O lugar do homem é ao lado das mulheres, nesta e em todas as lutas
Muitos teimam em confundir «feminismo» com «femismo». Propositadamente ou não, a verdade é que ambos os conceitos têm significados diferentes e enquanto o primeiro consiste em igualdade de género, o segundo é o oposto, considerando a mulher superior ao homem. É importante saber diferenciar os dois para não cair no erro de afirmar que «mulheres feministas querem superioridade».
Se feminismo consiste em igualdade de género, é natural que se questione «não deveriam todos os homens ser feministas?». A resposta à questão parece óbvia, e sim, todos os homens deveriam ser feministas, bem como todas as mulheres.
Refletindo apenas sobre o papel do homem no feminismo, é importante fazer referência à sociedade patriarcal e ao machismo estrutural que está enraizado nas diversas instituições do nosso dia a dia, desde a família passando pelo trabalho. Muitas vezes não percebemos alguns hábitos machistas que se tornaram vulgares, mas a realidade é que eles estão bem presentes nas sociedades patriarcais dos nossos dias: as estruturas tradicionais da família onde a mulher continua a ser vista como a cuidadora familiar, têm se mantido durante anos; ela é vista como o sujeito passivo nas relações sexuais com parceiros masculinos e é encarada como sendo o sujeito mais fraco, provido de vulnerabilidade e, por isso, necessita da proteção do seu marido que, por sua vez, é visto como uma figura paternal, dotada de sabedoria e força para proteger e sustentar a sua família.
Outra evidência no nosso dia a dia é a utilização linguagem que promove a segregação da mulher perante o homem, fazendo-a parecer submissa em relação ao seu parceiro em algumas circunstâncias. Um dos exemplos dessa linguagem acontece quando em vez de utilizarmos a expressão «sua esposa», continuamos a dizer «sua mulher», dando a sensação de posse do marido sobre a sua parceira, o que, por sua vez, não acontece com o homem, pois, quando alguém se dirige à sua esposa para lhe fazer referência, dirige-se tratando-o por «seu marido» ou «seu esposo» e nunca, salvo escassas exceções, «o seu homem».
Retomando à posição do homem na «luta» feminista, é importante que este entenda qual é o seu lugar, e o seu lugar é ao lado das mulheres. Um homem não deve nunca sobrepor a sua voz à de uma mulher nesta «luta», da mesma forma que um sujeito branco não pode ter o «palco» para falar sobre racismo, devendo dar o espaço de debate a quem é vítima deste. O homem deve entender que é a mulher, exclusivamente, quem deve falar sobre a sua «luta», e se neste momento escrevo sobre feminismo, é somente sobre a minha perspetiva em relação ao papel dos homens no movimento feminista, e nunca sobre o papel das mulheres ou as suas experiências.
Respondendo a uma nova questão: Porque devem homens e mulheres estar lado a lado no feminismo?
Primeiramente, homens e mulheres devem estar sempre lado a lado e não apenas na «luta» feminista. Em segundo lugar, e respondendo à questão, embora muitos homens não percebam, ou tenham dificuldades a entender as consequências da sociedade patriarcal para si próprios, é de notar que também nós homens sofremos com o patriarcado: somos forçados a esconder sentimentos e fraquezas que põem em causa a «masculinidade» perante a sociedade; muitas vezes as violações e assédios a homens são descredibilizadas pelos próprios e, em grande medida, homens não têm coragem de admitir que sofrem abusos por sentir vergonha e receio da forma que os virão a encarar; homens da comunidade LGBTQI+ continuam a sentir dificuldades de inclusão social, além de sofrerem muitas vezes ataques violentos maioritariamente vindos de outros homens machistas homofóbicos. Podia enunciar mais exemplos com os quais homens sofrem nas mãos do patriarcado, mas acho que se pensarem um pouco, o leitor consegue chegar facilmente a outros exemplos.
Além de ser fundamental que homens se juntem ao movimento feminista, é necessário que este seja cada vez mais inclusivo, uma vez que a transfobia continua presente e, muitas vezes, este não defende os interesses de minorias étnicas que têm as suas próprias «lutas» contra as suas dificuldades, tal como as pessoas portadoras de deficiência, cuja representatividade no movimento ainda está aquém do necessário. É, portanto, essencial que o movimento conte com o apoio dos homens e abra portas a todos os grupos que atravessam dificuldades de inclusão ou que sejam marginalizados.
Devemos, por isso, ter consciência de que homens e mulheres devem «lutar» lado a lado, quebrando barreiras, de forma a desconstruir o machismo estrutural, pôr fim à sociedade patriarcal e contribuir para a resolução de problemas de inclusão. Para que tal aconteça, é necessário que todos reconheçam a necessidade de união, pois, enquanto esta união não existir e os homens não reconhecerem o seu lugar, o patriarcado prevalece e todos continuaremos a ser suas vítimas.
Crónica de Rafael Pestana
O Rafael é licenciado em História Moderna e Contemporânea e estudante de mestrado em Estudos Internacionais, com especial interesse em Direitos Humanos e Movimentos Migratórios.