das Coletividades de Cultura, Recreio de Desporto precisamente sobre a juventude e o Movimento Associativo e a presença de jovens com menos de 30 anos era residual.
Enquanto o Estatuto de Dirigente Associativo, prometido há vários anos, mas sem nunca sair da gaveta não sair da mesma e for implementado, enquanto as Coletividades não voltarem a ter alguns dos benefícios que tinham há cerca de 20 anos (não podemos comparar uma Coletividade a um café normal, pois a primeira não se limita a vender bens ao balcão, sendo que promove Cultura, Recreio e Desporto juntos dos seus associados, familiares e amigos e tem um papel muito mais ativo na comunidade e mais próximo das populações) e enquanto não existir uma consciencialização do papel das Coletividades em Portugal no passado, presente e o que podem contribuir para o futuro do nosso país, o Movimento Associativo Popular corre severos riscos de iniciar uma queda da qual nunca mais se conseguirá levantar.
Enquanto jovem dirigente associativo de uma coletividade na freguesia da Baixa da Banheira, já fui apelidado de “exceção à regra” e é com muito orgulho que o sou, pois apenas estou a retribuir um pouco aquilo que a minha Coletividade me ofereceu durante toda a minha vida: As amizades, os bons momentos que eu e os meus lá passamos há mais de 30 anos, a cultura a que assisti lá, o desporto que lá pratiquei e muitos praticam. Tudo isto conta e tudo isto e ainda muito mais explica o amor que sempre tive não apenas pela minha Coletividade, mas como a todo o Movimento Associativo Popular.
O Movimento Associativo Popular está vivo, sim! Mas com muita dificuldade e estas serão cada vez mais e mais duradoras, a não ser que façamos realmente algo. Cabe-nos a nós garantir o futuro e sustentabilidade de milhares de Coletividades em Portugal.
Viva o Movimento Associativo Popular!
Crónica de Iúri Pereira Barros.
O Iúri é licenciado em História Moderna e Contemporânea e estudante de Mestrado na mesma área. Tem dempenhado diversas funções associativas nos últimos anos, das quais destaca a Presidência do Núcleo de Estudantes de História Moderna e Contemporânea do Iscte e a função de 1.° Secretário da Sociedade Recreativa da Baixa da Serra.